segunda-feira, 2 de novembro de 2015

Dama de Espadas ESTÁ PARADA POR DECISÃO INOPORTUNA DE DESEMBARGADOR

» ENTREVISTA » Rinaldo Reis - Procurador-geral de justiça

O procurador-geral de Justiça, Rinaldo Reis, considera que a decisão do desembargador que suspendeu as investigações da Operação Dama de Espadas foi inoportuna e provoca embaraços, porque impede a continuidade das apurações. 


Para Rinaldo Reis, não haveria motivo para essa decisão. Segundo o procurador-geral, todo o cuidado foi adotado para que nenhuma autoridade com foro privilegiado fosse investigada por alguém que não tenha competência para esse procedimento. 
Júnior SantosProcurador-geral de Justiça afirma que não há motivos para deixar as investigações suspensasProcurador-geral de Justiça afirma que não há motivos para deixar as investigações suspensas

Rinaldo Reis afirma que a suspensão é inadequada, porque tão logo a promotora reunisse o material e identificasse indícios que envolvessem autoridades com foro especial, iria remeter a documentação à instância devida. “No momento estamos parados [na Dama de Espadas] e isso não interessa a ninguém ou pelo menos à apuração da verdade”, lamenta.

Nesta entrevista, ele comenta também sobre os desafios do Ministério Público e os motivos pelos quais foi concedido o reajuste aos servidores da instituição, apesar do MP está dentro do limite prudencial para gastos com pessoal. 

O senhor está no segundo período à frente do Ministério Público. Qual o balanço que é possível fazer sobre a atuação da instituição?
Estamos em um período de profundas crises. O país e o Rio Grande do Norte estão em crise econômica. Isso influencia na esperança do brasileiro. Mas também passamos por uma crise de segurança. Há níveis alarmantes de violência. Temos também uma crise de impunidade, não só em relação à criminalidade, logo associada pela população aos roubos e homicídios, mas ainda no que diz respeito aos ataques ao patrimônio público. Isso sempre aconteceu, no entanto estamos em níveis cada vez mais alarmantes. A sociedade precisa ter o resgate da sensação de punibilidade. No caso da Lava Jato, pode-se ver que a corrupção estava enfronhada dentro do Executivo e do Legislativo Federal. E isso se reflete nas administrações estaduais e não falo só do Rio Grande do Norte. 


O combate à corrupção é a maior demanda de atuação?A sociedade cobra muito isso. Temos trabalhado muito para combater todo tipo de criminalidade. Há um esforço muito grande nos crimes contra o patrimônio público. Queremos resgatar a sensação de que o crime não compensa. Antigamente se dizia isso. Hoje nem se fala mais. Mas o combate à criminalidade, aos crimes que dilapidam o patrimônio público, deve resgatar essa ideia de que o crime não compensa.  

Há um aumento deste tipo de crime ou uma cobrança maior da sociedade ao combate à corrupção?
Há uma sensação de impunidade. E, a partir disso, um estímulo para que os agentes públicos que não resistem às tentações ingressem muito facilmente nessa prática de cometer a corrupção. Diria que hoje, devido à impunidade, os crimes ainda ocorrem, apesar de estarmos em uma época na qual mais se combate a corrupção. O Ministério Público Federal e dos Estados, do Rio Grande do Norte, e a Polícia Federal atuam. Há operações conjuntas. Mas não diminuem esse tipo de crime. Não quero dizer que isso é culpa do Judiciário do Rio Grande do Norte. Mas é um fato: com exceção da Lava Jato, os corruptos não ficam na cadeia. Há exceções, temos Fernando Freire, alguns envolvido na Operação Candieiro, que estão presos.
Houve a Operação Dama de Espadas, com a investigação suspensas pelo Tribunal de Justiça... 
Teve uma questão incidental, ali.

Como o senhor avalia, toda a montagem da investigação e o imbróglio que se tornou na Operação Damas de Espadas?
A Operação Damas de Espadas, o tempo todo, foi cercada de cuidados. A informação chegou do Coaf,  que é um órgão do Ministério da Justiça, e identifica transações bancárias suspeitas.  Foram apontadas operações bancárias fora do padrão de normalidade. Então, a promotoria de Justiça levantou informações, viu indícios de irregularidade e, a partir daí, instaurou o procedimento investigativo. Ouviu testemunhas e requisitou documentos. 

A partir daí as investigações se aprofundaram?
Na medida em que ela se aprofundou na investigação, percebeu que havia o envolvimento de pessoas de dentro da Assembleia, da área operacional. Identificou pessoas ligadas à folha de pagamento, à procuradoria de lá, como dona Rita. E continuou investigando até a deflagração da operação com busca e apreensão. Isso pode chegar a alguém com foro de prerrogativa de função em tribunais de Justiça? Pode. Ela viu que aqui e acolá surgia menção ao nome de alguém. Então ela fez o pedido ao juiz para compartilhamento de provas para que, sendo encontrada alguma coisa contra alguém que tenha prerrogativa de função e mereça aprofundamento, possa encaminhar à pessoa apropriada, seja o procurador-geral de Justiça, seja o procurador-geral da República, se for uma autoridade com foro no STJ. 

Mas teve que parar por uma decisão liminar...
Após a busca e apreensão, ela estava analisando e separando uma a uma [as provas] para encaminhar para mim ou para o procurador-geral da República. Então estava tudo dentro da perfeita normalidade e legalidade. Veio, então, aquela decisão, com o pedido da procuradoria do Estado. O desembargador acatou, deferiu uma liminar para suspender por achar que haveria o risco da promotora de Justiça estar investigando alguém que não deveria ser investigado por ela. Mas não estava. Ela foi a primeira pessoa que investigou e apurou o tempo todo em relação a servidores da Assembleia. De posse das informações que vieram, ela iria identificar. Se tivesse menção, por exemplo, a algum deputado, o que iria fazer? Iria mandar para o procurador-geral. Mas foi suspensa. Eu analisaria. Ainda vou [analisar]. Isso vai ter que acontecer, em um determinado momento. No momento estão suspensas. As investigações estão paradas, quando chegarem, vou  analisar e ver se o que há constitui motivo suficiente para abrir uma investigação contra alguém. Se tiver, vou solicitar ao Tribunal de Justiça para aprofundar a investigação. Há esse rito com relação a quem tem prerrogativa de função. 

A atual situação então é de paralisação?
No momento está suspenso. Mas vai chegar a ocasião em que a promotora vai ser autorizada a encaminhar esses documentos e eu vou decidir se devo ou não me aprofundar em relação a determinada pessoa. A promotora nem entra neste mérito. Basta que exista menção a alguém com prerrogativa de foro e ela só faz mandar. Eu vou analisar. No momento em que ela estava vendo o que ficaria com ela, porque interessa como prova para as pessoas que estão como atribuição dela, e o que poderia interessar ao procurador-geral de Justiça e ao procurador-geral da República, foi suspenso. Em algum momento, o Tribunal de Justiça vai ter que decidir [sobre o prosseguimento].


Do seu ponto de vista, houve uma tentativa de anular a investigação e tornar a Operação Dama de Espadas sem respaldo?
Não posso dizer isso. Posso dizer que, na prática, foi inoportuna. Está causando esse embaraço.  No momento, estamos com tudo parado. Nem está dando andamento a promotora de justiça, com relação aos fatos que cabem a ela se aprofundar e entrar com ações, nem o procurador-geral em relação aos fatos que existam, e nem estou dizendo que existem. Estou dizendo que ainda vou analisar, quando for encaminhado. No momento estamos parados e isso não interessa a ninguém ou pelo menos à apuração da verdade.


Houve gestões de algum Poder contra essa investigação?
Não, não. Para mim, foi total surpresa essa ação da procuradoria-geral do Estado. Fomos surpreendidos. 

Houve momentos com troca de notas, discussão acirrada entre a Procuradoria de Justiça e do Estado. Como viu aquelas discussões?
Acho que é natural.  A Procuradoria-geral do Estado emitiu uma opinião, defendo uma atuação. Nós entendemos, todo o Ministério Público, como algo extremamente indevido e inoportuno. Manifestamos que seria indevida a atuação da Procuradoria-geral do Estado em defesa, não da Assembleia, mas de possíveis direitos de membros da Assembleia. Vemos com algo descabido. Não cabia à Procuradoria-geral do Estado entrar com essa defesa de possível direito dos deputados.  Caberia a ela a defesa da Assembleia, mas, por enquanto, estão sendo investigadas pessoas bem determinadas: Dona Rita, Ana Paula e outras. 


Mas no momento em que a Procuradoria-geral do Estado fez a defesa, não assume que teria deputados envolvidos?
A Assembleia, claro, não colocou desta forma. Colocou como a defesa das prerrogativas dos membros da Casa. Se tiver alguém que esteja sendo investigado, que nem tem, porque nada me foi passado ainda, que seja pelo procurador-geral de Justiça. Eu não tenho qualquer dificuldade de investigar. Mas sequer deram a chance de chegar a mim. Pediram a suspensão do processo que o desembargador deferiu. O desembargador poderia ter dito: “Encaminhe tudo ao procurador-geral de Justiça, ele examina, se tiver algo fica com ele, se não, informa ao Tribunal e devolve ao promotor”. Mas não foi isso. No estágio em que encontra, está tudo paralisado.

É uma decisão estranha...

É, está parado.
Peticionamos lá um agravo regimental, que não foi provido. Mas ainda há o nosso recurso lá. E o desembargador, o relator e depois o Pleno vão ter que decidir. Ou manda para o promotor ou vai para a promotora, mas deixa a coisa andar. No momento, está tudo na geladeira.

A Procuradoria-geral de Justiça vai conseguir, depois de todos esses pleitos, uma apuração profunda?

Na hora em que chegar  aqui qualquer tipo de informação ou indício que possa ao menos sugerir a participação de algum parlamentar em ilícito, será investigado com todo o rigor, sem nenhuma dificuldade do procurador-geral. Se é que tem. Nem posso dizer se vai chegar, não tenho essa informação. 

O senhor disse que identifica uma impunidade. O que provoca essa impunidade?
Nosso sistema processual, que permite uma burocratização muito grande da instrução dos processos para que possamos chegar ao veredicto final do Judiciário. Para dizer se a pessoa agiu com culpa e deve ser condenado àquelas penas de reclusão e ressarcimento do erário ou até absolvido. Então, temos um sistema hoje de processo penal, um sistema, que é burocratizado, com uma infinidade de recursos que fazem com que os processos não andem. Dá uma sensação de impunidade para todos e para o agente público. Isso pode estimular a ingressar ao mundo do crime.

A atuação do Ministério Público corresponde aos gastos da sociedade com a instituição?

Fizemos uma pesquisa neste ano que mostra que a sociedade acredita no Ministério Público. A imprensa sabe que há uma credibilidade do Ministério Público. Claro que às vezes por uma questão remuneratória, por o Ministério Público ter uma das melhores remunerações do serviço público, juntamente com o Judiciário, as pessoas questionam se não está havendo muita vantagem. Isso é natural com relação a uma categoria que consegue manter um padrão remuneratório digno. Mas podemos ver que o Ministério Público tem muito credibilidade. E, falando particularmente da nossa experiência no Rio Grande do Norte, sabemos que a sociedade vê o nosso trabalho... Há uma aceitação. Na defesa do meio ambiente, da saúde, da criança e do adolescente, atuamos com muita firmeza. Temos na nossa gestão instrumentos para aferir a produtividade, a qualidade da atuação e a sociedade acha que a instituição é importante. 

O orçamento é elevado para os padrões do Estado?

Temos um custo elevado. Neste ano vamos terminar perto de R$ 270 milhões. E precisamos sempre ficar questionando: O Ministério Público vale tudo isso? Mas vamos imaginar se hoje, no Rio Grande do Norte, não tivesse Ministério Público. Existiria outra instituição que combatendo a corrupção como o Ministério Público? Tentando atuar no combate à criminalidade como fazemos? Há uma quantidade de prefeitos afastados, que roubavam milhões. Só no caso do Idema, havia desvios de R$ 19 milhões. Na Dama de Espadas, irregularidades de R$ 5 milhões. Esses números, se forem detalhados, tendem a crescer. A atuação do Ministério Público, inclusive, não pode ser medida só com esses dados. Quanto vale a defesa do meio ambiente, da saúde pública, da criança e do adolescente? Temos que fazer mais, sem custar mais. Há um ritmo de crescimento das despesas, mas é preciso controle.

O Ministério Público vai custar neste ano R$ 270 milhões. Mas é um ano difícil para a arrecadação com crescimento abaixo da inflação, enquanto os repasses ao Ministério Público aumentam. Há cortes no MP?
No ano passado, nossos gastos foram de R$ 250 milhões. Estou falando de duodécimo e da arrecadação própria. Isso significa que o crescimento das despesas foi inferior a 10%. Mas estamos fazendo ajustes. E há propostas ousadas. Nunca se falou antes da redução do número de promotores de Justiça. Imaginava-se sempre que, com o aumento de serviço, da população, das cobranças, da demanda, haveria mais promotores. Hoje não trabalhamos mais com essa ótica. A ideia é fazer mais, sem custar mais. Falamos em diminuir o número de promotores de Justiça. Temos proposta em tramitação aqui, no Colégio de Procuradores, para extinção de promotorias, que significa diminuição do número de promotor, servidor, assessor, cargo comissionado, serviços relacionados, como vigilância.  

Quais promotorias seriam extintas?
Em algumas cidade do Rio Grande do Norte, como São Rafael, São João do Sabugi, Janduís, Taipu e Pedro Avelino. Serão extintas e a comarca atendida pela promotoria vizinha. Fizemos esses estudos. Hoje são 236 promotores. Queremos avançar com essa racionalização para Natal, sem reduzir os serviços. Os momentos de crise levam a adotar algumas dessas medidas. 

Promotorias de Saúde, Educação e Criança e Adolescente e Meio Ambiente seriam atingidas?

Do modo que estamos propondo  não haverá prejuízo para as comunidades e matérias que  trabalhamos. Este ano diminuímos, em Natal, uma promotoria. Foi uma Promotoria de Registro Público, que fiscaliza os serviços dos cartórios, uma área muito mais administrativa. E vimos que não precisava de duas. Enfim, podemos ter enxugamentos. 

O orçamento do próximo ano vai ser de quanto?

Propusemos um orçamento de R$ 313 milhões. Temos diversos projetos que são para trabalhar a estrutura do Ministério Público. Temos sedes para construir, medidas para diminuir gastos com vigilância. Há um projeto pronto que vai custa R$ 5 milhões para monitoramento de todas as promotorias de Justiça. Alguns projetos que demandam investimentos. Mas sabemos que talvez a Assembleia não aprove esse orçamento e pode ficar um pouco menor, desde que não inviabilize o funcionamento. 

O Ministério Público enviou para a Assembleia, que aprovou, e o MP já deve ter implementado, um reajuste para os servidores do órgão, mesmo estando acima do limite prudencial...
Está dentro do limite prudencial.

Está dentro o acima do limite prudencial?
Dentro, o limite prudencial é  entre 1,90 e 1,99%. 

Recentemente saiu uma notícia no Conjur, site de notícias jurídicas, apontando que o MP do Rio Grande do Norte está acima e é o maior gasto proporcional com folha do país...
Talvez o jornalista, a pessoa que fez [a reportagem] não saiba direito o que é. O prudencial é uma faixa entre 95 e 100% do limite de gastos com pessoal.  Temos um limite de despesa com folha de pagamento que é de 2% da Receita Corrente Liquida. Esse é o limite legal. A lei prevê que a partir de 95% é o limite prudencial, até 99,9%. Estamos dentro, não estamos acima. Se estivéssemos acima, teríamos ultrapassado o limite legal.

Mas dentro do limite prudencial, não seria mais adequado, mais prudente, adiar o aumento em função destas faixas da Lei de Responsabilidade Fiscal?
Não haveria a necessidade, porque temos outras medidas que esperamos adotar e, com isso, nem entrar no limite legal, começar a baixar. Temos planos. Sem resultado, haverá medidas antipáticas, até exoneração. Prevíamos um reajuste de 6% para os servidores, porque a expectativa era acima de inflação, acima de 5% e aproximamos para 6%. Temos uma lei complementar estadual que diz que todo ano deve ser dado a correção da inflação para os servidores. Claro que a lei maior é a de Responsabilidade Fiscal. Mas abre exceção para a chamada revisão geral anual. Por isso, foi dado o reajuste para os servidores, dentro desta possibilidade legal. Por que não afirmamos: Este ano não tem nada? Já tínhamos separado o recursos no orçamento. Consideramos mais justo dar o reajuste, abaixo inclusive da inflação. Seria até mais justo a reposição da inflação, com seria para todo trabalhador. Mas como estava reservando esta parte do orçamento, concedemos aos servidores.


TRIBUNA DO NORTE
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Não tem como deixar de entender que estaria em curso uma espécie de "operação abafa" em relação a "Dama de Espadas". O procurador foi claro e direto e a leitura de suas palavras deixa a triste impressão de que os poderosos sempre contam com mecanismos mais eficientes de proteção.

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