terça-feira, 1 de maio de 2012

Comitê investiga mortes maternas na região Oeste

Margareth Grilo - repórter

O Comitê Estadual de Mortalidade Materna está investigando as circunstâncias da morte de duas gestantes no município de Mossoró (RN), na segunda quinzena de março. A informação foi confirmada pela vice-presidente da Sociedade de Ginecologia e Obstetrícia do RN (Sogorn), Maria do Carmo Lopes de Melo. "Os municípios de residência dessas mulheres e o hospital onde foram registradas as mortes foram orientados a fazer a investigação", afirmou a médica.

Emanuel AmaralMaria do Carmo Lopes: investigação sobre mortes de gestantesMaria do Carmo Lopes: investigação sobre mortes de gestantes


Segundo Maria do Carmo, no caso do município, focar a investigação em três pontos: ambulatorial, familiar e hospitalar. "Já o hospital", acrescentou a médica, "precisa averiguar as condições em que se deu a ocorrência para podermos avaliar se era uma morte evitável". Uma das mulheres, uma jovem residente em Assu, de apenas 16 anos, grávida de cinco meses, morreu no dia 14 de março, quando era levada para  atendimento no Hospital Parteira Maria Correia - o Hospital da Mulher, de Mossoró.

Segundo informações dadas pelo presidente do Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Norte (Cremern), Jeancarlo Fernandes, a jovem teria chegado sem vida ao Hospital da Mulher. A outra grávida, Jércia Fameli, de 26 anos, morreu no dia 22 de março. Residente em Mossoró, Jércia estava internada na Casa de Saúde Dix-sept Rosado (CSDR), teve complicações no pós-parto e o quadro evoluiu para uma situação de UTI, indisponível na unidade.

Na época, os cinco leitos de terapia intensiva (adulto) da CSRD estavam sem funcionar por falta de profissionais. Os médicos tentaram  transferência para a UTI do Hospital da Mulher, mas Jércia não resistiu. Morreu dentro da ambulância do Samu, a caminho do HMM. A vice-presidente da Sogorn, Maria do Carmo, afirmou que a entidade tem cobrado dos municípios e do Estado que intensifiquem a vigilância de forma a reduzir os óbitos.

O Rio Grande do Norte, segundo dados do Ministério da Saúde (2009), regista entre 81,0 e 95,5 mortes maternas por cada 100 mil nascidos vivos. Somente em Mossoró, segundo informações do Portal ODM (Acompanhamento dos Objetivos do Milênio), a relação é de 76,8 mortes maternas por 100 mil nascidos vivos (2010), bem acima da taxa brasileira, que é de 68/100 mil nascidos vivos.

Segundo Maria do Carmo, a situação da obstetrícia é preocupante. "Para que se tenha uma sala de parto funcionando normalmente, com garantia de pleno atendimento, é preciso ter recursos humanos qualificados", disse ela. Além disso, as unidades que recebem paciente de médio e alto risco precisam dispor de UTI.

Segundo a médica, o governo do Estado vem sendo alertando das precariedades. Na sala de parto, além do obstetra, é preciso que se tenha um pediatra, uma enfermeira obstétrica e um anestesista. "É uma garantia do SUS que a mulher seja atendida com analsegia, se não quiser sentir dor", afirmou a médica. Uma das promessa para melhorar a assistência obstétrica é a Rede Cegonha, que no Estado ainda está em fase de planejamento. 

Ontem, a reportagem da TRIBUNA DO NORTE entrou em contato com a Assessoria de Comunicação da Sesap para solicitar informações sobre número total de leitos da obstetrícia disponíveis em todo o Estado e, especificamente, na região Oeste, e sobre a estruturação da Rede Cegonha, mas não houve retorno às solicitações feitas. A coordenadora da Rede Cegonha, Acácia Cândido também foi contatada, mas estava em reunião.



Promotora defende mobilização

Para a promotora de Justiça da Saúde, Iara Pinheiro, a questão do subfinanciamento da saúde é um problema, mas "a má gestão hoje é muito maior". "Só se apaga incêndio no Estado e no Município. A sociedade tem que se articular e cobrar", afirmou durante o Fórum Liberdade, Fraternidade e Saúde Pública, realizado no sábado passado, pela Ordem dos Advogados do Brasil (Secção RN).

Iara Pinheiro criticou a forma como o governo vem gerenciando  a saúde. "As terceirizações estão vindo mascaradas", disse a promotora, "porque, sem a licitação, o governo contrata empresas que não têm condições, não tem a menor estrutura e termina colocando à disposição da população um serviço que não é qualificado, com um risco enorme". 

A promotora citou como maior exemplo o Hospital Parteira Maria Correia - o Hospital da Mulher, de Mossoró. Em 20 de fevereiro, a Sesap firmou Termo de Parceria com a Associação Marca para a gestão da unidade. Do valor total do contrato, R$ 15,8 milhões, já pagou R$ 8,033 milhões. A unidade que tem 36 leitos realizou até agora, segundo informações enviadas a TN pela Assessoria de Imprensa do hospital, 170 partos.

"A linha de terceirização que o governo adota", disse a promotora, em entrevista à TN, pouco antes do evento na sede da OAB-RN, "é mal feita e a ausência de licitação tem permitido inconsistências nesses processos". Iara Pinheiro disse que no caso do Hospital da Mulher algumas situações preocupam. "O conflito ético está patente na hora em que o diretor da unidade é o mesmo diretor do Hospital Regional Tarcísio Maia", asseverou.

Em reportagens publicadas, no decorrer da semana passada, a TRIBUNA DO NORTE trouxe denúncias do Conselho Estadual de Saúde (CES-RN) de que o diretor do HRTM, Diego Dantas, também dirige o Hospital da Mulher. Iara Pinheiro também considerou "absurdo" o fato de toda a rouparia do HMM estar sendo lavada no HRTM. Essa lavagem é feita à noite e termina prejudicando a lavagem da rouparia, que se acumula durante o dia, no hospital regional.

No Termo de Parceria entre a Sesap e a Associação Marca há previsão de R$ 6 mil mensais para serviços de lavanderia. A promotora disse que "em regra geral a relação com o governo do Estado tem sido de conflito porque há todo um não fazer". Ela também criticou o projeto de lei que regula as Organizações Sociais, por permitir contratação sem licitação. O PL está discussão na Assembleia Legislativa.

Precarização do trabalho

Os presidentes do Sindsaúde, Sônia Godeiro, e do Sindicato dos Médicos do RN (Sinmed), Geraldo Ferreira, denunciaram a precarização das relações de trabalho. As duas entidades constataram, em inspeções feitas no HMM, não apenas a terceirização da atividade-fim, mas a 'quarteirização'. A Associação Marca fez subcontratos com empresas de fora do Estado para a contratação de médicos e enfermeiros. Geraldo Ferreira considerou a parceria "uma imoralidade jurídica".

O diretor do Sinmed, em Mossoró, Ronaldo Fixina afirmou que a A.Marca "está contratando de Pessoas Jurídicas, agenciadoras de médicos, que, às vezes, têm atuação duvidosa". A prática da 'quarteirização' foi condenada, em 2011, pelo Ministério Público Estadual, no caso da limpeza pública de Natal. A Urbana teve que pôr fim aos subcontratos, firmados pela empresa Trópicos, terceirizada pela Companhia.

Outras situações preocupam: no mês de março, o Conselho Regional de Medicina (Cremern) flagrou dois médicos, que não possuem o CRM, no Rio Grande do Norte, trabalhando normalmente, e pessoas de nível técnico atuando como auxiliar de anestesia. As duas situações não são permitidas por lei.

No primeiro caso, os médicos já deram entrada junto ao Cremern no pedido de CRM local. "Nos estranha muito", afirmou Fixina, "que na área da anestesia, que tem gente suficiente e bem capacitada, em Mossoró, ninguém tenha sido contatado para se candidatar a prestar o serviço". A anestesia, segundo informou o médico, tem 194 profissionais na cidade.

A informação do Sinmed é de que a A.Marca contratou empresas das cidades de Morada Nova (CE) e da cidade de São José do Vale do Rio Preto (RJ). "Se teve licitação, não se sabe como foi e porque não foi divulgada. No caso da Anestesia, além de empresas de Mossoró", disse Fixina, "a Cooperativa de Anestesistas do RN (Coopanest) teria interesse em participar e com certeza ofereceria um serviço com mais segurança e mais econômico".

Ele adiantou que solicitou ao HMM a escala de anestesia, para identificar os profissionais contratados, e se houver irregularidades o caso será denunciado à Associação Brasileira de Anestesiologia. Ele criticou a falta de transparência na escala de médicos da unidade. Na última semana, depois de reportagem da TN, publicada no domingo, 22, a Sesap fez publicar a escala de plantões das unidades em seu site, com exceção da escala do HMM.

Tribuna do norte

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