terça-feira, 17 de julho de 2012

ATRASOS E DESPERDÍCIOS NA GESTÃO DO LIXO NO BRASIL

Joacir Rufino de Aquino & Raimundo Inácio da Silva Filho
(Economistas e professores da UERN/Assú)


O processo de industrialização que começou na Europa em fins do século XVIII e chegou ao Brasil em meados do século passado ampliou substancialmente a capacidade do homem de transformar a natureza. Por um lado, o desenvolvimento tecnológico facilitou a produção em massa e a um menor custo de mais e mais produtos. Por outro, o avanço da urbanização despertou uma lógica consumista capaz de incentivar a fabricação de mercadorias que têm uma vida útil extremamente curta. Como resultado, verifica-se o aumento da quantidade de resíduos gerados que se acumulam aceleradamente nos aterros sanitários e, em grandes volumes, nos lixões do nosso país e do mundo afora.
Nesse contexto, há décadas que os governos nacionais e subnacionais de diferentes continentes têm buscado alternativas para tentar amenizar as consequências socioambientais negativas decorrentes da disposição inadequada do lixo. Na retaguarda desse movimento, excluindo algumas experiências isoladas, o Estado brasileiro só começou a despertar para tal problemática no fim do século passado. Por mais de 20 anos o projeto sobre resíduos sólidos permaneceu “engavetado” no Congresso Nacional. Em vista disso, apenas em agosto de 2010 é que o governo federal sancionou a Lei 12.305 através da qual foi instituída a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), que dispõe sobre os princípios, objetivos e instrumentos, assim como sobre as diretrizes relativas à gestão integrada de resíduos sólidos, às responsabilidades dos agentes geradores e do poder público em suas várias instâncias.
Todavia, transcorridos quase dois anos da promulgação da nova legislação, é preocupante constar que ainda continuamos bastante atrasados nessa matéria. Alguns especialistas alertam que a maior parte dos municípios brasileiros enfrenta dificuldades para se adequar aos parâmetros estabelecidos pelo governo por causa de problemas orçamentários, e, sobretudo, pelo predomínio da cultura política que insiste em encarar os resíduos reaproveitáveis como algo sem valor a ser simplesmente jogado fora em qualquer lugar.
Em outras palavras, não adianta argumentar que o problema se resume apenas à falta de recursos para elaborar e implementar os planos municipais de gestão de resíduos sólidos. O fato concreto é que a esmagadora maioria dos gestores públicos do nosso país, infelizmente, ainda não despertou para o potencial socioeconômico do reaproveitamento e da reciclagem do lixo produzido pelas engrenagens do modo de produção capitalista. Na verdade, a lógica do desperdício parece reinar de forma soberana em todos os sentidos.
Assim sendo, mesmo que os lixões sejam erradicados até 2014 e substituídos por aterros sanitários, conforme determina a PNRS, bilhões de reais vão continuar sendo enterrados por não haver reciclagem de materiais na dimensão exigida. E o pior: na direção que estamos caminhando, se não forem tomados os devidos cuidados, até a inovadora Lei 12.305 está correndo o sério risco de também ir parar na lata do lixo, junto com os milhares de empregos decentes que poderiam ser criados mediante a adoção de uma visão empreendedora pautada no reaproveitamento dos resíduos sólidos gerados no campo e na cidade.
Portanto, como é ilusório pensar que as mudanças possam ser feitas por decreto, resta-nos torcer para que os atuais e futuros gestores municipais “comprem” a ideia e adotem a PNRS como um instrumento valioso capaz de contribuir para fortalecer as dimensões ambiental, social e econômica do desenvolvimento local. Entretanto, para que as esperanças não sejam frustradas antes do tempo, é indispensável a conscientização e a pressão da sociedade civil organizada. Isso porque sem mobilização popular dificilmente seremos capazes de superar o atraso histórico no que se refere à gestão do lixo e as demais questões ambientais no Brasil. Promover essa mobilização a partir das nossas escolas talvez seja o maior desafio que teremos que enfrentar para não desperdiçar mais essa oportunidade.





Artigo publicado no Jornal O Mossoroense, Mossoró/RN, 04/07/2012, p. 5.

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