domingo, 6 de março de 2016

ALRN: O discurso perde consistência diante dos fatos

O presidente da ALRN falou ao Novo Jornal sobre o descalabro que veio à tona com a determinação do MP e da Justiça para que fosse aperfeiçoado o Portal da Transparência, inclusive com a disponibilização das informações sobre o quadro de pessoal.

Leia:
O deputado Ezequiel Ferreira de Souza, presidente da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte, considerou normal a pressão exercida pela população diante das informações do Portal da Transparência sobre o quadro de pessoal da Casa, que apontaram elevado número de cargos comissionados e nomes de servidores na folha sem comparecerem ao expediente, entre outras irregularidades que estão sendo alvo de investigações internas e de órgãos como Tribunal de Contas e Ministério Público.  

Comento: as investigações internas ainda não foram suficientes nem para os 'investigadores' se convencerem a instaurar uma mísera sindicância. O descalabro parece acéfalo e órfão. Não acreditam que o povo potiguar engula a seco e se conforme sem a punição de ninguém? E que fique bem claro: os culpados não foram os servidores relapsos, mas quem nomeou e permitiu o quadro chegar ao estado atual.
Em entrevista ao NOVO na última sexta-feira, Ezequiel Ferreira afirmou que a Assembleia Legislativa precisa caminhar em consonância com os anseios da população, mas ressalta que todas as medidas anunciadas no início da semana para reduzir os gastos com a folha de servidores estavam contempladas no novo modelo de gestão que vem sendo executado desde que assumiu a presidência há cerca de um ano.

Comento: basta que a ALRN e seus dirigentes se curvem a Lei. Chega de corporativismo! Chega de patrimonialismo!

“Acho que a pressão é salutar e a Assembleia tem que estar em consonância com a população. Essa é uma Casa Legislativa e precisamos sempre estar antenados com a população. Não é à toa que estamos para abrir a nossa Ouvidoria para ouvir as reclamações, sugestões, e aí a poder apurar.

Comento: não é suficiente. A direção da Casa tem que controlar as ações dos servidores, os procedimentos e processos afeitos aos dispêndios dos recursos públicos. Estruturar o Controle Interno não será tarefa tão complicada, pois é grande o número de servidores com qualificação, especialmente, advogados. Também é necessário o funcionamento da Corregedoria e o estabelecimento de um padrão mínimo de ética. A depuração tem que começar também de dentro para fora, pois somente o Controle Externo não será suficiente para modificar a cultura patrimonialista arraigada.
Segundo ele, no transcorrer de dez dias, a contar da última quinta-feira (3), terão sido extintos 800 cargos comissionados dos 2.592 que o Poder Legislativo potiguar abriga. A meta, ainda sem previsão de ser alcançada, é chegar a 1.324. No total, a Assembleia tem 3.318 funcionários, sendo apenas 379 efetivos. 

Comento: extinguir 800 cargos comissionados parece algo muito bom, mas no caso da ALRN tem que ser apenas o começo. Não é tolerável permanecer com 1.792 cargos comissionados no universo de 3.000 cargos. Ademais, estabelecer a meta de extinção de 1.324 cargos comissionados, sem prazo definido confronta o discurso do tal "planejamento estratégico".
Na sessão de quinta-feira, os deputados aprovaram em plenário a Resolução nº 003/2016, que normatiza a extinção e corte dos cargos de 692 cargos comissionados. A medida foi tomada como resposta ao clamor popular diante das “gorduras” do quadro funcional que o Portal da Transparência, inaugurado no dia 1º de fevereiro passado, apontou: elevado número de cargos comissionados, funcionários “fantasmas” que recebem de gabinetes de deputados sem sequer por os pés na Assembleia, pessoas mortas que constam da folha de pagamento e servidores que moram em outros estados. 

Comento: creio que não tem cabimento a informação de que existam servidores recebendo diretamente dos Gabinetes. Seriam necessários 24 unidades gestoras, com personalidade jurídica, para se viabilizar o pagamento direto pelos Gabinetes. Pelo que observei nas exonerações e nomeações a prerrogativa é da Mesa Diretora. Os deputados devem ser responsáveis pelas indicações, mas nomeação/exoneração, gestão administrativa da Casa e pagamentos devem ser responsabilidades da Mesa, com a prerrogativa de delegar atribuições.
“Tudo que vem acontecendo até agora dentro da Assembleia está dentro desse planejamento estratégico”, pondera o presidente da Casa, referindo-se ao modelo de gestão que vem adotando. Esclarece que o plano estratégico consta de 36 itens e deve terminar sua formatação com uma reforma administrativa. Para isso, o presidente quer contratar a conceituada Fundação Getúlio  Vargas.

Comento: o Senado também contratou a FGV, mas não melhorou a imagem da Instituição, pois quase nada foi usado e ficou a impressão que a contratação foi uma estratégia para justificar que "algo" estava sendo feito, enquanto, na verdade, esperava-se a crise esfriar.
Não se discute a capacidade da FGV.
Ezequiel quer gastar mesmo tendo tanta gente qualificada no quadro da AL? Que tal firmar uma parceria com a UERN? UFRN? IFRN? UFERSA?
Ele cita como pilares de sustentação desse plano a economicidade (cortar gastos) e a transparência para aproximar mais o povo da Assembleia. O deputado contabiliza os feitos de sua gestão. O primeiro deles foi a criação de um grupo de gestão de contrato. Cada contrato da Assembleia Legislativa é acompanhado por um servidor e graças a esse grupo, diz ele, chegou-se à redução de 20% dos contratos no ano passado. 

Comento: creio que uma parceria com uma instituição de ensino potiguar para propor um novo modelo de estrutura administrativa será mais em conta do que a contratação da FGV, salvo o presidente não acreditar na capacidade das universidades públicas do RN.
Ué? Foi somente na gestão de Ezequiel que os contratos passaram a contar com fiscais? Antes descumpriam a legislação?
A redução de 20% foi no número de contratos? Ou no desembolso com os contratos?
Uma medida relativamente simples e com resultado satisfatório seria realizar pregões eletrônicos.

Foram feitos cortes na extensão de projetos como a Assembleia Cidadã e Itinerante, que no livro de caixa ressoa em economia de custos. Foi feito o redimensionamento do uso do celular e  fechados  dois anexos da instituição.
“Mas não paramos por aí. Dentro do novo modelo de gestão criamos também novas formas de arrecadar”, exalta o presidente, referindo-se ao Fundo Legislativo que funciona nos moldes do que existem no Senado e Câmara Federal. 
As instituições financeiras que trabalham com servidores da Assembleia passam um percentual de cada operação para o Fundo Legislativo, cujos recursos são usados em benefício dos funcionários, como o plano de cargos e carreiras do servidor e cursos de capacitação.
Além do Portal da Transparência, a atual gestão irá criar uma Ouvidoria para receber denúncias e reclamações da sociedade, interagindo com a opinião pública no que concerne as ações dos legisladores potiguares. “Esses também são passos que trabalhamos lá atrás com o  planejamento estratégico”, frisa o presidente. 
Divisão de cargos por gabinetes
Um levantamento do Tribunal de Contas do Estado (TCE) encontrou desproporção de cargos efetivos (379) e os comissionados (2.592). Para cada cargo efetivo, há sete cargos em comissão. Além disso, pelo levantamento do TCE, houve um crescimento exponencial dos comissionados. Entre 2011 e 2016 foram criados 1.756, o que implica 86% de crescimento desses cargos.

Comento: evidentemente não é preciso ser um gênio para perceber o descalabro. Os parlamentares não podem alegar desconhecimento sobre a necessidade do provimento de cargos ocorrer, preferencialmente, através de concurso público. A partir de 1988 todos os dirigentes da Casa desrespeitaram a exigência, quer seja por omissão e/ou criação de novos cargos comissionados. Ezequiel e seu "planejamento estratégico" também criou 44 cargos comissionados e isso num ambiente totalmente saturado, com evidente desproporção entre efetivos/comissionados e numa crise econômica sem precedentes. O discurso perde consistência diante dos fatos.
“É importante se dizer que também houve a divisão de cargos nos gabinetes parlamentares. Isso é importante de se dizer. Há um número específico de cargos para cada deputado que, por lei, foi dada a oportunidade de se dividir esses cargos com os mesmos valores totais”, explica Ezequiel. Um  gabinete que tinha um custo de “x” com 11 cargos pode transformar esses 11 em 33. “Uma das justificativas é essa. Existe o limite por gabinete neste cargo”, contabiliza. Porém, frisa, o valor que paga 33 é o mesmo que paga 11.

Comento: quais as justificativas para se multiplicar por três o número de indicações para cada deputado? A direção da Casa observou/acompanhou/analisou o desempenho? A produtividade foi multiplicada por três?
Quem propôs tal Lei de multiplicação de cargos comissionados? Foi mesmo uma Lei? A Lei estabeleceu o rebaixamento dos vencimentos dos cargos anteriores? Definiu atribuições para os novos cargos?
Cada deputado tem autonomia em seu gabinete. Quando assume um mandato é ele que faz as nomeações e também os destitui quando perde o mandato.

Comento: os deputados demitem e exoneram ao arrepio da Mesa Diretora? Que Lei/Resolução ou qualquer outro tipo de ato atribuiu tal competência? Em que meio foram publicados os atos de nomeação e exoneração praticados diretamente pelos deputados?
“Muitas vezes as pessoas perguntam: você está dando um corte “x” de comissionados, por que não chama de imediato os concursados? Me comprometi no pronunciamento que já fiz aqui. Nós já chamamos 21 dos concursados e quero até o final do ano poder chamar os demais (para 85 vagas). É compromisso nosso, dessa gestão.

Comento: a demonstração que a multiplicação (por três) de cargos comissionados não resultou em aumento da produtividade (o que reforça a suposição de que tal atitude teve como propósito apenas aumentar o cabide para pendurar maior número de apaniguados), nem prejuízo ao funcionamento dos gabinetes, fica patente pela desnecessidade em chamar os 85 concursados.
Quem propôs a multiplicação? É indispensável que se identifique o autor de tal despropósito e nem venha com a conversa fiada de que a multiplicação não resultou em aumento de despesas, pois isso não tem cabimento, salvo a possibilidade dos que foram contemplados jamais terem entrado na ALRN. Caso tenham 'frequentado', certamente, aumentou o custeio.
A multiplicação, aparentemente, teve como objetivo ampliar o número de indicações políticas (imoral) e foi praticada, num cenário de desproporção entre efetivos e comissionados, ao arrepio da exigência do concurso público como regra geral (ilegal). 
Medidas como o controle da presença através do ponto eletrônico vão depender das sugestões a serem feitas pela FGV. “Eu quero esperar esse trabalho que a Fundação vai fazer e a gente vai rever valores, rever cargos, redimensionar, rever o tamanho e no futuro ver o que a gente pode diminuir”, referenda. “Há uma necessidade de enxugamento diante da realidade que a gente vive. Nós vamos continuar caminhando para isso”.

Comento: o presidente demonstra que o "planejamento estratégico" tão propalado não é capaz de sugerir o caminho para controle dos servidores. Digo a "excelência", pois pago a conta, que bastaria informar o local de lotação de cada servidor.
Repito: a transferência de responsabilidade para uma consultoria externa, por mais competente que seja, não mudará a cultura patrimonialista.
Parece que a "consonância com a sociedade" é só até a página um. Pura retórica.
Dizem que o presidente quer se candidatar ao senado e já mira o exemplo que Sarney deu. Futuro brilhante, né?
Os casos de cerca de 280 servidores efetivados depois da Constituição de 1988, ilegais do ponto de vista constitucional, estão judicializados e, por isso, Ezequiel Ferreira disse que não pode tomar nenhuma medida. “A Assembleia está aguardando o final desse processo, mas uma coisa você fique certo: decisão judicial cumpre-se. Na hora que a Assembleia tiver a confirmação de que está ilegal, esses servidores serão desligados da Assembleia”, afirmou.

Comento: mais retórica. Ezequiel sabe que o "final do processo" ainda não é visível. Além de ser obediente e fiel cumpridor de decisões judiciais (o que é bom, pois evita a prisão) poderia demonstrar mais apego a legislação que trata sobre concurso público.  
Sobre os fantasmas, o presidente da Assembleia diz que já constituiu uma comissão para averiguar  caso a caso. “Algumas medidas adotamos desde o ano passado”, avisa e divide a responsabilidade com a Mesa Diretora e os demais deputados. “Eu tenho tido um novo momento. E neste novo momento precisamos fazer correções de rumos. O que tiver certo fica certo; o que precisar ser ajustado, será ajustado.

Comento: Ezequiel, mesmo num "novo momento", não concebe punições para quem descumpriu a legislação e não é capaz de afirmar que buscará o ressarcimento do erário. Acredita que o descalabro precisa "ser ajustado". Entendo. 

Sou exigente, mas reconheço que não se muda a índole.

NOVO JORNAL
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Parece adequado:

"Determinar o que é certo ou errado é quase impossível sem estar dentro da situação, sem ver todas as variáveis que podem influenciar a decisão, mas questionar é um dever cívico. É um exercício de cidadania e de respeito a si próprio e à sociedade em que vivemos. Em linhas gerais, Sandel (Michael Sandel - Universidade de Harvard) afirma que se precisarmos escolher entre falar ou não falar é melhor optarmos pelo primeiro. O não falar dá espaço para ideologias e dogmas. Engessa as escolhas. Cria frases como “sempre foi assim”, “as coisas são desse jeito”, etc. Ao fazer isso, abre caminho para abusos de poder, abusos morais, para uma compreensão que as instituições que temos são as únicas possíveis e restringe nossa capacidade de pensar novas soluções para a vida em sociedade. A busca, como bem diz Sandel, é coletiva, mas depende do esforço individual. Somos mais do que consumidores ou eleitores. Somos mais do que reféns de situações intransponíveis. Somos humanos." (Rodrigo Bodstein)

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