AUTORES: GILBERTO MATHIAS & PIERRE SALAMA
LIVRO: O ESTADO SUPERDESENVOLVIDO
EDITORA: BRASILIENSE, 1983.
O texto trata da natureza de classe que o Estado
capitalista assume. Aponta como nos países desenvolvidos sua natureza de classe
é derivada do capital e nos países subdesenvolvidos é derivada da economia
mundial constituída.
ESTRUTURA DO TEXTO:
Primeira parte: A natureza
de classe do Estado.
·
O Estado é uma
abstração: Kant define o Estado abstrato justamente como a ilusão do lugar
institucional em que uma comunidade real, múltipla, variada e contraditória
encontra sua unidade, medida e identidade, sendo uma projeção autonomizada da
sociedade que retorna sobre ela para formar um todo indissolúvel, através da
sintetização e do regramento.
·
Países
desenvolvidos: Estado =
sua natureza de classe deriva do capital;
·
Países
subdesenvolvidos: Estado =
sua natureza de classe deriva da economia mundial constituída;
Regime político: é distinto do Estado. A relação
que liga o Estado ao regime político é, ao mesmo tempo, uma separação e uma
dependência.
Uma separação, na
medida em que traduz a constituição de dois conceitos, situados em
diferentes níveis de abstração;
Uma dependência,
porque o regime político é a forma de manifestação (existência) do Estado.
Características do regime político:
a) Pelo tipo de autonomia que apresenta em relação as
classes sociais;
b) Pela diferenciação que opera entre as classes;
c)
Pela legitimação
que obtém;
d) Pela autonomia em relação aos paises centrais (paises
subdesenvolvidos).
Formas “desviadas” da existência do Estado
capitalista:
País desenvolvido com regime político de orientação
popular:
# Como o Estado deriva da categoria capital ocorre uma
contradição entre a necessidade objetiva de reprodução do capital (que só é
possível com a exploração do trabalhador) e a sua materialização (tendo em
vista que o regime político de orientação popular dificulta a exploração).
# Soluções possíveis:
1 – O regime político se dilata graças a dinâmica
revolucionária dando origem a um novo Estado;
2 – Ocorrem a desmobilização das massas
possibilitando ao Estado cumprir o seu papel (reprodução do capital). Essa
adaptação pode ser lenta e caótica graças a desmobilização gradual das massas
ou pela via militar (golpe para restituir a “ordem”).
Essa concepção do Estado e do regime político é rica
ao nível da filosofia da história. Ela permite compreender que “os homens fazem
livremente sua história, mas em condições que não são livremente determinadas
por eles” (Marx).
Qual é o determinante fundamental a ser descoberto?
Capítulo 1:
Nos países capitalistas desenvolvidos
O Estado é um “capitalista coletivo ideal” (Engels).
Sua natureza de classe é derivada da categoria capital. A partir desta
afirmação, os autores passam a demonstrar (justificar) a correção da abordagem
empregada.
1 – O Estado aparece como o que não é
# Aparece como neutro, ou seja, cria a impressão de um
Estado situado acima das classes.
# A aparente neutralidade do Estado repousa sobre o
fetiche da mercadoria:
A relação de troca de “equivalentes” se torna tão
comum que não é questionada.
# Quantidade de trabalho = salário à generalização da mercadoria à fetiche.
A exploração é ocultada, tem-se a impressão que uma relação
de igualdade predomina, logo, o papel do estado é camuflado (neutro), pois
assegura uma relação igualitária.
# Fatores que fazem o Estado aparecer como o que não
é:
a) Onipresença;
b) Continuidade administrativa: não ocorrem mudanças
significativas;
c)
Legitimidade dos
governos (democracia).
#A natureza do Estado é capitalista. É o garante da
manutenção da relação de produção.
2 – Derivação lógica da natureza de classe do Estado.
= Quando ocorre a generalização da força de trabalho
como mercadoria mostra-se a relação de produção subjacente: dinheiro ao comprar
força de trabalho assume o caráter de capital.
# A sucessão das categorias:
M (mercadoria)
à V (valor) à D (dinheiro) à C (capital)
Para se compreender uma categoria tem-se que recorrer
a categoria que lhe sucede. Assim, para se compreender a categoria capital
tem-se que entender as funções do dinheiro, por sua vez, a compreensão do papel
do dinheiro só é possível recorrendo-se a análise das formas do valor (relação
social de dominação).
# Para os autores só é possível compreender as causas
do movimento real da sociedade quando prosseguimos a análise. Sem a categoria
“Estado”, a categoria “capital” não pode ser concebida. A categoria “Estado” é
necessária para se compreender a própria instituição da relação de produção.
Afinal, é o Estado que garante a manutenção das relações de produção
(repita-se: a relação de produção reflete uma relação social de dominação).
# Assim, a sucessão das categorias:
M (mercadoria) - V (valor) - D (dinheiro) - C (capital) - E (Estado).
# O Estado deriva da categoria capital por duas razões:
1 – é o garante da manutenção das relações de
produção;
2 – participa de modo decisivo na própria instituição
dessas relações (países subdesenvolvidos em que o Estado atua diretamente na
produção).
Veja-se: a aparente troca igualitária (venda da força
de trabalho por um salário – esfera da circulação) reflete uma coisificação das
relações de produção (fetichismo da mercadoria), mas a própria acumulação de
capital atua como elemento desfitichizador, uma vez que, demonstra de forma inequívoca
que a pseudo-igualdade das relações de troca inexiste.
# O Estado é a resposta a essa desfitichização:
garantindo o respeito pelas regras da troca, ele garante a possibilidade da
exploração e de sua perenidade.
RESUMO:
# A generalização da mercadoria tem dois efeitos
contraditórios:
1 – fetichiza as relações sociais;
2 – desfetichiza-as.
O primeiro efeito faz com que o Estado apareça como
acima das classes sociais.
Do segundo efeito deriva a necessidade lógica da
existência do Estado: garante da manutenção das relações de produção. Neste
aspecto, o Estado é um “capitalista coletivo ideal” (Engels), ou seja,
representante dos interesses gerais do capital.
Sua forma de materialização é o regime político.
CAP. 2: NOS
PAÍSES CAPITALISTAS SUBDESENVOLVIDOS
Capitalismo de Estado – o Estado (supondo-se que sua
natureza seja capitalista) não seria apenas o garante das relações de produção,
mas igualmente e SOBRETUDO o produtor direto dessas relações.
Os autores passam a investigar a definição da
natureza de classe do Estado nos países subdesenvolvidos.
No item 1 – demonstram que a derivação não pode ser
das categorias: M – V – D – C.
No item 2 – demonstram que a dedução não pode se
basear em argumentos do tipo tecnológico e financeiro.
No item 3 – demonstram que a natureza de classe
capitalista do Estado se deduz da economia mundial constituída e esta análise
permite eliminar equívocos do tipo de ver o Estado (países subdesenvolvidos)
como instrumento a serviço das potências centrais.
1.
OS ENSINAMENTOS
DA ESCOLA DA DERIVAÇÃO NÃO SÃO PERTINENTES NO CASO DO SUBDESENVOLVIMENTO
# Razões fundamentais que não permite se recorrer a
sucessão das categorias:
a)
A generalização das mercadorias não é efetiva: para os autores o aparecimento e florescimento do
modo de produção capitalista não foram produzidos internamente, mas trazidos de
fora e foi precisamente isso que criou o subdesenvolvimento.
A inexistência de
uma classe (capitalistas ou operários) implica na impossibilidade da
derivação da existência do Estado a partir das categorias, mas não impede
a existência de um Estado capitalista.
Neste caso, a
natureza de classe do Estado é conferida por outros fatores que não a
existência de uma formação social apropriada.
b)
A questão nacional: a constituição da nação é condição essencial para
legitimação da atuação do Estado.
·
A nação
é a sociedade que compartilha um destino comum e logra ou tem condições de
dotar-se de um estado tendo como principais objetivos a segurança ou autonomia
nacional e o desenvolvimento econômico (Bresser-Pereira: Nação, Estado e
Estado-Nação).
2 – DEDUÇÕES LÓGICAS DA AÇÃO DO ESTADO E CONCEPÇÕES INSTRUMENTAIS DO
ESTADO
#Vários trabalhos se limitam a deduzir logicamente a
ação do Estado ou a partir de dificuldades ligadas ao processo de acumulação,
ou de causas estruturais cujas origens seriam tecnológico-financeiras.
a) ESTUDOS REDUCIONISTAS DO ESTADO COMO CONSEQUÊNCIA DAS
ANÁLISES DA CEPAL
A análise da CEPAL:
# As crises econômicas e as guerras (países centrais)
propiciaram um momento de expansão do mercado interno (periferia) através do
caminho da substituição de importações.
# O restabelecimento do vínculo bloqueia a expansão.
# Somente com a intervenção do Estado pode-se superar
este cenário (reforma agrária, eliminar gargalos estruturais) = aumentar o
mercado interno.
As duas primeiras setas indicam que as relações entre as nações (centro
x periferia) são prejudiciais a periferia e impedem seu desenvolvimento.
A terceira seta indica o caminho para superação dos problemas: a
intervenção do Estado.
Crítica dos autores: não se pode conceber o Estado como um instrumento
susceptível de superar as contradições.
A partir da análise cepalina surge uma corrente radical (marxista) sobre
o papel do Estado:
=As nações ricas exploram as nações pobres.
=O enriquecimento de umas provoca o empobrecimento de
outras.
= A burguesia local é submetida a central.
=O Estado é lacaio do centro capitalista.
Crítica
dos autores: a análise é excludente (uma ou outra) e exogenista. Não se nega a
intervenção externa, mas o fato de não se perceber a natureza de classe do
Estado.
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