sexta-feira, 4 de maio de 2012

A NATUREZA DE CLASSE DO ESTADO - GILBERTO MATHIAS & PIERRE SALAMA

AUTORES: GILBERTO MATHIAS & PIERRE SALAMA

LIVRO: O ESTADO SUPERDESENVOLVIDO

EDITORA: BRASILIENSE, 1983.

 

O texto trata da natureza de classe que o Estado capitalista assume. Aponta como nos países desenvolvidos sua natureza de classe é derivada do capital e nos países subdesenvolvidos é derivada da economia mundial constituída.

 

ESTRUTURA DO TEXTO:

Primeira parte: A natureza de classe do Estado.

 

·           O Estado é uma abstração: Kant define o Estado abstrato justamente como a ilusão do lugar institucional em que uma comunidade real, múltipla, variada e contraditória encontra sua unidade, medida e identidade, sendo uma projeção autonomizada da sociedade que retorna sobre ela para formar um todo indissolúvel, através da sintetização e do regramento.

·           Países desenvolvidos: Estado = sua natureza de classe deriva do capital;

·           Países subdesenvolvidos: Estado = sua natureza de classe deriva da economia mundial constituída;

 

Regime político: é distinto do Estado. A relação que liga o Estado ao regime político é, ao mesmo tempo, uma separação e uma dependência.

  • Uma separação, na medida em que traduz a constituição de dois conceitos, situados em diferentes níveis de abstração;

  • Uma dependência, porque o regime político é a forma de manifestação (existência) do Estado.

 

Características do regime político:

a)     Pelo tipo de autonomia que apresenta em relação as classes sociais;

b)     Pela diferenciação que opera entre as classes;

c)      Pela legitimação que obtém;

d)     Pela autonomia em relação aos paises centrais (paises subdesenvolvidos).

 

Formas “desviadas” da existência do Estado capitalista:

País desenvolvido com regime político de orientação popular:

# Como o Estado deriva da categoria capital ocorre uma contradição entre a necessidade objetiva de reprodução do capital (que só é possível com a exploração do trabalhador) e a sua materialização (tendo em vista que o regime político de orientação popular dificulta a exploração).

# Soluções possíveis:

1 – O regime político se dilata graças a dinâmica revolucionária dando origem a um novo Estado;

2 – Ocorrem a desmobilização das massas possibilitando ao Estado cumprir o seu papel (reprodução do capital). Essa adaptação pode ser lenta e caótica graças a desmobilização gradual das massas ou pela via militar (golpe para restituir a “ordem”).

 

Essa concepção do Estado e do regime político é rica ao nível da filosofia da história. Ela permite compreender que “os homens fazem livremente sua história, mas em condições que não são livremente determinadas por eles” (Marx).

 

Qual é o determinante fundamental a ser descoberto?

 

Capítulo 1: Nos países capitalistas desenvolvidos

 

O Estado é um “capitalista coletivo ideal” (Engels). Sua natureza de classe é derivada da categoria capital. A partir desta afirmação, os autores passam a demonstrar (justificar) a correção da abordagem empregada.

 

1 – O Estado aparece como o que não é

# Aparece como neutro, ou seja, cria a impressão de um Estado situado acima das classes.

# A aparente neutralidade do Estado repousa sobre o fetiche da mercadoria:

A relação de troca de “equivalentes” se torna tão comum que não é questionada.

# Quantidade de trabalho = salário à generalização da mercadoria à fetiche.

A exploração é ocultada, tem-se a impressão que uma relação de igualdade predomina, logo, o papel do estado é camuflado (neutro), pois assegura uma relação igualitária.

# Fatores que fazem o Estado aparecer como o que não é:

a)     Onipresença;

b)     Continuidade administrativa: não ocorrem mudanças significativas;

c)      Legitimidade dos governos (democracia).

#A natureza do Estado é capitalista. É o garante da manutenção da relação de produção.

 

2 – Derivação lógica da natureza de classe do Estado.

 

= Quando ocorre a generalização da força de trabalho como mercadoria mostra-se a relação de produção subjacente: dinheiro ao comprar força de trabalho assume o caráter de capital.

# A sucessão das categorias:

 M (mercadoria) à V (valor) à D (dinheiro) à C (capital)

Para se compreender uma categoria tem-se que recorrer a categoria que lhe sucede. Assim, para se compreender a categoria capital tem-se que entender as funções do dinheiro, por sua vez, a compreensão do papel do dinheiro só é possível recorrendo-se a análise das formas do valor (relação social de dominação).

# Para os autores só é possível compreender as causas do movimento real da sociedade quando prosseguimos a análise. Sem a categoria “Estado”, a categoria “capital” não pode ser concebida. A categoria “Estado” é necessária para se compreender a própria instituição da relação de produção. Afinal, é o Estado que garante a manutenção das relações de produção (repita-se: a relação de produção reflete uma relação social de dominação).

# Assim, a sucessão das categorias:

M (mercadoria) - V (valor) - D (dinheiro) - C (capital) - E (Estado).

# O Estado deriva da categoria capital por duas razões:

1 – é o garante da manutenção das relações de produção;

2 – participa de modo decisivo na própria instituição dessas relações (países subdesenvolvidos em que o Estado atua diretamente na produção).

Veja-se: a aparente troca igualitária (venda da força de trabalho por um salário – esfera da circulação) reflete uma coisificação das relações de produção (fetichismo da mercadoria), mas a própria acumulação de capital atua como elemento desfitichizador, uma vez que, demonstra de forma inequívoca que a pseudo-igualdade das relações de troca inexiste.

# O Estado é a resposta a essa desfitichização: garantindo o respeito pelas regras da troca, ele garante a possibilidade da exploração e de sua perenidade.

RESUMO:

# A generalização da mercadoria tem dois efeitos contraditórios:

1 – fetichiza as relações sociais;

2 – desfetichiza-as.

O primeiro efeito faz com que o Estado apareça como acima das classes sociais.

Do segundo efeito deriva a necessidade lógica da existência do Estado: garante da manutenção das relações de produção. Neste aspecto, o Estado é um “capitalista coletivo ideal” (Engels), ou seja, representante dos interesses gerais do capital.

Sua forma de materialização é o regime político.

 

CAP. 2: NOS PAÍSES CAPITALISTAS SUBDESENVOLVIDOS

 

Capitalismo de Estado – o Estado (supondo-se que sua natureza seja capitalista) não seria apenas o garante das relações de produção, mas igualmente e SOBRETUDO o produtor direto dessas relações.

 

Os autores passam a investigar a definição da natureza de classe do Estado nos países subdesenvolvidos.

No item 1 – demonstram que a derivação não pode ser das categorias: M – V – D – C.

No item 2 – demonstram que a dedução não pode se basear em argumentos do tipo tecnológico e financeiro.

No item 3 – demonstram que a natureza de classe capitalista do Estado se deduz da economia mundial constituída e esta análise permite eliminar equívocos do tipo de ver o Estado (países subdesenvolvidos) como instrumento a serviço das potências centrais.

 

1.        OS ENSINAMENTOS DA ESCOLA DA DERIVAÇÃO NÃO SÃO PERTINENTES NO CASO DO SUBDESENVOLVIMENTO

 

# Razões fundamentais que não permite se recorrer a sucessão das categorias:

a)      A generalização das mercadorias não é efetiva: para os autores o aparecimento e florescimento do modo de produção capitalista não foram produzidos internamente, mas trazidos de fora e foi precisamente isso que criou o subdesenvolvimento.

  • A inexistência de uma classe (capitalistas ou operários) implica na impossibilidade da derivação da existência do Estado a partir das categorias, mas não impede a existência de um Estado capitalista.

  • Neste caso, a natureza de classe do Estado é conferida por outros fatores que não a existência de uma formação social apropriada.

b)      A questão nacional: a constituição da nação é condição essencial para legitimação da atuação do Estado.

·        A nação é a sociedade que compartilha um destino comum e logra ou tem condições de dotar-se de um estado tendo como principais objetivos a segurança ou autonomia nacional e o desenvolvimento econômico (Bresser-Pereira: Nação, Estado e Estado-Nação).

 

2 – DEDUÇÕES LÓGICAS DA AÇÃO DO ESTADO E CONCEPÇÕES INSTRUMENTAIS DO ESTADO

 

#Vários trabalhos se limitam a deduzir logicamente a ação do Estado ou a partir de dificuldades ligadas ao processo de acumulação, ou de causas estruturais cujas origens seriam tecnológico-financeiras.

a)     ESTUDOS REDUCIONISTAS DO ESTADO COMO CONSEQUÊNCIA DAS ANÁLISES DA CEPAL

A análise da CEPAL:

# As crises econômicas e as guerras (países centrais) propiciaram um momento de expansão do mercado interno (periferia) através do caminho da substituição de importações.

# O restabelecimento do vínculo bloqueia a expansão.

# Somente com a intervenção do Estado pode-se superar este cenário (reforma agrária, eliminar gargalos estruturais) = aumentar o mercado interno.

As duas primeiras setas indicam que as relações entre as nações (centro x periferia) são prejudiciais a periferia e impedem seu desenvolvimento.

A terceira seta indica o caminho para superação dos problemas: a intervenção do Estado.

Crítica dos autores: não se pode conceber o Estado como um instrumento susceptível de superar as contradições.

A partir da análise cepalina surge uma corrente radical (marxista) sobre o papel do Estado:

=As nações ricas exploram as nações pobres.

=O enriquecimento de umas provoca o empobrecimento de outras.

= A burguesia local é submetida a central.

=O Estado é lacaio do centro capitalista.

Crítica dos autores: a análise é excludente (uma ou outra) e exogenista. Não se nega a intervenção externa, mas o fato de não se perceber a natureza de classe do Estado.

Nenhum comentário:

Postar um comentário