Apresentação e objetivo da obra
A dissertação de Daniel Pereira Barbosa tem como ponto de partida uma questão recorrente nas ciências econômicas: por que certos países conseguem promover crescimento econômico sustentado enquanto outros permanecem em situações de estagnação ou subdesenvolvimento? Para investigar essa problemática, o autor propõe uma análise comparativa entre duas das mais influentes visões sobre o desenvolvimento econômico: o estruturalismo cepalino, representado por Celso Furtado, e o neoinstitucionalismo, representado por Douglass North.
A escolha desses autores não é arbitrária. Ambos formularam teorias de desenvolvimento com base em críticas às abordagens neoclássicas, porém partiram de fundamentos distintos quanto ao papel das instituições, da história e da estrutura econômica. A dissertação, portanto, não busca apenas contrapô-los, mas compreender em que medida suas visões podem se confrontar, dialogar ou se complementar.
Estrutura e conteúdo
A dissertação se divide em quatro capítulos:
Capítulo 1: Instituições e desenvolvimento
Neste capítulo introdutório, Barbosa apresenta o conceito de instituições como elemento fundamental do debate. Define instituições tanto sob o viés normativo quanto funcional, considerando as regras formais (leis, regulações) e informais (valores, costumes) que moldam os incentivos e comportamentos econômicos.
Capítulo 2: Douglass North e o neoinstitucionalismo
Barbosa expõe a concepção de North segundo a qual o subdesenvolvimento é explicado, em larga medida, pela ineficiência institucional. North argumenta que a ausência de instituições estáveis, que garantam direitos de propriedade e reduzam os custos de transação, inibe o desenvolvimento. O progresso econômico, nessa ótica, é fruto da evolução institucional que aumenta a previsibilidade e a cooperação. North também enfatiza o papel da ideologia, cultura e crenças como construtoras de trajetórias institucionais de longo prazo (path dependence).
Capítulo 3: Celso Furtado e o estruturalismo histórico
Neste capítulo, o autor apresenta o pensamento de Celso Furtado, que vê o subdesenvolvimento como um fenômeno histórico estrutural, resultante da forma como países periféricos foram inseridos no sistema capitalista mundial. Para Furtado, o desenvolvimento não ocorre automaticamente por meio do mercado, mas requer a ação do Estado, planejamento e transformação estrutural profunda (como reforma agrária e redistribuição de renda). Ele critica a concepção linear do desenvolvimento (pela qual países periféricos seguiriam o mesmo caminho dos centrais) e introduz a noção de heterogeneidade estrutural.
Capítulo 4: Convergências e complementariedades
O capítulo final é o mais analítico e inovador. Barbosa demonstra que, embora as abordagens sejam distintas — North mais universalista e formal, Furtado mais histórica e estrutural —, há possibilidades de complementaridade. O autor propõe uma síntese em que a perspectiva estruturalista de Furtado poderia enriquecer o arcabouço institucionalista de North, especialmente no que diz respeito à dimensão histórica concreta das instituições em contextos periféricos. Defende, assim, uma leitura “contextualizada” do neoinstitucionalismo, que reconheça as limitações históricas, políticas e sociais herdadas pelo subdesenvolvimento.
Principais contribuições
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Interlocução teórica rara: O confronto entre Furtado e North é original e metodologicamente frutífero. Barbosa evita uma oposição maniqueísta e mostra como uma teoria pode iluminar as lacunas da outra.
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Enfoque crítico-contextual: O autor questiona a pretensão universal do neoinstitucionalismo ao aplicar seus conceitos a países em desenvolvimento sem considerar os legados históricos e estruturas sociais locais.
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Resgate da centralidade do Estado: Barbosa, ao reler Furtado, reforça a importância do Estado como agente promotor do desenvolvimento em contextos de desigualdade estrutural, o que ainda é relevante nas discussões contemporâneas sobre políticas públicas.
Conclusão
A dissertação de Daniel Pereira Barbosa é uma leitura instigante para estudiosos da economia do desenvolvimento, da teoria institucional e da história econômica latino-americana. Seu mérito está em estabelecer uma ponte crítica entre dois paradigmas que, embora partam de premissas diferentes, podem ser colocados em diálogo produtivo. Ao fazer isso, o autor contribui para uma abordagem mais rica e plural do desenvolvimento econômico — uma que leve em conta não apenas regras e incentivos, mas também história, estrutura, poder e desigualdade.
Recomenda-se a leitura especialmente para estudantes e pesquisadores das áreas de economia, ciência política, planejamento e desenvolvimento regional, interessados em pensar alternativas ao dogmatismo liberal ou ao estruturalismo isolado. Trata-se de um trabalho conceitualmente sólido, intelectualmente honesto e metodologicamente relevante.
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