O agricultor Raimundo Francisco Ferreira, 72, achou estranho encontrar ontem uma faixa na porta da Prefeitura Municipal de Ceará-Mirim, a 28 km de Natal. O comunicado informava que o prédio estava fechado em protesto contra a frustração nos repasses do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), um recurso que corresponde a 60% das receitas daquela cidade. Protestos semelhantes também foram observados em outras 129 prefeituras potiguares, segundo a Federação dos Municípios (Femurn).
A paralisação faz parte do movimento nacional “SOS Municípios”, lançado no último dia 21. O protesto público será encerrado hoje. As sedes municipais foram fechadas e uma faixa comunicava o ato. Os serviços essenciais – saúde, educação, limpeza urbana, abastecimento e segurança – não sofreram mudanças. Aderiram ao ato todas as cidades com menos de 50 mil habitantes – além de Ceará-Mirim, que conta com 71 mil habitantes.
Nestes locais, o FPM representa cerca de 90% da receita municipal. Com menos recursos, cerca de 60% destas cidades estão acima do limite prudencial da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Hoje, este limite é de 54%.
Olhando a faixa informando o fechamento ao público, o agricultor Raimundo Francisco Ferreira indagou: “Como é que a prefeitura não tem dinheiro? Essa é nova para mim. Nunca vi uma greve de prefeito”.
Em Ceará-Mirim, a Prefeitura, a Procuradoria, a Ouvidoria e as secretarias fecharam as portas ao público. No entanto, as atividades administrativas foram realizadas normalmente.
A população da cidade dos “verdes canaviais” nem fazia ideia do inusitado protesto. “A prefeitura deveria se preocupar com a saúde. Se estão sem dinheiro, que cobrem do governo federal. O que não pode é ficar nesta palhaçada aqui”, condenava o pedreiro Roberto Silva Júnior, 27.
A opinião é a mesma da doméstica Maria Gorete Ferreira, 51, que pedia mais atenção para a saúde. “Eu quero mais médicos e menos desculpas. Isso aqui é um absurdo”, diz. Também houve críticas à limpeza pública. “A coleta de lixo não está funcionando direito. Há 10 dias que não vejo um caminhão circulando”, reclamava a dona de casa Conceição Palhares, 47.
“Isso é uma vergonha. O prefeito deveria estar aqui. Paralisar as atividades não ajudar em nada”, reclamava a dona de casa, Valdete Santos, 51.
Se a sede estava fechada, os serviços de saúde ocorreram ontem sem problemas. Até mesmo os servidores públicos foram surpreendidos com o protesto. “A prefeitura fechou? Eu nem sabia disso”, comentou Carlos Varela Júnior, diretor da Unidade de Saúde Vale do Amanhecer. O posto tem apenas um médico. Ele trabalha apenas quatro dias na semana. “São 40 atendimentos diários”, detalha o diretor, que também é enfermeiro.
O prefeito Antônio Peixoto não estava na cidade. Ele participou ontem de um evento do UNICEF em Fortaleza (CE). No estacionamento do prédio pilhas de documentos secavam ao sol. Estavam molhados por conta de uma infiltração.
Alguns servidores batiam papo em frente ao prédio e informavam aos moradores da cidade os motivos do protesto. Um carro de som também foi contratado para informar a população.
Hoje, o FPM rende ao município R$ 1,2 milhão por mês. O valor corresponde ao coeficiente da população. Outra fonte de arrecadação é o ICMS. A cidade é uma das grandes produtoras de Cana-de-açúcar do Rio Grande do Norte e tinha na Usina São Francisco, que processava 800 mil toneladas de açúcar por ano, uma importante fonte de riquezas. Desde que a indústria foi fechada, em 2009, a arrecadação com o ICMS foi reduzida em 50%. De acordo com a Secretaria Estadual de Tributação (SET), os valores repassados caíram de R$ 800 mil para R$ 400 mil.
O chefe de gabinete de Ceará-Mirim, George Ferreira, informa que para não ficar no vermelho, a prefeitura aposta numa reforma do código tributário municipal. O objetivo é aumentar a arrecadação com o IPTU. Isso se explica porque das mais de 20 mil residências, apenas duas mil estão em dia com o tributo. “Temos de mudar a forma de arrecadar. Não adianta reclamar dos repasses federais e não alterar a forma com a qual cuidamos dos nossos próprios tributos”, justifica Ferreira. A meta do município é conseguir a adesão de 30% dos moradores em 2014.
Ainda segundo o chefe de gabinete, para manter o equilíbrio financeiro, o município já demitiu 30% dos cargos comissionados e outros 25% dos servidores com algum tipo de contrato temporário. Ele disse não saber o impacto deste corte na folha de pagamentos. “Estipulamos um prazo de 90 dias para contabilizar a economia”, alega.
DO NOVO JORNAL
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