BELLUZZO,
Luiz Gonzaga. A Mundialização do Capital e a Expansão do Poder Americano. In: O Poder Americano. Editora: Vozes.
Petrópolis. p. 111-138.
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Maria
Conceição Tavares e Luiz Gonzaga Belluzzo
A Mundialização do
Capital e a Expansão do Poder Americano
Formação e Expansão do
Sistema Capitalista.
O circuito do capital mercantil articulou a
primeira "economia mundo" européia em simultâneo com a formação dos
Estados Nacionais Modernos no chamado 'longo século XVI'. Estes dois movimentos
(o do capital e o dos Estados) essenciais à formação do sistema capitalista não
se confundem entre si. A Europa foi progressivamente integrada pelos circuitos
do capital mercantil, cujo movimento era periodicamente bloqueado pelas guerras
intraeuropéias. Os banqueiros tiveram um duplo papel, o de agentes da expansão
capitalista e o de financiadores das guerras e da expansão ultramarina dos
Impérios. Vários bancos quebraram com as derrotas dos príncipes ou com os
excessos de gastos do poder imperial em territórios de onde não se podiam
extrair impostos e excedentes mercantis suficientes para o pagamento das
dívidas. A localização e o deslocamento das principais praças financeiras tem
muito a ver não só com as rotas do capital mercantil, mas com os caminhos dos Impérios.
Portugal e Espanha tinham burguesias
nacionais fracas e tiveram de se apoiar nos banqueiros do Mediterrâneo para as
suas expansões ultramarinas. A Holanda forjou o seu Estado Nacional na
defensiva contra o Império Espanhol, mas possuía uma burguesia forte e
altamente internacionalizada desde que o centro financeiro europeu se deslocara
para Amsterdã (a expansão européia do império de Carlos V custara a
sobrevivência dos banqueiros árabes, italianos e alemães). Podemos dizer que a
expansão mundial do capital teve, na Companhia das Índias Holandesas, a sua
primeira grande empresa multinacional. No entanto a Holanda, não tendo por trás
um projeto de Estado Nacional forte, não conseguiu assegurar um projeto
imperial de dominação política de longa duração nem nas Américas nem na África.
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As únicas potências capitalistas que foram
capazes de manter a hegemonia política de seus Estados Nacionais e expandir o
seu capital sem limites territoriais a todos os continentes foram as anglo-saxônicas:
a Inglaterra no século XIX e os EUA na segunda metade do século XX, depois da
vitória na segunda guerra mundial. A união do poder político-militar e do
capital financeiro deu-lhes um fôlego e uma dimensão global antes inexistentes.
Tiveram como instrumento principal a emissão de uma moeda internacional
dominante que exprimia o seu poder político e a força de seu capital
financeiro. Tanto a sua dívida pública interna quanto o movimento de
mercadorias e de capitais no mercado internacional estavam denominadas na sua
moeda nacional.
O deslocamento dos centros do capitalismo
produz as modificações na divisão internacional do trabalho e nas relações
centro-periferia, isto é, na geoeconomia. Estas mudanças podem ser retardadas
ou facilitadas pela geopolítica dos centros imperiais. As guerras foram
determinantes periódicas no bloqueio do comércio internacional e afetaram
profundamente o desenvolvimento das forças produtivas de muitas nações, tanto
das grandes potências no último quartel do século XIX, quanto de algumas nações
periféricas no século XX.
A expansão do capital tem sua expressão mais
geral na apropriação privada da riqueza e na vocação compulsiva para a
acumulação sem limites, que se expressa, na sua forma mais geral — o Dinheiro.
Este é o Deus do Mercado, mas também o instrumento dos Príncipes. A expansão do
capital não se processa em forma de "crescimento sustentado". Tem
ciclos de acumulação, de incorporação de progresso técnico, de valorização e
desvalorização do capital financeiro, e de deslocamento espacial. A conquista
de novos mercados, a incorporação de novos consumidores e a expansão da força
de trabalho a taxas de exploração variável, são forças imanentes da
concorrência capitalista. Suas contradições são expressas concretamente em termos
de deslocamentos econômicos sociais e políticos, que geram crises periódicas no
sistema [1 Nota de Rodapé].
Já a expansão do poder dos Estados Nacionais
com vocação de potência imperial é limitada pelo poder internacional de seu
"dinheiro público" e pela rivalidade imperialista. Nenhuma potência
capitalista teve expansão territorial ilimitada nem mesmo sua hegemonia
alcançou a duração dos impérios antigos. Os limites à expansão imperial são
sempre "externos", já que nenhuma foi derrubada ou barrada sem que
outra a detivesse pelo poder das armas e do dinheiro. A ligação entre a
expansão geográfica do capitalismo e a expansão dos impérios — decisiva para a
história do sistema — não é dedutível do movimento imanente do capital, nem de
uma teoria geopolí-
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tica
abstrata. A concorrência dos capitais e a rivalidade entre potências dão a este
sistema um dinamismo fantástico, incompatível com a noção de "estado
estacionário", "equilíbrio de mercado" ou "equilíbrio de
poder".
Tampouco existe um padrão monetário estável,
como pretendem postular as teorias monetárias desde os economistas clássicos
ingleses que sempre andaram em busca de uma "constante", na qual se
pudesse medir o valor da riqueza universal. Tornar a moeda independente do
poder político dos Estados é uma obsessão recorrente dos economistas, como o
demonstra a proposta do Plano Keynes nas reuniões preparatórias de Bretton
Woods e a atual doutrina neoliberal dos Bancos Centrais Independentes. O padrão
dólar-ouro já terminou há mais de trinta anos, passando ao "padrão
dólar-flexível", que acelerou a globalização financeira e levou ao
paroxismo a politização do valor da moeda americana.
Para alguns economistas e sociólogos de
esquerda e de direita a ruptura do chamado "sistema de Bretton Woods"
e as periódicas desvalorizações do dólar estão associadas à decadência da
hegemonia americana ou à crise definitiva da "ordem capitalista".
Para outros, agora que os Impérios milenares — a Índia e a China — estão sendo
incorporados à economia capitalista mundial como Estados Nacionais
independentes e o Império Soviético ruiu, tratar-se-ia de uma vitória
definitiva do capitalismo liberal e o caminho para uma "ordem
unipolar".
O fato é que mais uma vez estamos num momento
de descompasso entre a geoeconomia e a geopolítica, tanto na Europa quanto na
Ásia, sem esquecer as periferias sul-americanas e africanas. Não estão à vista
nem a "decadência do Império americano", nem o surgimento de um novo hegemon, nem o "fim da
história".
Emergência do Poder
Americano na Ordem Liberal Burguesa.
A 1º Revolução Industrial acrescentou o traço
"liberal" ao caráter intrinsecamente "internacional" e
"mercantil" do capitalismo inglês. Por outro lado, ao mesmo tempo em
que a Pax Brittanica constituiu a
nova periferia e destruiu os sistemas produtivos dos impérios milenares, também
impulsionou as industrializações retardatárias no continente europeu e na Nova
Inglaterra. Os nexos produtivos, comerciais e financeiros, propostos pela
Inglaterra ensejaram de fato a adoção de estratégias industriais às regiões em
que a divisão do trabalho, as relações de mercado (sobretudo na mobilização da
força de trabalho) e a formação do Estado Nacional haviam atingido um maior
desenvolvimento relativo.
Nas três últimas décadas do século XIX a
economia mundial viveu o tempo da Grande Depressão e das profundas
transformações da 2º Revolução Industrial. Entre 1873 e 1896 o aço, a
eletricidade, o motor a combustão interna, a química da soda e do cloro, o
telégrafo e o navio frigorífico alteraram radicalmente o panorama da indústria,
dos transportes e das co-
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municações,
até então marcado pelo carvão, pelo ferro e pela máquina a vapor. A aplicação
simples da mecânica cedeu lugar à utilização e integração sistemáticas da
ciência nos processos produtivos.
Esta segunda revolução industrial veio
acompanhada de um processo extraordinário de ampliação das escalas de produção.
O crescimento do volume de capital requerido pelos novos investimentos impôs
novas formas de organização à empresa capitalista. A sociedade anônima por
ações tornou-se a forma dominante de estruturação da propriedade.
O final do século XIX foi marcado pelo
desdobramento de cinco processos inter-relacionados: 1) a consolidação do
sistema monetário e de pagamentos internacional, mediante a adoção generalizada
do padrão-ouro; 2) a metamorfose do sistema de crédito que ajusta suas funções
e formas de operação à nova economia capitalista global; 3) a constituição de
forças produtivas especificamente capitalistas, consubstanciada na crescente
separação técnica e econômica entre o departamento de meios de consumo e o
departamento de meios de produção; 4) o desenvolvimento da divisão
internacional do trabalho entre um centro produtor de manufaturas e uma periferia
produtora de matérias primas e alimentos; 5) a emergência das "novas"
potências industriais, construídas à sombra das relações comerciais e
financeiras proporcionadas pela hegemonia liberal britânica.
Os EUA, a Alemanha e o Japão ingressaram no
cenário mundial, fazendo valer a modernidade de suas respectivas estruturas
capitalistas, especialmente a agilidade de seus bancos e a presença ativa de
seus respectivos Estados nacionais. A emergência de novas potências inaugurou
um período de grande rivalidade internacional. A disputa pela preeminência
econômica intensificou a penetração de capitais nas áreas provedoras de
matérias primas e alimentos, alterando a configuração da chamada periferia do
mundo capitalista.
Nos capitalismos retardatários do século XIX,
o sistema bancário, que concentrava suas operações no financiamento da dívida
pública e no giro dos negócios, passa a avançar recursos para novos
empreendimentos e a promover a fusão entre as empresas já existentes. Pouco a
pouco todos os setores industriais foram dominados por grandes empresas, sob o
comando do capital financeiro. O movimento de concentração do capital produtivo
e de centralização do comando capitalista tornou obsoleta a figura do
empresário frugal que confundia o destino da empresa com sua própria biografia.
O magnata da finança é o herói e o vilão do mundo que nasce.
A economia americana construiu sua trajetória
de expansão no século XIX sobre quatro vertentes: a inserção
"virtuosa" na divisão internacional do trabalho proposta pela
hegemonia britânica, a finança doméstica "desregulada", o
protecionismo comercial e os privilégios concedidos por seu Estado Nacional aos
promotores de negócios. Na verdade, o peculiar caráter "liberal" do
Estado americano, desde a sua constituição, está relacionado com seu papel
decisivo na garantia das normas da concorrência darwinista.
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A porosidade do poder político aos interesses
privados deu origem a um Estado plutocrático, na medida em que não só os grupos
econômicos mais poderosos se desenvolveram à sua sombra e sob seu patrocínio,
mas também se valeram da permissividade das instituições liberais. Charles
Morris escreve em Money, Greed and Rish [2
Nota de Rodapé] que até o final do século XIX, os EUA não dispunham de uma legislação
comercial adequada. Os ingleses do Barings queixavam-se freqüentemente dos
riscos que corriam, caso seus correspondentes americanos entrassem em default. "Não era claro", diz
Morris, "se poderiam exercer seus direitos contra os inadimplentes".
O escritor Kevin Phillips, em Wealth and Democracy
[3 Nota de Rodapé], sugere que, desde a Guerra Civil, esta precariedade
institucional sustentou o avanço das sucessivas gerações de "barões
ladrões" que transformaram a economia e comandaram a política americana.
Os EUA, uma economia em rápida ascensão,
terminou o século XIX como a maior economia industrial do planeta, tornando-se
poderoso competidor nos mercados mundiais de alimentos, matérias primas e
manufaturados. Ainda assim, a economia americana protagonizou freqüentes e severas
crises financeiras e cambiais, dada a posição subordinada do dólar, a
organização "desregulada" de seu sistema bancário e às intervenções
arriscadas e especulativas dos bancos de investimento na promoção dos negócios.
Colapsos de preços dos títulos e corridas bancárias sucederam-se na posteridade
da Guerra Civil.
Nas últimas décadas do século XIX e no início
do século XX, as práticas financeiras especulativas e os sucessivos episódios
de deflação de preços sempre acompanhados de liquidação dos devedores e de
destruição da riqueza do "público" — suscitaram surtos violentos de
centralização do capital e permitiram a consolidação do assim chamado
capitalismo trustificado. Essa forma "moderna" assumida pelo
capitalismo foi desenvolvida a partir das modificações ocorridas na economia
americana, depois da Guerra de Secessão. Os resultados das transformações
observadas bem merecem a qualificação de "capitalismo moderno",
sobretudo no sentido de que o surgimento e desenvolvimento da grande corporação
americana se constituem no embrião nacional do posterior desdobramento
transnacional do grande capital.
Hobson em seu livro Modern Capitalism [4 Nota de rodapé] mostra como as mudanças
radicais operadas na organização industrial e no avanço tecnológico da grande
empresa vão acompanhar o aparecimento de uma "classe financeira", o que
tende a concentrar nas mãos dos que operam a máquina monetária das sociedades
industriais desenvolvidas, isto é, dos grandes Bancos, um poder
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crescente
no manejo estratégico das relações intersticiais (intersetoriais e
internacionais) do sistema. Por maior que seja a extensão do espaço nacional
monopolizado e protegido pelo Estado nacional, como era o caso dos EUA, a
expansão contínua dos lucros excedentes obriga a busca de mercados externos,
tanto para as mercadorias quanto para os investimentos diretos e exportação
"financeira" de capital.
Em outras palavras, a internacionalização do
capital se dá a partir da estrutura da grande empresa, aqui já referida, e
condensa todos os mecanismos interiores de expansão: mercantis, industriais e
financeiros. Condensam também as práticas dos Estados imperiais anteriores,
desde o impulso expansionista, até a face protecionista interna e francamente
intervencionista na defesa das reservas estratégicas de matérias primas.
Os chamados movimentos "populistas"
foram tentativas — efêmeras e recorrentes
- de interromper o processo de fusão entre os grandes negócios e o
Estado. A Era Progressiva do começo do século XX foi um momento de rebelião
"democrática" dos pequenos proprietários, dos novos profissionais
liberais e das massas trabalhadoras contra o poder dos bancos e das grandes
corporações. "Os progressistas", escreve Sean Cashman, em America Ascendant [5 Nota de Rodapé],
queriam limitar o poder do big business
tornar o sistema político mais representativo e ampliar o papel do governo na
proteção do interesse público e na melhoria das péssimas condições sociais e de
pobreza. Estas consignas foram retomadas e aprofundadas com o New Deal que, pela primeira vez,
representou uma fratura entre a "classe financeira" de Wall Street e as novas grandes empresas
industriais fortemente atingidas pela depressão dos anos 30.
A Passagem da
Hegemonia Inglesa para a Hegemonia Americana.
O equilíbrio entre as potências e o
padrão-ouro clássico foram, como já mencionamos, as marcas registradas do
apogeu da Ordem Liberal Burguesa, um conjunto de práticas e instituições
encarregadas da coordenação de um arranjo internacional que abrigava forças
contraditórias: a hegemonia financeira inglesa, exercida através do seu
poderoso sistema bancário internacionalizado; a exacerbação da
"concorrência" entre a Inglaterra e as "novas" economias
industriais dos trusts e da grande
corporação, nascidos na Alemanha e nos EUA; a exclusão das massas trabalhadoras
do processo político (inexistência do sufrágio universal) e a constituição de
uma periferia "funcional", fonte produtora de alimentos, matérias
primas e, sobretudo, fronteira de expansão dos sistemas de crédito dos países
centrais.
As transformações ocorridas no sistema
capitalista ao longo do século XX não podem ser compreendidas sem se levar em
conta três fatores: os
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efeitos
das guerras mundiais, as mudanças no padrão monetário internacional e as
alterações da divisão internacional do trabalho. Todos eles afetaram
poderosamente as mudanças na sociabilidade burguesa com a ruptura da ordem
liberal, o surgimento de reações nacionalistas autoritárias (nacional
socialismo nazista e o socialismo "nacional" soviético) ou
experiências intervencionistas e social-democratas que acompanharam a
constituição de sociedades de massas na Europa e nos EUA.
Às vésperas da I Guerra Mundial explicita-se
a fragilidade da Inglaterra como centro principal capaz de coordenar as
finanças internacionais, dada a presença perturbadora de Wall Street e a
ascensão dos centros financeiros concorrentes no continente europeu. Por outro
lado, a crescente tensão política na Europa continental desgasta a diplomacia
inglesa de equilíbrio entre as potências.
A I Guerra Mundial foi, de fato, uma guerra
interimpelialista assimétrica; de um lado os aliados Inglaterra, França e
Rússia, potências industrialmente fracas frente à Alemanha (e aos EUA) que
tinham se afirmado na segunda revolução industrial. O elo mais fraco, tanto do
ponto de vista econômico financeiro como do ponto de vista militar, a Rússia,
capitula em 1917 assinando a paz de Brest-Litovsky e entrando num processo de
desintegração imperial e revolucionário. Neste mesmo ano, os EUA — que a
despeito da neutralidade tinham concedido ajuda financeira aos aliados — entram
no conflito e determinam a derrota definitiva da Alemanha.
Na Conferência de Paris os vencedores impõem
ao Estado Imperial alemão o desarmamento e o peso das reparações de guerra.
Modificam o mapa da Europa criando dezenas de países na Europa Central.
Segue-se um período de turbulência financeira e política que isola a União
Soviética e leva a república de Weimar ao colapso. Ao mesmo tempo, diante da
atitude isolacionista americana, a Inglaterra tenta reassumir a hegemonia
ressuscitando o padrão-ouro e mantendo suas pretensões a comandar a ordem
liberal-burguesa já em ruínas.
Enquanto a década de 20 foi um período de
expansão - embora desequilibrado — para o capitalismo americano, consolidando
uma sociedade de consumo de massas (roaring
twenties), na Europa, as hiperinflações e os programas de estabilização na
Alemanha e na Europa Central, as políticas de stop and go na Inglaterra e a crise econômica no norte da Europa,
geraram desemprego e tensões sociais, intensificação das lutas sindicais e
populares, bem como o fortalecimento dos partidos social-democratas na Europa
continental, dos trabalhistas na Inglaterra, e nos seus domínios
"brancos" Canadá e Austrália.
O período de entre-guerras liquidou de vez a
hegemonia inglesa consubstanciada no "imperialismo do livre comércio"
e no padrão libra-ouro. O velho Império britânico manteve as suas colônias e
domínios e estendeu os seus "protetorados" para a Palestina e Oriente
Médio. As dívidas de guerra e a inexistência de uma nova divisão internacional
do trabalho que
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lhes
fosse favorável converteram rapidamente o padrão-ouro num anacronismo não
operacional. Os EUA assumem a posição dominante em termos econômicos e
financeiros e saem do conflito com mais da metade das reservas em ouro
mundiais. Nesta condição, os americanos se negam a renegociar a dívida dos
aliados, transferindo para os banqueiros de Wall Street as negociações. A
Inglaterra é devedora líquida dos EUA, mas ficou credora dos devedores de moeda
fraca, sobretudo Rússia, Países do Leste Europeu e Itália, mas também da
França, com o que se transformou no vértice do triângulo entre o credor em
última instância (os EUA) e o resto dos países devedores. Isto aumentou a
pressão sobre as reparações de guerra alemãs, o que levou esse país ao colapso
financeiro, à hiperinflação e às negociações em
1924
com a Comissão Dawes sob o comando do Banco Morgan.
O contubérnio entre os negócios e o Estado
chegou ao ápice nos anos 20. O Banco Morgan transformou-se no braço financeiro
da política de Washington. Os funcionários do Morgan comandaram os empréstimos
destinados a garantir reservas em moeda forte para o plano de estabilização da
Alemanha em 1924 e para a França em 1926. Feito o empréstimo de estabilização,
a Alemanha regressou ao padrão-ouro, o que forçou a Inglaterra a regressar em
1925, com a libra apreciada em relação ao dólar, fixada na paridade anterior à
guerra. Neste momento é deflagrado um forte movimento de capitais dos EUA em
direção à Europa estabilizada e à periferia endividada do sistema inglês. A
partir daí, o Banco Morgan tornou-se o carro chefe da enxurrada de empréstimos
baratos para a Europa e América Latina.
A ordem liberal começa a ruir de alto a
baixo, tanto do ponto de vista econômico-financeiro quanto do ponto de vista
social e político. A crise de 1930 agrava a desorganização do sistema mundial e
leva ao surgimento de experiências nacionalistas e estatizantes de vários
matizes. No extremo liberal democrático, os EUA tentam a experiência do New Deal enquanto a Inglaterra sai do
padrão-ouro e faz uma política de juros baixos e gasto público compensatório.
No continente europeu, a gravidade do desemprego, a deflação e a contração do
comércio internacional decorrente das desvalorizações competitivas levam a um
alto grau de intervenção do Estado. A arregimentação de massas sem precedentes
leva ao surgimento de nacionalismos autoritários que reforçam o expansionismo
bélico das chamadas potências do Eixo e levaram à eclosão da II Guerra Mundial.
A guerra de 1914/19 promoveu mudanças
radicais na geopolítica da Europa, cujos efeitos se fazem sentir até hoje e
marcou também a entrada em cena de um novo poder mundial: os EUA. Estes
compareceram às negociações da Paz de Versailles como poder arbitral, mas
retiraram-se unilateralmente. O projeto wilsoniano da Liga das Nações foi
rejeitado pelo Congresso norte-americano. O poder econômico-financeiro dos
grandes trusts
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americanos
regressou à tradição do business as usual.
Os EUA abriram mão (ou não puderam) de estabelecer uma nova "ordem
mundial".
As Guerras Mundiais e
o Poder Americano.
No final do século XIX os EUA já eram a
economia industrial mais poderosa do planeta, alem de ostentar — graças à
excepcional dotação de recursos naturais — a posição de grande exportadora de
matérias primas e alimentos, e de contar com Nova York, um centro financeiro e
de negócios, capaz de promover simultaneamente o investimento de alto risco em
novos setores e a rápida centralização de capitais [6 Nota de Rodapé].
Em 1913, a capacidade industrial americana
havia ultrapassado com folga a de seus principais competidores europeus,
Alemanha e Inglaterra. Mas, a constituição da hegemonia americana não pode ser
compreendida sem a avaliação dos efeitos das duas grandes guerras — a de
1914-1918 e a de 1939-1945.
Os historiadores reconhecem que a guerra de
14-18 foi inovadora nos aspectos tecnológico, econômico, social e político, se
comparada com os conflitos anteriores. A conflagração não foi apenas mundial,
por conta do número de países envolvidos, mas também, total: pela primeira vez
o chamado "esforço de guerra" comprometeu a quase totalidade dos
recursos materiais e humanos das sociedades envolvidas, ou seja, exigiu a
mobilização do conjunto das forças produtivas. Tal mobilização impôs o abandono
drástico dos cânones da economia liberal, o que significou, então, a
substituição dos mecanismos de mercado pela centralização das decisões nos
órgãos estatais de coordenação; o abandono, de fato ou de jure, das regras de conversibilidade do padrão-ouro; e a adoção
de esquemas de financiamento do gasto governamental, apoiados na elevação da
carga tributária e, sobretudo, na colocação de dívida junto ao público e ao
sistema bancário.
Na primeira Grande Guerra, o potencial
tecnológico e econômico desenvolvido a partir da 2a Revolução Industrial foi
colocado a serviço dos combatentes nos campos de batalha. Esta circunstância
representou um salto no poder destrutivo dos armamentos e uma ampliação das
vantagens competitivas da indústria norte-americanas que, desde o final do
século dezenove vinha liderando, juntamente com a Alemanha, as inovações nos
setores químicos, metalúrgico, metal-mecânico e transportes. Estes setores
foram "convertidos" para a produção canhões de longo alcance, fuzis,
metralhadoras, carros de combate, navios, submarinos, aviões, para não falar de
munições de alto teor letal, além de armas químicas.
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Na I Guerra, sob o comando do Council of
National Defense, organismos como o War Industrial Board, o United States
Shipping Board e o Director General of Railroads estabeleceram o controle
generalizado de preços, o planejamento da rede de transportes, o racionamento
de alimentos e de carvão para aquecimento, a programação de compras do governo
e a sustentação de um nível elevado de dispêndio público. Estas formas de
controle e coordenação foram compatíveis com a subida expressiva dos lucros do
setor privado e com a elevação dos salários reais, a despeito da duplicação do
nível geral de preços entre 1913 e 1918. Tal como ocorreria também depois da II
Guerra, a acumulação de poder de compra "represado" por parte das
famílias consumidoras teve impacto significativo no desempenho da economia
americana no imediato pós-guerra.
Provedores de material bélico, os Estados
Unidos saíram da 1a guerra na condição de país credor, o que afetou
profundamente, como já foi dito, as negociações de Versailles e o
encaminhamento das tentativas frustradas de "normalização" econômica
ao longo da década dos 20.
Na Europa, as dívidas de guerra e as
reparações exigiram um esforço adicional de obtenção de recursos fiscais que as
populações — principalmente as classes abastadas — não estavam dispostas a
conceder aos governos. Os níveis de preços foram multiplicados por quatro ou
cinco e os países submetidos ao ônus de reparações e sobrecarregados com a
reconstrução do aparato produtivo, sofreram o flagelo da hiperinflação. A
generalização do sufrágio universal e a percepção da natureza
"imperialista" da guerra — atribuída à insensatez das elites
econômicas e políticas — concederam um peso maior à opinião das classes
subalternas.
Neste quadro, na primeira metade dos anos 20,
tornou-se impossível restaurar o regime monetário que prevaleceu no período
anterior à guerra. Os primeiros anos da paz permitiram que se observasse e
avaliasse o funcionamento de um sistema de "flutuação livre" das
taxas de câmbio. A experiência foi negativa e só aumentou a ansiedade pela
restauração de um padrão monetário estável.
Em sua ressurreição, no entanto, o
padrão-ouro foi incapaz de reanimar as convenções e de reproduzir os processos
de ajustamento e as formas de coordenação responsáveis pelo sucesso anterior. O
último país a declarar oficialmente sua adesão ao padrão-ouro foi a França em
1928. Antes dela, entre 1923 e 1925, retornaram a Alemanha e seus parceiros na
hiperinflação, Áustria, Hungria e Polônia. A Inglaterra retornou em 1925. O
estabelecimento da paridade da libra com o ouro no mesmo nível que prevalecia
antes da guerra foi a causa de muitos dos problemas de coordenação que se
apresentaram durante os conturbados anos 20 e 30.
O regime do Gold Exchange Standard permitia —
diante da escassez de ouro — a acumulação de reservas em moeda
"forte" (basicamente o dólar e a libra). A decisão da Inglaterra,
tornada em 1925, de voltar à paridade do período anterior à guerra, era
claramente incompatível com o novo nível de
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preços
internos e tampouco reconhecia o declínio de seu poderio econômico e
financeiro.
A "sobrevalorização" da libra e a
"sub-valorização" de outras moedas, principalmente do franco, causou,
ao longo do tempo, o aprofundamento dos desequilíbrios do balanço de pagamentos
e pressões continuadas sobre a moeda inglesa. As perspectivas dos mercados
quanto à sustentação da paridade eram pessimistas e os ajustamentos entre
países superavitários e deficitários não ocorriam. Muito ao contrário, os
déficits e os superávits tendiam a se tornar crônicos, em boa medida porque os
países superavitários tratavam de trocar seus haveres em "moeda
forte" por ouro. Os Estados Unidos, a França e a Alemanha acabaram por
concentrar uma fração substancial das reservas em ouro, contribuindo para
confirmar as expectativas negativas quanto ao futuro da libra.
Os problemas de ajustamento tornaram-se mais
graves porque os capitais privados, principalmente de origem norte-americana,
entre 1925 e 1928, estimulados pelos diferenciais de juros (e ativos baratos)
nos países de moeda recém-estabilizada, em particular na Alemanha, formaram
bolhas especulativas, ávidos em colher as oportunidades de ganhos de capital. O
ciclo de "inflação de ativos" estrangeiros foi concomitante à rápida
valorização das ações da bolsa de valores americana. Esta onda de especulação
altista, como não poderia deixar de ser, foi alimentada pela expansão do
crédito nos EUA, onde as taxas de desconto ainda foram reduzidas em 1927 para
aliviar as pressões exercidas contra a libra.
O desastre que se seguiu foi conseqüência da
mudança de sinal da política monetária americana, em meados de 1928. O Federal
Reserve, preocupado com o aquecimento da economia e com a febre dos mercados
financeiros subiu a taxa de desconto, provocando o "estouro" da bolha
especulativa em outubro de 1929. Os "grilhões dourados" do regime
monetário tiveram grande responsabilidade na imobilização das políticas
econômicas, determinando uma quase completa incapacidade de resposta e de coordenação
dos governos da Europa e, pelos menos até 1933, dos EUA.
Entre 1929 e o início da II Guerra, as
economias capitalistas mergulharam na violenta queda de preços das mercadorias,
na deflação de ativos, nas sucessivas e intermináveis crises bancárias, nas
desvalorizações competitivas das moedas, na ruptura do comércio internacional,
do sistema de pagamentos e, finalmente, no colapso do Gold Exchange Standard.
Nos EUA as taxas de desemprego atingiram cifras superiores a 20% da população
economicamente ativa e os níveis de utilização da capacidade caíram
dramaticamente, chegando, em alguns casos, a 30% do potencial instalado.
Não obstante as idas e vindas da política de
Roosevelt, a idéia de intervenção planejada do Estado esteve presente nas
várias etapas do New Deal. Na área industrial, os primeiros anos assistiram às
tentativas de "restrição da concorrência", com a fixação de salários
e preços. O objetivo era impe-
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dir
que a concorrência predatória levasse à guerra destrutiva de preços e à queda
dos salários nominais. No âmbito monetário e fiscal o Estado envolveu-se nas
operações de salvamento dos bancos e na estrita regulação do sistema de crédito
com a edição do Glass-Steagall Act. A isto se juntaram, ainda tímidos, os
programas de gasto público destinados a estimular a recuperação do emprego.
Apesar de tudo isso, a economia americana
continuava em marcha lenta e sofreu uma nova recessão em 1937: Roosevelt,
atacado pela direita, resolveu "equilibrar o orçamento". Os sinais de
recuperação firme só apareceram depois que a Inglaterra declarou guerra à
Alemanha em maio de 1940 e começou a ordenar a compra de material bélico. Em
1941, ainda antes da Pearl Harbour a produção industrial estava 40% acima do
nível observado em 1929, antes da depressão.
Os EUA entraram na guerra com reservas
consideráveis de recursos não-empregados — tanto de capacidade industrial
instalada quanto de mão-de-obra. Mas a forte recuperação promovida pela demanda
militar iria exigir, muito rapidamente, a "conversão" da indústria
civil. O papel da mobilização bélica no crescimento rápido da economia é
inequívoco: Em 1940 — apesar da expansão observada durante o New Deal — o gasto
público federal representava apenas 8,2% do PIB. Em 1944, os gastos do governo
federal chegaram a 52,3% do produto interno bruto.
A participação americana nas duas guerras
foi, sem dúvida, peculiar e decisiva. Não só entraram tardiamente nos dois
conflitos—em 1917 e 1941 — como, protegidos pelos oceanos Atlântico e Pacífico,
os EUA não sofreram danos em seu território continental. Assim, a utilização de
seu enorme potencial econômico foi realizada em condições ideais: o
"esforço de guerra" legitimou a centralização das decisões nos órgãos
estatais de coordenação, ao mesmo tempo em que a "segurança" do
território garantiu a incolumidade do aparato produtivo e das redes de
transportes e comunicações. Isto, sem dúvida, estimulou o avanço tecnológico
(sobretudo nos ramos eletroeletrônico, químico e metal-mecânico) e a ampliação
da capacidade em muitos setores. Os setores de transportes e telecomunicações
ligados à guerra sofreram verdadeiras revoluções estruturais [7 Nota de Rodapé].
Terminada a guerra, muitos temeram os efeitos
depressivos da desmobilização e da redução do gasto público. Mas a economia
americana contou, mais uma vez, com o poder de compra acumulado pelas famílias
durante o esforço de guerra, sob a forma de ativos financeiros emitidos pelo
governo para financiar os gastos militares.
A reconversão da indústria de duráveis, por
exemplo, encontrou consumidores solventes, ávidos em substituir os velhos
automóveis, sobrevi-
Página 123
ventes
do período em que esteve vedada a produção para fins civis. Não menos
importante para o desempenho da economia americana no imediato pós-guerra foi a
ajuda financeira destinada a sustentar a reconstrução da Europa e a recuperação
da economia japonesa.
Depois da II Guerra Mundial e no âmbito da
Guerra Fria o chamado complexo militar-industrial incorporou-se à dinâmica do
capitalismo americano. Suas ligações com o establishment
acadêmico são uma fonte permanente de desenvolvimento científico-tecnológico
autônomo destinado a manter e ampliar o poder militar norte-americano [8 Nota
de Rodapé].
Da Construção Política
à Crise da Hegemonia Americana.
O surgimento de uma nova ordem mundial teve
de esperar até o fim da II Guerra Mundial, quando se constitui a hegemonia
americana sob a égide do padrão-dólar, no interior de uma ordem geopolítica
bipolar, que dividiu o mundo em duas esferas de influência. Os EUA emergiram da
II Guerra Mundial com um projeto claro de afirmar sua posição de potência
hegemônica do mundo capitalista. Este propósito era justificado em termos de
evitar as conseqüências desastrosas do "isolacionismo" que guiou a política
americana no primeiro pós-guerra.
A marca registrada deste período do após
guerra é a subordinação da economia à política. O economista americano Michael
Hudson, em seu livro Superimperialism
[9 Nota de Rodapé] teve a primazia de desvelar a subordinação da economia à
política no processo de construção das instituições criadas em Bretton Woods e
Dumbarton Oaks. Em sua essência, a criação das Nações Unidas, do Fundo
Monetário, do Banco Mundial e do Gatt significou o reconhecimento do
desmoronamento definitivo dos pilares da ordem liberal burguesa, ou seja, do
equilíbrio entre as potências e dos supostos automatismos do padrão-ouro. Por
isso, os princípios que informaram a construção da nova ordem estavam
claramente dirigidos contra o que havia sobrado do velho Império britânico.
Assim, em primeiro lugar, os EUA aliaram-se
com a União Soviética no propósito de desmontar o sistema colonial que servira
de base de sustentação ao Império britânico. Segundo, os EUA montaram um
sistema de instituições internacionais de controle político-militar (Otan) e
econômico financeiro (Gatt, FMI, Banco Mundial) e uma instância jurídica global
capaz de incorporar na Assembléia os sucessivos países descolonizados,
Página 124
mas
mantendo o poder decisório no núcleo das potências vitoriosas (Conselho de
Segurança).
O poder soviético, por sua vez, tinha-se
expandido durante a guerra até Berlim (com o acordo de Roosevelt e a oposição
de Churchil), o que em pouco tempo levou à Guerra Fria. A Alemanha Ocidental
foi rapidamente reconstruída com apoio americano, transformando-se no primeiro
milagre econômico europeu. O mesmo ocorreu na Ásia com o Japão, Taiwan e Coréia
do Sul depois da vitória da revolução chinesa. A geopolítica na Europa ficou
praticamente congelada até à implosão da União Soviética e da Iugoslávia,
continuou ativa na Ásia até à derrota no Vietnã e num jogo de intervenções
americanas no Oriente Médio, que ainda continua num impasse.
As movidas hegemônicas para assegurar o
controle do sistema capitalista compreendem: 1) a instalação de bases militares
nas fronteiras no sistema socialista rival; 2) o apoio decidido à recuperação
econômica das ex-potências do Eixo derrotadas e desarmadas; 3) a substituição
no Oriente Médio do tabuleiro montado pelas ex-potências imperiais, França e
Inglaterra; 4) a tentativa de estender a gendarmerie
à escala global. Ao alcançar o extremo-oriente, culminou na adoção de uma
estratégia de contenção em relação à China, o que propiciou o desenvolvimento a
convite do Japão, da Coréia do Sul e de Taiwan.
A expansão mundial do capitalismo sob a
hegemonia americana muda a divisão internacional do trabalho e o esquema
centro-periferia proposto pela hegemonia inglesa, tanto porque a natureza e a
dimensão do novo centro é radicalmente diferente quanto porque a sua expansão
para fora e a incorporação de periferias funcionais não correspondem mais à
divisão clássica entre um centro produtor de manufaturas e uma periferia
produtora de matérias primas. Como já foi dito, a economia norte-americana,
desde o século XIX, é simultaneamente grande produtora de manufaturas, matérias
primas e alimentos. Assim, a sua expansão para fora não se dá apenas nem
fundamentalmente pelo comércio, mas, sobretudo pelas filiais do grande capital
financeiro trustificado. Este é dominante internamente desde o final do século
XIX e internacionalmente desde o começo do século XX.
No segundo pós-guerra, a expansão da grande
empresa vai promovendo paulatinamente o aparecimento de fluxos comerciais entre
países que são, na verdade, comércio entre matrizes e filiais. Este movimento
vai se deslocando do Atlântico Norte para a América Latina, avançando depois
para o Pacífico. Ao chegar à Ásia muda novamente a divisão do trabalho em que
esta região se torna grande produtora de manufaturas baratas e importadora de
matérias primas. Estas modificações alteram completamente os termos da relação
Centro-Periferia propostos pela Inglaterra e teorizados por Raul Prebish o
"fundador" da Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL). As
relações de troca no comércio mundial deixam de inclinar-se a favor das
manufaturas e contra os Produtos Primários porque é no território dos países
asiáticos de mão de obra barata e com abundância de IDE que se produzem as
novas manufaturas. Assim enquanto a deflação de ativos veio dos EUA, no fi-
Página 125
nal
do século XX a deflação de preços de manufaturas veio da Ásia, bem como a
grande demanda de alimentos e matérias primas.
Com a nova divisão internacional do trabalho,
facilitada pelo deslocamento das filiais multi-sourcing,
a economia nacional americana se vê forçada a ampliar o seu grau de abertura
comercial e a gerar um déficit comercial crescente para acomodar a expansão
comercial assimétrica dos países asiáticos produzida em grande parte pela
expansão global do grande capital americano. Este movimento está na raiz da
ruptura definitiva do sistema de Bretton Woods e da crescente liberalização
financeira imposta pela potência hegemônica aos demais países a partir da
década de 80.
O gesto do presidente Richard Nixon em 1971
ao decretar a inconversibilidade do dólar em relação ao ouro, teve
conseqüências que os protagonistas e observadores da época foram incapazes de
avaliar. Depois da desvinculação do ouro em 1971 e da introdução das taxas de
câmbio flutuantes em 1973, a demanda da moeda americana para transações e como
reserva praticamente entrou em colapso, dando origem a um instável e
problemático sistema de flutuações cambiais. O dólar "flutuava"
continuamente para baixo. Sendo assim, não era de espantar que o papel da moeda
americana nas transações comerciais e financeiras começasse a declinar, assim
como a sua participação na formação das reservas em divisas dos bancos
centrais. A continuada desvalorização do dólar, ao provocar a queda das
receitas e do valor das "reservas de óleo" denominadas na moeda
americana, está também na origem dos dois choques do petróleo deflagrados em
1973 e 1979. Esta "crise do dólar" chegou a suscitar, no final dos
anos 70, as tentativas de sua substituição por Direitos Especiais de Saque, ou
seja, ativos líquidos emitidos pelo Fundo Monetário Internacional e lastreados
em uma "cesta de moedas".
A decisão do FED de subir unilateralmente as
taxas de juros americanas em outubro de 1979 (antes do 2° choque de petróleo)
foi uma resposta à investida de europeus e japoneses, tomada com o propósito de
resgatar a supremacia do dólar como moeda de reserva. Ao impor a regeneração do
papel do dólar como standard
universal através de uma elevação sem precedentes das taxas de juros, em 1979,
os EUA, além de deflagrarem uma crise de liquidez para os devedores do Terceiro
Mundo, deram o derradeiro golpe nas pretensões de reformar a ordem monetária de
Bretton Woods [10 Nota de Rodapé].
Na verdade, neste momento — argumenta
corretamente Michael Hudson [11 Nota de Rodapé], os EUA estavam impondo aos
detentores de excedentes em dólar o US
Treasury Bill Standard, um padrão monetário cujos ativos líquidos de úl-
Página 126
tima
instância passaram a ser os títulos de dívida do Tesouro americano ampliando o
poder de seignorage da moeda
americana. A partir de então, libertos das cadeias da conversibilidade e da
paridade fixa com o ouro, os EUA podem atrair capitais para os seus mercados e
dar-se ao luxo de manter taxas de juros moderadas, fenômeno que se acentua nos
anos 90 com a acumulação de reservas pelos países asiáticos a partir da
ampliação dos déficits comerciais crescentes com a área.
Assim, enquanto os conflitos geopolíticos
reais e potenciais continuam concentrados nas fronteiras movediças da Eurásia,
a geoeconomia global, sob a égide do capital financeiro americano e do novo
padrão monetário, tomou uma direção diferente deslocando-se para o extremo
oriente. A partir da década de 70, sobretudo depois do desastre do Vietnã e da
política de contenção militar da China, a diplomacia americana na Ásia
concentrou-se nos aspectos econômicos e financeiros. O processo de
mundialização do capital comandado pelos EUA, através da liberalização
comercial e financeira e do investimento direto, avançou rapidamente a partir
da década de 80 e terminou abarcando a velha Ásia ressurgente. Esta última
etapa, a da globalização financeira, ocorreu junto com o maior e mais duradouro
ciclo de crescimento da economia americana no pós-guerra enquanto se reduz o
ritmo de expansão dos demais parceiros da Tríade (Japão e Alemanha) e a
Periferia endividada entra em crise [12 Nota de Rodapé].
Mundialização
Financeira e Mutação na Riqueza Capitalista.
Com a ruptura sistêmica da década de 70, a
"acumulação" de ativos financeiros ganhou na maioria dos países status permanente na gestão da riqueza
capitalista e o rentismo se ampliou de forma generalizada. Aceleram-se as
mutações na composição da riqueza social do mundo capitalista e acentuaram-se
as assimetrias de crescimento entre países e distribuição de renda
interclasses.
As classes altas e médias passaram a deter
importantes carteiras de títulos e ações, diretamente, mas, sobretudo através
de cotas em fundos de investimentos, de fundos de pensão e de seguro. O
patrimônio típico de uma família de renda média passou a incluir ativos
financeiros em proporção crescente, além dos imóveis e bens duráveis, o que
altera substantivamente a distribuição de renda entre salários e rendas provenientes
de ativos financeiros.
Página 127
O Federal Reserve informa no Flow of Funds Accounts [13 Nota de
Rodapé] que, no primeiro trimestre de 2004 (depois do estouro da bolha dos anos
90), o valor dos ativos financeiros detidos pelas famílias americanas — ações,
cotas de fundos, títulos de dívida públicos e privados) era de US$ 34,8
trilhões contra US$ 20,1 trilhões em ativos tangíveis (casa própria, bens
duráveis).
As empresas em geral também ampliaram
expressivamente a posse dos ativos financeiros e não apenas como reserva de
capital para efetuar futuros investimentos fixos, mas como mudanças decisivas
na estrutura de sua riqueza patrimonial. Por isso, a expectativa de variação
dos preços dos ativos financeiros passou a exercer um papel muito relevante nas
decisões das empresas e bancos, e os lucros financeiros a superarem como
tendência os lucros operacionais.
Observadas do ponto de vista das instituições
e dos instrumentos financeiros, estas transformações na riqueza espelham a
maior importância da finança direta e "securitizada" em relação ao
crédito bancário. A desregulamentação financeira rompeu os diques impostos
depois da crise dos anos 30 à atuação dos bancos comerciais, transformados
agora em supermercados financeiros. Esta mudança engendrou a
"securitização" de créditos e facilitou o envolvimento dos bancos com
o financiamento de posições nos mercados de capitais e em operações "fora
do balanço" que envolvem derivativos. Isto não só vem permitindo maior
liquidez para os mercados, mas também ensejando um elevado grau de
"alavancagem" das corretoras, fundos e bancos de investimento.
A concorrência entre as instituições
financeiras foi um fator decisivo na atração da clientela e na aceleração das
inovações financeiras. Os administradores de portfólios, no afã de carrear mais
dinheiro para os seus fundos mútuos e de pensão, e na ânsia de bater os
concorrentes, procuram exibir as melhores performances. Para tanto, abriu
espaço em suas carteiras para produtos e ativos de maior risco. A expectativa
de variação dos preços dos ativos financeiros passa assim a exercer um papel
muito relevante nas decisões das empresas e bancos [14 Nota de Rodapé].
O professor José Carlos Braga, em sua tese de
Doutoramento, já advertira de forma pioneira a tendência à
"financeirização" e ao novo rentismo nas economias capitalistas,
processo que não ficou confinado às fronteiras nacio-
Página 128
nais
[15 Nota de Rodapé]. Muito embora a maior parcela dos ativos financeiros em
cada país seja de propriedade dos seus residentes, cresceu bastante a
participação cruzada de investidores estrangeiros, com a liberalização dos
mercados de câmbio e desregulamentação dos controles sobre os fluxos de
capitais. O valor da massa de ativos financeiros transacionáveis nos mercados
de capitais de todo o mundo saltou de cerca de US$ 5 trilhões no início dos
anos 80 para mais de US$ 100 trilhões no final dos anos 90, segundo as
estimativas do BIS.
Acompanhando o movimento de financeirização,
os países centrais caminharam na direção de um sistema de taxas flutuantes.
Tratava-se, na visão de muitos, de escapar das aporias da "trindade
impossível" ou seja, da convivência entre taxas fixas, mobilidade de
capitais e autonomia da política monetária doméstica. As flutuações cambiais pronunciadas
exacerbaram o papel das expectativas de valorização/desvalorização das moedas
na avaliação dos diferentes ativos. Para os países de moeda conversível,
sobretudo para o gestor da moeda central, a política monetária tornou-se, de
fato, um instrumento eficaz de estabilização do ciclo de negócios e do nível
geral de preços. Mas, ao mesmo tempo em que nos países centrais, as flutuações
do nível de atividade eram "amortecidas" e as taxas de inflação de
bens e serviços produzidos retrocediam, também se ampliaram as possibilidades
de ocorrência de "bolhas" e crises sucessivas nos mercados
financeiros.
Em artigo recente [16 Nota de Rodapé], os
economistas Ben Bernanke e Mark Gertler reconheceram a importância da riqueza
financeira e da situação patrimonial de empresas e famílias na concessão do
crédito e, portanto, na determinação do gasto capitalista: "No mundo em
que vivemos, em oposição àquele vislumbrado pelos modelos neoclássicos — os
mercados de crédito não estão a salvo de imperfeições; isto é, problemas de
informação, incentivos e cumprimento de contratos estão em toda a parte. Por
causa disto, o crédito pode ser concedido mais livremente e a custos menores
aos devedores que têm uma sólida posição financeira".
As pesquisas sugerem, segundo Bernanke e
Gertler, que os efeitos das variações de preços dos ativos na economia
"são transmitidos através das mudanças no balanço das famílias, das
empresas e dos intermediários financeiros". Os dois autores constroem um
modelo de crescimento com expansão do crédito, ampliação do investimento e
inflação de ativos, em que há um "prêmio de financiamento externo"
(recursos de terceiros). Este prêmio varia inversamente às condições
financeiras do tomador, isto é, será
Página 129
declinante
para os demandantes de empréstimos que possam oferecer melhores garantias
colaterais.
À medida que os preços dos ativos aumentam
rapidamente e "inflam" o patrimônio líquido das empresas e das
famílias, torna-se irresistível a utilização do endividamento como forma de alavancar
o investimento produtivo ou posições que prometem expressivos ganhos de
capital.
A sucessão de episódios de
"inflação" de ativos e de risco de crises tem sido enfrentada — até
agora com sucesso — pela política monetária americana. Assim foi na aguda crise
do hedge-fund Long Term Capital
Management em 1998 quando os administradores de riqueza, surpreendidos por
movimentos bruscos e não antecipados de preços, foram obrigados à liquidação de
posições em geral excessivamente "alavancadas". A pronta reação do
FED obviou uma crise sistêmica. O fato é que, ao longo dos últimos 20 anos, a
política econômica americana mostrou-se capaz de compatibilizar três objetivos:
1) administrar as condições de liquidez doméstica nas etapas de expansão e de
contração dos dois ciclos americanos; 2) garantir a resiliência do seu mercado
financeiro, mediante intervenções de última instância; e 3) manter as condições
de financiamento externo com elevadas flutuações na liquidez internacional, mas
preservando o papel do dólar como moeda-reserva.
Já nas economias periféricas, de moeda
não-conversível, isto é, com demanda nula por parte de agentes de terceiros
países — a nova interdependência financeira introduziu constrangimentos
importantes: as taxas de juros e de câmbio se tornaram mais sensíveis às
bruscas mudanças de expectativas dos possuidores de riqueza. Para estes países,
a nova integração financeira tem sido acompanhada de freqüentes problemas de
liquidez externa, com amplas flutuações nos preços dos ativos e das moedas. Daí
decorrem as severas limitações impostas às políticas monetária e fiscal que,
sem dúvida, têm sido mais inflexíveis e duradouras no caso dos países que
abriram suas contas de capital, surfaram nos ciclos de crédito externo e se
tornaram amplamente devedores em moeda estrangeira.
Na fase de saída líquida de capitais as
reservas se reduzem, mas os juros a sobem, o que engorda o estoque da dívida e
promove a dolarização do passivo interno do governo. Esta situação, diga-se,
ocorre tanto no regime de câmbio fixo quanto no de câmbio flutuante. Em ambos
os casos o Banco Central é obrigado a comprar e vender dólares numa tentativa
de acalmar o curso do câmbio e impedir um crescimento indesejável da relação
dívida/PIB.
O montante relativamente elevado de reservas
que os bancos centrais devem manter para aparentar uma situação de solvência é
um dos sintomas da
Página 130
impossibilidade
de adoção da flutuação cambial pura. Como os títulos de riqueza em moeda local
e os denominados em dólares são substitutos muito imperfeitos, o mercado
financeiro continua a arbitragem entre juros internos e externos — atento ao
risco cambial, de liquidez e de solvência — o que impede a convergência das
taxas de juros e exige a administração do câmbio.
Em países com elevado endividamento externo —
mesmo quando conseguem reduzir de forma significativa o déficit em conta
corrente — o câmbio flutuante não elimina o risco cambial e o Banco Central
está sempre obrigado a "sujar" as flutuações. As tendências à apreciação
ou depreciação dependem, no curto prazo, de condições de abertura financeira,
no estágio em que se encontra o fluxo de capitais e do maior ou menor
"descasamento" entre os ativos e os passivos em dólar dos bancos,
empresas e famílias rentistas sediados no país periférico.
A Reafirmação do Poder
Americano.
Nos anos 70, como já foi dito, a ruptura do
padrão-dólar fixo, a derrota do Vietnã e as crises do petróleo, balançaram os
pilares do poder americano. A maioria dos analistas continuou a proclamar a
derrota definitiva da hegemonia americana, mesmo depois de 1985 quando a crise
já tinha sido superada e os EUA avançavam na direção de um poder global.
A vulnerabilidade do dólar como moeda
internacional foi contornada pela da "diplomacia do dólar forte" do
governo Reagan (Volker), executada sem piedade no início dos anos 80 [17 Nota
de Rodapé]. O fortalecimento do dólar, como moeda de reserva e de denominação
das transações comerciais e financeiras, promoveu profundas alterações na
estrutura e na dinâmica da economia mundial. As transformações envolveram a
redistribuição da capacidade produtiva na economia mundial — sobretudo na
indústria manufatureira, o aparecimento de desequilíbrios duradouros nos
balanços de pagamentos entre os EUA, a Ásia e a Europa e o avanço da chamada
globalização financeira.
Em dois momentos (1980-85 e 1995-2001), a
valorização do dólar e a conseqüente expansão da posição devedora líquida dos
EUA definiram o curso das transformações. No início dos anos 80, a elevação sem
precedentes da taxa de juros fomentou, ao mesmo tempo, o déficit orçamentário
do governo Reagan e a valorização do dólar, responsável pelo crescimento rápido
do, até então, mais imponente déficit comercial do pós-guerra. Já nos anos 90,
a ampliação do déficit em conta corrente dos EUA foi provocada
Página 131
por
um forte crescimento do gasto e do endividamento privados. Nos dois momentos, é
fundamental sublinhar, a economia americana ganhou liberdade para adotar,
primeiro uma política fiscal expansionista e, nos anos 90, uma política
monetária e de crédito permissiva. Em ambas as situações o crescimento a taxas
elevadas foi caracterizado por uma expansão da demanda nominal a um ritmo bem
superior ao exibido pela produção doméstica, bem como por um crescimento da
relação endividamento total/ PIB.
Importante para a revitalização da finança de
mercado foi o papel desempenhado, no início dos anos 80, pela ampliação do
endividamento público americano, de maior qualidade, fenômeno crucial para
socorrer as carteiras e conter o colapso dos bancos envolvidos com a crise da
dívida externa do Terceiro Mundo. As dívidas públicas dos EUA e da Europa
cresceram rapidamente na década de 80, engordadas pelas taxas de juros
elevadas. O crescimento "endógeno" do endividamento público foi
acompanhado de uma maior dependência dos governos em relação aos mercados
financeiros internacionalizados. A partir de então, de forma inédita na
história da internacionalização capitalista, os EUA passaram da posição de
maiores credores à de maiores devedores do mundo — tanto do ponto de vista
interno quanto do externo.
Passado o choque inflacionário do início dos
anos 80, a política de supply side
economics combinada com a sobrevalorização do dólar permitiu, à economia
americana, retomar o crescimento sem pressões inflacionárias, com elevação do
poder de compra dos salários apoiada em importações de bens de consumo baratos
e expansão monetária acima da renda nominal. "Neste verdadeiro ajuste às
avessas, os EUA conseguem, simultaneamente, obter transferências de liquidez,
de renda real e de capitais do resto do mundo... A retomada do crescimento
americano se fez com uma função de oferta global com rendimentos crescentes e
grande capacidade de resposta aos estímulos da demanda. À elevação do déficit
comercial americano corresponde uma tentativa de obtenção de saldos comerciais
crescentes dos demais países industrializados. Exportar é a solução para todos,
menos para a economia dominante, cuja solução é importar barato”. [18 Nota de
Rodapé]
A política econômica de Reagan — com seu
dólar supervalorizado, enormes déficits orçamentários e nas contas de comércio
— foi chuva "criadeira" para os países da Ásia, em particular para o
Japão, Coréia e Taiwan. Esse foi o período dos grandes superávits comerciais
japoneses, taiwaneses e coreanos. O aparecimento dos bancos, corretoras e
seguradoras japonesas no cenário das finanças globais foi o produto inevitável
da acumulação dos enormes excedentes financeiros, decorrentes dos sucessivos e
crescen-
Página 132
tes
superávits comerciais do Japão, principalmente, com os EUA, mas também com a
Europa.
Quando, porém, em meados dos anos 80, os EUA
resolveram reverter a brutal valorização do dólar, que já havia causado danos
quase irreparáveis á sua indústria, foi dado um sinal claro de que, pelo menos
"esta parte da festa" estava prestes a acabar. Os japoneses foram
obrigados a engolir a valorização do yen, o que, por um lado, afetou suas
exportações para a área de predominância da moeda americana e, por outro,
causou sérios prejuízos para os bancos, corretoras e seguradoras que carregavam
em suas carteiras ativos em dólar. A famosa "endaka"
dará impulso ao movimento de "deslocalização" da indústria japonesa
para os países da região, apoiado na capacidade de financiamento de seus
bancos, que tentavam compensar as perdas incorridas nos ativos denominados em
dólar.
Coréia, Taiwan e os Tigres de segunda
geração, como Tailândia, Malásia e Indonésia, haviam atrelado a suas moedas ao
dólar, o que tornava atraente o deslocamento do investimento nipônico. Por
outro lado, taxas de juros em yen eram extremamente convidativas e compensavam
pelos menos em parte o risco de uma valorização adicional da moeda japonesa.
A China, e seu já desvalorizado yuan, iria
completar a primeira década de crescimento acelerado. Este novo e gigantesco
protagonista do "milagre asiático" vinha executando seus programas de
reforma econômica com grande eficácia. Estas reformas buscavam a combinação
entre uma agressiva estratégia exportadora, atração de investimentos diretos
estrangeiros nas zonas liberadas e a forte intervenção do Estado. A ação
estatal concentrou-se no estímulo à agricultura familiar, em maciços
investimentos em infra-estrutura e na utilização das empresas públicas como "âncora"
para a constituição de grandes conglomerados industriais. Tudo isso foi
acompanhado de uma cuidadosa transição do sistema de preços da antiga economia
de comando para a "nova" economia de mercado.
As praças financeiras
"internacionalizadas" de Hong Kong e Singapura integraram-se
rapidamente ao complexo "asiático" em formação, através dos bancos
locais e estrangeiros aí sediados. Estes fluxos cruzados de investimento
direto, de expansão do crédito e, mais tarde, de aplicações de portfólio,
estimularam o crescimento muito rápido do comércio entre os países da região,
sobretudo através das transações intrafirmas. Desde o final dos anos 80, o
comércio entre os países da área iria se expandir a taxas impressionantemente
altas, superando as relações comerciais com a Europa e a América do Norte.
Carlos Medeiros, em seu excelente artigo "Globalização e Inserção
Internacional', mostra que "foi se afirmando um cluster regional de investimento e de comércio intra-indústria e
intrafirmas permitindo
Página 133
às
empresas, sobretudo às japonesas e coreanas, formar no setor manufatureiro
importantes economias de escala e de especialização... Esta dinâmica não pode,
contudo, ser explicada fora de um contexto marcado por expansão macroeconômica
regional, combinando investimentos, comércio interindustria e penetração nos
grandes mercados da OCDE". Tampouco pode ser explicada fora do contexto da
forte expansão macroeconômica norte-americana dos anos 90 e da estagnação
japonesa no mesmo período.
O exuberante ciclo de expansão americano dos
anos 90 — outra vez escoltado por gigantescos déficits em transações correntes
— vai reforçar as relações de solidariedade e, ao mesmo tempo, de forte
concorrência dentro do bloco asiático. A Coréia e o Japão, por exemplo, tornaram-se
ferozes competidores, em terceiros mercados, nos setores de maior dinamismo
como o automobilístico, os microprocessadores e a eletrônica de consumo. De
outra parte, a expansão coreana apoiou-se fortemente na importação de bens de
capital e no financiamento dos bancos japoneses para manter as elevadas taxas
de acumulação exibidas ao longo dos anos 90. Essas relações de
"concorrência e solidariedade" são ainda mais evidentes no caso da
China, cuja "competitividade" é crescente, tanto nos mercados menos
qualificados quanto, em ritmo acelerado, nos de tecnologia mais sofisticada.
Sobretudo depois da desvalorização de 1994, o drive exportador chinês vai deslocando a participação de seus
parceiros asiáticos em terceiros mercados, ao mesmo tempo em que estimula as
importações de peças e componentes dos países da região. Simultaneamente, os
chineses sustentam a continuada elevação da taxa de acumulação interna de
capital e a rápida incorporação de novas tecnologias mediante o estímulo às joint-ventures com empresas coreanas,
japonesas e de Taiwan (com capitais sobrantes nas crises asiáticas da década de
90 e menor taxa de crescimento de seus mercados internos daí em diante). Estas
relações de interdependência tornaram essas economias muito sensíveis com, é
óbvio, as alterações nas taxas de câmbio relativas e particularmente as
alterações nas relações de valor entre o dólar e o yen, e entre ambas e a moeda
chinesa. Esta, depois da desvalorização real de 1994/95, manteve-se ancorada
nominalmente no dólar.
A posição chinesa na economia mundial
melhorou rapidamente a partir de uma alta taxa de crescimento interno, de
absorção de IDE e de crescimento das exportações que se manteve a mais estável
e vigorosa desde 1970 em relação ao resto do mundo, antes mesmo das reformas
liberais. É o segundo maior absorvedor de investimento direto depois dos EUA e
mantém com este país uma relação especial de competição e complementaridade. Ao
contrário do Japão, que não contou com uma importante absorção externa de
capitais e se mantém, até hoje, como país credor dos EUA, a China
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é
simultaneamente devedora (pelo IDE) e credora (pela acumulação de enormes
reservas em dólar aplicados em títulos do Tesouro americano).
Qualquer diminuição acentuada no comércio e
no investimento da China afetaria dramaticamente a economia do leste asiático —
do qual a expansão chinesa é hoje o principal motor — e poderia provocar um
"enfarte" numa das artérias mais importantes da globalização
americana. A pressão exercida por expoentes do poder americano para penalizar o
sistema de proteção chinês e diminuir seu superávit, parece uma vez mais o
cacoete protecionista para dentro e liberal para fora, em que as lideranças
americanas recaem periodicamente. Pode tratar-se também de uma manobra de real politik, apoiada pelo Japão para
obter maiores concessões comerciais e financeiras da China e manter o
"equilíbrio de poder" na Ásia. O governo chinês resiste e além de
manter alta a taxa de investimento para expandir o seu mercado interno está
iniciando uma ofensiva para investir em alta tecnologia e buscar
complementaridades com países provedores de recursos naturais. Perseguir uma
inserção internacional mais ampla faz parte de uma estratégia que libere a
China do seu dilema secular — fechar-se no seu imenso espaço territorial ou
ficar à mercê do jogo das grandes potências.
Conclusões
Os EUA, a despeito do monumental déficit em
transações correntes, não precisaram se preocupar com o risco de uma fuga do
dólar. A demanda pela moeda americana nasce hoje do papel dos EUA como economia
dominante no comércio internacional e nos mercados financeiros onde continua a
atração dos títulos públicos como ativos líquidos de última instância na
economia global. Enorme vantagem para quem tem um déficit de transações
correntes da ordem de US$ 550 bilhões. Com um déficit dessa magnitude, qualquer
outro país teria sofrido um ataque contra sua moeda. No entanto, apesar dos
augúrios, não parece provável uma derrocada do dólar. A demanda de
não-residentes por títulos do governo americano, especialmente a que nasce dos
saldos comerciais e enormes reservas dos países asiáticos, vem permitindo a
expansão do crédito e sustentação do preço dos ativos no mercado financeiro
americano. Enquanto isso, as famílias se endividam ainda mais para adquirir
produtos baratos oriundos dos "produtivistas" da Ásia.
A "globalização americana" ensejou,
de forma inédita, a articulação estrutural entre o sistema de crédito, a
acumulação produtiva das empresas, o consumo privado e a gestão das finanças
privadas e do Estado (particularmente da dívida pública). Esta verdadeira fusão
de funções e de interesses
Página 135
reafirma
o caráter essencialmente "coletivista" (e macroeconômico) da nova
dinâmica de reprodução do capitalismo central. Uma exibição prática da
"macroeconomia política" do Poder e da Riqueza Americanos, fundados
nas relações entre hegemonia monetária, expansão do crédito, valorização de
ativos e crescimento econômico.
As relações entre Estado e Mercado (uma forma
imperfeita de exprimir as relações entre política e economia) não são
"externas", de mero intervencionismo. São orgânicas e constitutivas.
Nos tempos da "economia global", tais formas socializadas do poder
privado permitem diversificar a riqueza de cada grupo, distribuí-la por vários
mercados e assegurar o máximo de ganhos patrimoniais, se possível no curto
prazo. Os agentes destas operações são as instituições da finança privada. São
elas que definem os preços de venda, os métodos de financiamento, a
participação acionária dos grupos, as estratégias de valorização das ações. A
garantia final — mas certamente não definitiva — do processo de valorização de
ativos é a existência de um estoque de ativos líquidos e seguros emitidos pelo
governo do país hegemônico. Este é o mercado "competitivo" do
capitalismo formado por empresas gigantes na era da desregulamentação e da
liberalização.
Nos dois "mercados flexíveis", o
dólar e o petróleo, os EUA deixaram de arcar internamente com o ônus da
desregulação que caracterizou o período da transição 1973/85 e passaram a uma
economia de comando na qual a política norte-americana faz unilateralmente as
intervenções preventivas ou corretivas, segundo a conjuntura. Sem regras gerais
auto-aplicáveis e sem consideração pelas regras dos organismos internacionais
que eles mesmos ajudaram a criar, o intervencionismo preventivo norte-americano
expandiu como nunca o seu poder global.
A gestão econômica interna do
intervencionismo preventivo norte-americano tornou-se mais complexa com a reafirmação
da hegemonia norte-americana. No entanto, as eventuais divergências entre a
Secretaria do Tesouro e o FED a respeito da política econômica são facilmente
contornáveis quando se tem à disposição uma política fiscal e monetária
elásticas (sem restrição de balanço de pagamentos), e nenhum dos seus
dirigentes pensa em contrariar os interesses dos grandes bancos americanos e da
"comunidade financeira internacional", novamente consolidada em Wall Street
depois de 1985. O mesmo não se pode dizer do petróleo e das armas. Afinal o
Texas não tem o poder de coordenar o mercado mundial de petróleo, e muito menos
as políticas setoriais e globais do complexo militar americano.
A política externa dos EUA, depois da movida
diplomática de Nixon (Kissinger) em relação à China, tinha deixado de se
concentrar apenas nos conflitos Leste-Oeste, congelados pela distensão da
guerra fria e deslocado seu foco para o Oriente Médio. As pretensões
"arbitrais" da velha Inglater-
Página 136
ra
no Oriente Médio estavam definitivamente minadas desde a crise do Canal de Suez
e requeriam a passagem do bastão para os EUA. Tratava-se de resolver em
simultâneo a geopolítica da área e a geoeconomia do petróleo, ambas em grande
período de turbulência. No que diz respeito à regulação e à geopolítica do
petróleo o condomínio americano-saudita-iraniano reafirmado pelo acordo de
Teerã de 1971 durou pouco, graças à instabilidade do Sistema Monetário
Internacional e aos conflitos crescentes nos países árabes que se agravaram com
a derrubada do Xá do Irã [20 Nota de Rodapé].
O
tabuleiro político-militar no Oriente Médio não deixou de mover-se
aceleradamente desde então. A estratégia da intervenção preventiva prosperou.
No caso do Oriente Médio, os EUA não esperaram para substituir a velha gerdarmerie colonial como ocorreu no
caso do Vietnã. Intervieram em todos os conflitos, fizeram tratados unilaterais
com o Egito e com Israel, apoiaram primeiro o Xá do Irã e, quando este foi
derrubado pela "revolução xiita" em 1979, armaram o Iraque na longa
guerra que se seguiu, apoiando Saddam Hussein que viriam a derrubar duas
décadas depois. A Arábia Saudita manteve-se até hoje como o único aliado fiel
dos EUA, depois das mudanças sucessivas de alianças e dos conflitos nos demais
países árabes.
Dentro da lógica da expansão contínua e
permanente da presença militar no mundo, os Estados Unidos mantiveram as
antigas bases, instaladas após a II Guerra Mundial dentro da União Européia e
expandiram-se para o leste europeu, depois da implosão da União Soviética. As
bases mais recentes, no entanto estão localizadas em países possuidores de
petróleo ou nas atuais fronteiras russas e chinesas da Ásia Menor [21 Nota de
Rodapé]. O fato de que as bases militares no exterior respondem, em suas
tarefas múltiplas, a comandos das forças armadas e da espionagem
norte-americanas, não unificados internamente, perturba e distorce muitas vezes
as informações disponíveis no Pentágono e no resto dos órgãos de segurança.
Isso agrava as disputas entre a Secretaria de Defesa e o Departamento de Estado
que vêm se acentuando desde o governo Reagan. Não existe, na verdade, um
comando unificado da Segurança Nacional norte-americana (como se viu no
desastre de 11 de setembro), talvez porque a "doutrina de segurança"
e as agências de inteligência se espalharam a todos os escalões do governo,
desde que o poder nacional se confundiu com o poder global.
O cruzamento dos grandes interesses
corporativos e militares que atravessam a geografia mundial, em particular
desde a guerra do Iraque, tor-
Página 137
nam
os "dissensos de Washington" sobre decisões da política externa
norte-americana, um verdadeiro quebra-cabeças. O aumento desmedido do poder
global dos EUA, sem o consenso compartilhado dos seus antigos associados é
incompatível com a noção de Ordem Internacional, por sua inerente instabilidade
estrutural.
Do ponto de vista da mundialização do capital
o "objeto do desejo" do Ocidente voltou a ser a China, como nos
tempos do veneziano Marco Pólo no começo da modernidade mediterrânica. As zonas
especiais de exportação começaram pelos mesmos portos ocupados, no século XIX,
pelas grandes potências imperiais. Não se trata, porém de uma ocupação bélica
ou colonial, mas de aplicação das velhas teses da "abertura dos portos"
ao livre comércio e ao movimento de capitais, hoje expressas na Organização
Mundial do Comércio. O governo chinês, mesmo depois das reformas liberais e da
sua entrada na OMC, manteve o controle de câmbio e resiste à abertura de sua
conta de capitais, o que não a impede de ser o maior absorvedor de investimento
direto dás filiais globais. É também o segundo maior financiador do déficit
americano através da retenção de reservas vultosas aplicadas em títulos da
dívida pública.
No começo do século XXI está configurada uma
nova anatomia da geoeconomia capitalista. O cérebro é o poder de contenção e de
controle geopolítico da superpotência hegemônica e o coração da economia
mundial continua sendo a sua gigantesca economia continental. O pulmão por onde
respira e se expande a "2a onda de globalização americana" é a Ásia
ressurgente, em particular a China. A índia apesar de sua forte taxa de
crescimento e de ser uma potência atômica não é um ator financeiro relevante na
globalização do capitalismo, já que ao contrário do sudoeste da Ásia, não
possui praças financeiras internacionais relevantes para o movimento de
capitais. A velha Europa continental, até há pouco uma fortaleza mercantil que
incluía apenas 12 países, mantém-se em crescimento lento. A União Européia
aparece hoje como um enorme estômago às voltas com a digestão dos problemas
acumulados desde a paz de 1919 na sua "fronteira oriental" e
retomados com a desestruturação da União Soviética. A África tornou-se um
continente em desagregação pelo fracasso do desenvolvimento autônomo depois da
descolonização. A América Latina continua uma zona endividada de baixo
crescimento. A Rússia, depois do desmantelamento do Império ficou isolada e
economicamente depauperada, embora continue uma grande potência militar. A
maior zona de instabilidade econômica (o petróleo) e política (guerras
sucessivas) continua sendo o Oriente Médio, onde o sonho wilsoniano da paz
universal e da autodeterminação dos povos se tornou um pesadelo.
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REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
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Desenvolvimento das Nações. Ed. Vozes, Petrópolis.
Notas
de Rodapé
Nota 1 - Página 112: Não há modelo lógico do
tipo "teoria objetiva" do Valor que dê conta das contradições do
capitalismo, assim como tampouco existe uma "filosofia" da história
que determine o seu movimento concreto.
Nota 2
– Página 115: Ver Morris, 1999.
Nota 3 – Página 115: Ver Philips, 2002.
Nota 4
– Página 115 Ver Hobson, 1965.
Nota 5
– Página 116: Ver Cashman, 1998.
Nota 6
– Página 119: Para a importância da guerra civil americana como o primeiro
passo para a "Curta Marcha" para a Hegemonia, ver Teixeira, 1999.
Nota 7
– Página 122: Para o setor de telecomunicações ver o artigo de Moraes
"Telecomunicações e o Poder Global dos EUA", neste volume.
Nota 8
– Página 123: Ver Medeiros "O desenvolvimento tecnológico americano no
pós-guerra como um empreendimento militar", neste volume.
Nota 9
– Página 123: Hudson, 2003.
Nota 10 – Página 125: Ver Tavares
1985 in: Fiori, 1997
Nota 11 – Página 125: Ver Hudson, M., op. cit.
Nota 12
– Página 126: Ver
Maddison, 2001, Capítulo 3.
Nota 13 – Página 127: O Federal Reserve publica o Flow of Funds Accounts of the United States.
Neste relatório
trimestral estão registrados os fluxos gerados pelas distintas instituições
provedoras de crédito e apontados os principais tomadores de recursos. O estudo
apresenta também dados sobre o estoque de dívida acumulados no fim de cada
período, bem como a situação do patrimônio líquido dos tomadores finais de
crédito.
Nota 14
– Página 127: Ver Belluzzo, L.G., op.cit.
Nota 15 – Página 128: Ver Braga, 1997.
Nota 16
– Página 128: Bernanke & Gertler, 1999.
Nota 17
– Página 130: Ver Tavares, op. cit.
Nota 18
– Página 131: Ver Tavares & Belluzzo, 1986.
Nota 19
– Página 132: Medeiros, 1997.
Nota 20
– Página 136: Sobre petróleo, ver Torres Filho "O Papel do Petróleo na
Geopolítica Americana" neste volume.
Nota 21
– Página 136: Sobre a geopolítica das bases ver Johnson, 2004.
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