quarta-feira, 26 de outubro de 2011

A política de implantação dos perímetros


» Emanoel Nunes - professor da UERN

A ideia original, com os perímetros irrigados, era modernizar a agricultura e dar a oportunidade para pequenos produtores? Por que não deu certo?

Primeiro, a ideia de "modernização da agricultura" veio de uma época, os anos 1960 a 1970/1980, onde havia uma crença muito forte de que   as formas tradicionais rurais de exploração (entre elas os pequenos agricultores e os latifundiários de características ainda feudais) não se faziam adequadas para a promoção do capitalismo que geraria o desenvolvimento econômico e enquadraria o país como economia avançada. Para os planejadores e técnicos do Estado, aqui especialmente os do DNOCS, para atuar em um ambiente de irrigação os produtores teriam que apresentar como requisitos um aporte elevado de capital financeiro e um conhecimento técnico compatível com o que eles (os técnicos) julgavam ser o melhor para este ambiente. E mesmo os movimentos sociais defensores dos pequenos tendo conquistado uma parcela dos lotes, estes pequenos produtores foram abandonados à própria sorte sem o direcionamento de políticas públicas de apoio à produção, organização e comercialização.

No Vale do Açu vemos a presença de empresas dentro do perímetro. Além disso, nas terras de "colonos" percebemos que os donos mal freqüentam a terra, deixando o trabalho para trabalhadores rurais assalariados. Isso não distorce a ideia de perímetro irrigado público?

Grande parte dos "colonos", os pequenos produtores, desistiu do Perímetro do Baixo-Açu ainda em 1994 logo após ter sido inaugurado. Este perímetro ficou sem operação produtiva até 1998 e quase foi extinto. Na tentativa de sua reativação em 1998 os lotes abandonados foram sendo ocupados por produtores de outros estados, especialmente da Paraíba e Pernambuco. E a forma de exploração desses produtores "de fora" passou a caracterizar o perímetro não como um ambiente de agricultura familiar diversificada, mas de um ambiente de exploração empresarial, mesmo explorando áreas de 8,16 hectares. E o que deveria ser um ambiente dinâmico, adequado para o desenvolvimento de uma agricultura moderna passou a se definir como um ambiente de exploração homogênea (apenas banana) e dependente ao extremo de recursos do Estado. Apenas o Ministério da Integração Nacional injetou a partir de 2005 mais de R$10 milhões para que, novamente, o perímetro não fechasse. Além disso, quase todos os proprietários não moram nos lotes, tornando o perímetro um deserto humano e um sistema de produção em que impera relações de trabalho atrasadas, inclusive com a identificação de trabalho escravo pelo Ministério do Trabalho no início desta década.

Eleger a irrigação, através da criação e expansão dos perímetros, como cura para o mal da seca e do atraso no campo era um raciocínio equivocado? Ou simplesmente foi a política de expansão que não foi levada adiante com êxito?

As duas coisas. Tanto a forma de eleger a irrigação como "redenção" para o semiárido brasileiro partiu de um raciocínio equivocado, como a política de expansão não teve êxito. Com relação à primeira, o raciocínio passava a desprezar totalmente a capacidade do agricultor no nível local, bem como da agricultura tradicional. E para se ter uma ideia, a inspiração no modelo americano da Califórnia se tornou uma falsa crença.

Fonte: Tribuna do Norte – outubro de 2010

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