José Paulo Kupfer
Divulgado na véspera do 1º. de maio, o relatório da
Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre as perspectivas do
emprego no mundo, edição 2012, é um libelo contra as políticas de
austeridade fiscal e flexibilização trabalhista, adotadas principalmente
na Europa, como remédio para enfrentar a crise econômica global.
Segundo Raymond Torres, principal autor do levantamento, não só a
austeridade fiscal não produziu crescimento econômico como as reformas
trabalhistas implantadas são ineficientes e tendem a promover mais
desemprego.
Traduzida em números, a situação é alarmante. A previsão da OIT é de
que o desemprego no mundo atingirá mais de 200 milhões de pessoas neste
ano, volume 6% superior ao estoque de desocupados em 2011. Em média, 40%
dos trabalhadores entre 25 e 49 anos, no auge, portanto, da vida
produtiva, estão sem emprego, no mundo desenvolvido. Em certas
economias, como a da Espanha, o desemprego entre jovens até 25 anos
atinge proporção impensável de um a cada dois. Não há, de acordo com a
OIT, perspectiva de reversão do desemprego global aos níveis de 2008 –
ou seja, 180 milhões de desempregados –, pelo menos antes de 2016.
As sombrias tendências apontadas pela OIT aparecem agora como
coroamento dos dados e projeções igualmente sombrios em relação às
tendências econômicas divulgados nas últimas semanas. A piora
generalizada dos números e das expectativas, em ambiente de
turbulências, marcado pela queda de uma dezena de governos e o possível
deslocamento do pêndulo político na França, com seu peso específico nas
decisões da União Europeia, parece ter, finalmente, aberto um furo na
couraça da receita única para a superação da crise até agora aplicada.
É fato que medidas draconianas de cortes em gastos públicos, isoladas
de ações de indução aos investimentos, não estão produzindo os
resultados alardeados. As restrições orçamentárias, centradas na
eliminação de benefícios sociais, têm, ao contrário, promovido
estagnação econômica e aumento do desemprego, sem conseguir reduzir
déficits e dívidas públicas.
Não se deveria confundir o relativo sucesso do Banco Central Europeu
(IBCE) no esforço de assegurar um mínimo de estabilidade ao sistema
bancário da região com a superação dos problemas econômicos e muito
menos dos dramas sociais que as medidas de austeridade têm imposto às
populações das economias afetadas pela crise. Os bancos estão agarrados a
uma boia de liquidez, o que não deixa de ser um ponto positivo, mas não
têm sabido o que fazer com ela.
Agora, lideranças da região, à frente a chanceler alemã, Angela
Merkel, acenam com “uma agenda de crescimento”, a ser discutida já na
reunião de cúpula da União Europeia, prevista para fins de junho. A
novidade é uma reação, aparentemente improvisada e ainda não detalhada, à
dificuldade de contornar a incontornável constatação de que a fórmula
da austeridade não está surtindo efeito. Investimentos, sobretudo em
infraestrutura, seriam a chave dessa nova agenda.
Antes de acreditar na mudança de ótica, porém, não custa manter
algumas doses de ceticismo. Ao anunciar o foco na “agenda do
crescimento”, Angela Merkel trouxe para os holofotes o apagado Banco
Europeu de Investimentos (BEI), uma agência de fomento regional, com
fundos garantidos pelos países da União Europeia, até aqui mais voltado
para o financiamento de longo prazo de pequenas e médias empresas.
Reforçar o BEI, como sugeriu a chanceler alemã, para que ele
impulsione investimentos públicos e privados, exigirá destinar-lhe
recursos em grossos volumes. Em seu balanço de atividades de 2011, o BEI
mostra que é um primo pobre das instituições financeiras oficiais da
região, com projetos aprovados no ano em montante pouco superior a 50
bilhões de euros.
Como previsto por operadores mais experientes, a presente fase da
crise global confirma sua característica de se assemelhar a um 2008 em
câmera lenta. Não há colapso, os bancos sobrevivem, ainda que, em meio a
desconfianças gerais, funcionem a meia carga, mas a renda reflui, a
arrecadação pública encolhe e o investimento se retrai.
A verdade é que, mesmo que as medidas de austeridade consigam, seja a
que custo for, estancar as sangrias fiscais, elas, sozinhas, sempre
serão insuficientes – para não dizer inócuas – na solução do real
problema que afeta as economias encalacradas da Europa. Potencializado
pelo prisão do câmbio fixo que o euro lhes trouxe, esse problema atende
pelo nome de competitividade e está afeto não ao departamento fiscal,
mas ao do balanço de pagamentos. Enquanto esse lado da moeda não for
atacado, a crise tem poucas chances de se resolver.
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