Resumo
O presente artigo analisa o cooperativismo brasileiro a partir de uma perspectiva histórica, política e socioeconômica, articulando-o com os princípios da economia solidária, com a agricultura familiar e com os desafios contemporâneos da reprodução do capital no espaço rural. Fundamentado em vasta literatura e fontes institucionais, o texto discute a evolução do modelo cooperativo, sua inserção nas políticas públicas, o papel das cooperativas agropecuárias e de crédito, e os desdobramentos do cooperativismo alternativo promovido por movimentos sociais como o MST. Conclui-se que o cooperativismo constitui uma estratégia relevante para a democratização econômica e a revitalização territorial, embora permaneça tensionado por contradições entre os princípios da solidariedade e a lógica do mercado capitalista.
Introdução
O cooperativismo é uma forma organizacional fundada na associação voluntária de pessoas para a realização de objetivos econômicos e sociais comuns, com base na autogestão, na propriedade coletiva e na solidariedade. No Brasil, sua trajetória é marcada por períodos de expansão, repressão e reconfiguração, acompanhando os processos históricos de modernização econômica, políticas agrárias e dinâmicas territoriais. A partir da década de 1990, o cooperativismo adquire novo fôlego com a ascensão da economia solidária, propondo uma alternativa ao modelo neoliberal dominante (Singer, 2002; Gaiger, 2014).
Origens e desenvolvimento histórico
Conforme Rios (2017) e Salomão (2007), o cooperativismo brasileiro tem raízes no final do século XIX, com experiências inspiradas nos modelos europeus, especialmente o rochdaleano. Seu desenvolvimento foi intensificado no século XX com o apoio do Estado, notadamente durante o regime militar, quando passou a integrar políticas de desenvolvimento agrícola e crédito rural. Essa fase, embora marcada por crescimento quantitativo, foi criticada por sua verticalização e afastamento dos princípios cooperativistas originais (OCB, 2019).
Cooperativismo agropecuário e rural
As cooperativas agropecuárias desempenham papel fundamental na estrutura produtiva rural brasileira, especialmente no Sul e Sudeste. Contudo, no Nordeste, como demonstram estudos sobre o cooperativismo em Itaú (RN) e o Sertão do Apodi (Lima, 2014), os desafios da agricultura familiar e da escassez de infraestrutura limitam o alcance dessas organizações. Ainda assim, iniciativas como a COAPIL demonstram o potencial das cooperativas em articular produção, beneficiamento e inclusão social em contextos semiáridos (Silva, 2019).
Cooperativismo de crédito: expansão e inclusão financeira
O cooperativismo de crédito tem crescido de forma expressiva no Brasil, contribuindo para a bancarização em áreas rurais e urbanas periféricas (BACEN, 2020). Modelos como o do SICOOB e SICREDI representam alternativas aos bancos tradicionais, com estrutura democrática e proximidade com os associados. Contudo, há críticas quanto à crescente financeirização dessas entidades e à perda de caráter solidário em prol de metas mercadológicas (Santos & Calegari, 2009).
Economia solidária e cooperativismo alternativo
O movimento da economia solidária, fortalecido após a década de 1990, resgata a autogestão como princípio central da organização do trabalho. O MST, nesse contexto, promove um modelo de cooperativismo alternativo voltado à emancipação dos trabalhadores e à soberania alimentar (MST, 2012; UFPR, 2017). Essas cooperativas, muitas vezes informais, enfrentam dificuldades de financiamento e regularização, mas expressam a luta por uma economia centrada nas pessoas e não no lucro (Gaiger, 2014; Cattani, 2009).
Princípios, valores e contradições do cooperativismo
Segundo a doutrina cooperativista (OCDE, 1995), os princípios de adesão voluntária, gestão democrática, participação econômica, autonomia, educação, intercooperação e compromisso com a comunidade constituem a base do cooperativismo. No entanto, o distanciamento desses princípios, sobretudo em grandes cooperativas voltadas ao agronegócio, suscita críticas sobre sua real contribuição à justiça social e ao desenvolvimento sustentável (Diniz, 2015; Pacheco, 2014).
Cooperativismo e desenvolvimento territorial
A experiência brasileira demonstra que o cooperativismo pode ser um agente de revitalização dos espaços rurais, ao gerar renda, fortalecer laços comunitários e ampliar o acesso a bens e serviços. Estudos realizados pela EMBRAPA e pela Sudene (PRDNE, 2020) apontam que o fortalecimento de redes cooperativas, em especial na agricultura familiar, pode potencializar o desenvolvimento local sustentável. No entanto, isso requer políticas públicas de apoio técnico, crédito orientado e marcos regulatórios inclusivos.
Considerações finais
O cooperativismo brasileiro apresenta uma trajetória complexa, marcada por múltiplas influências e formas organizativas. Enquanto instrumento de resistência, inclusão e desenvolvimento, revela grande potencial. Todavia, enfrenta tensões internas entre sua base ética e as exigências do mercado capitalista. A articulação entre cooperativismo e economia solidária pode representar um caminho estratégico para a construção de um novo paradigma de desenvolvimento, mais justo e democrático.
TEXTOS SELECIONADOS E FONTES PARA PESQUISAR SOBRE COOPERATIVISMO:
Democracia cooperativa: uma introdução ao pensamento político de John Dewey
LINK AQUI
O cooperativismo no Rio Grande do Norte
A Doutrina do Cooperativismo: Análise do Alcance, do Sentido e da Atualidade dos seus Valores, Princípios e Normas nos Tempos Atuais
Livro Introdução à economia solidária - AQUI
Desemprego tecnológico: Ricardo, Marx e o caso da indústria de transformação brasileira (1990-2007).
AQUI
Cooperativismo: uma alternativa econômica - AQUI
Economia solidária versus economia capitalista - AQUI
Cooperativismo: um agente de mudança - AQUI
A NOVA FACE DAS POLÍTICAS DE DESENVOLVIMENTO DO BANCO MUNDIAL
https://cartainternacional.abri.org.br/Carta/article/view/478/317
COOPERATIVISMO E REPRODUÇÃO DO CAPITAL NO ESPAÇO RURAL BRASILEIRO
http://observatoriogeograficoamericalatina.org.mx/egal15/Geografiasocioeconomica/Geografiaagricola/04.pdf
Cooperativas de Crédito História da evolução normativa no Brasil
https://www.bcb.gov.br/content/publicacoes/outras_pub_alfa/livro_cooperativas_credito.pdf
COOPERATIVAS E REVITALIZAÇÃO DOS ESPAÇOS RURAIS
http://seer.sct.embrapa.br/index.php/cct/article/view/8797/4940
O COOPERATIVISMO DE CRÉDITO E A BANCARIZAÇÃO NO BRASIL
http://tcc.bu.ufsc.br/Economia298944.pdf
Vantagens proporcionadas às pequenas e médias empresas por meio da união em redes de cooperação no contexto do venture capital
https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1415-65552009000400005&script=sci_arttext
A EXPRESSÃO DO COOPERATIVISMO DE CRÉDITO MUNDIAL E SEUS PRINCIPAIS MODELOS
https://adm-portal.appspot.com.storage.googleapis.com/_assets/modules/academicos/academico_1355.pdf
O COOPERATIVISMO: UMA REFLEXÃO TEÓRICA
http://www.mobilizadores.org.br/wp-content/uploads/2014/05/coop-reflexao-teorica.pdf
O COOPERATIVISMO/ASSOCIATIVISMO EM PORTALEGRE-RN: RESULTADOS E DESAFIOS
https://www.editorarealize.com.br/revistas/erespp/trabalhos/TRABALHO_EV102_MD1_SA1_ID157_13112017172752.pdf
COOPERATIVISMO: uma breve discussão teórico‐conceitual perpassando pelo socialismo utópico, marxista e anarquista
PANORAMA DO COOPERATIVISMO BRASILEIRO: HISTÓRIA, CENÁRIOS E TENDÊNCIAS
https://www.researchgate.net/profile/Inessa_Salomao/publication/242251864_PANORAMA_DO_COOPERATIVISMO_BRASILEIRO_HISTORIA_CENARIOS_E_TENDENCIAS/links/555deccd08ae86c06b5f29ba.pdf
PANORAMA DO COOPERATIVISMO NO BRASIL: censo, exportações e faturamento
http://www.iea.sp.gov.br/ftpiea/publicacoes/tec4-0808.pdf
Cooperativismo agropecuário nordestino: diagnóstico e tipologia
https://teses.usp.br/teses/disponiveis/54/54131/tde-20191218-155038/publico/SilvaMarcosSoaresDa.pdf
Cooperativismo em Itaú/RN: a contribuição da COAPIL para o desenvolvimento a partir da percepção dos associados e cooperativados
PORTAL BRASILEIRO DE DADOS ABERTOS
http://www.dados.gov.br/
ESTUDO SOBRE A ORGANIZAÇÃO DA PRODUÇÃO EM ÁREA DE ASSENTAMENTO NO SUDESTE DO PARÁ
http://www.ppgdstu.propesp.ufpa.br/ARQUIVOS/Dissertacoes/2004/Dissertacao%20Dion%20Carvalho.pdf
Dados consolidados dos Sistemas Cooperativos » OCB – Organização das Cooperativas do Brasil
As práticas do cooperativismo no território sertão do Apodi (RN): potencialidades e limitações para agricultura familiar
https://repositorio.ufrn.br/jspui/handle/123456789/21738
https://repositorio.ufrn.br/jspui/bitstream/123456789/21738/1/JessicaSamaraSoaresDeLima_DISSERT.pdf
Plano Regional do Desenvolvimento do Nordeste (PRDNE)
http://www.sudene.gov.br/images/arquivos/planejamento/PRDNE/PR_consolidado__Org_Esp_Regional_PDF.pdf
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