PUBLICADO EM 23-02-2019
Que caminhos nos tinham levado ao subdesenvolvimento? Os mais de três
séculos de regime escravista? A incapacidade de nos inserirmos no processo de
industrialização do século XIX? Ainda nos anos 1930, nossas classes dirigentes
defendiam uma economia “essencialmente agrícola”. E em meados dos anos 50,
gerava acalorada polêmica o debate sobre como industrializar o Brasil. Não é
supérfluo lembrar que, nesse momento, a maioria dos nossos economistas criavam
obstáculos à formulação de uma política de industrialização, tendo aliás fortes
apoios externos para essa doutrina.
Já na época, convencido de que a classe industrial nascente podia assumir
um papel histórico, me pus a trabalhar os instrumentos capazes de lhe facilitar a
tarefa. Destes, cito a introdução, entre nós, das técnicas de planejamento de base
macroeconômica, elaboradas na CEPAL por uma equipe dirigida por mim, e que
inspirariam tanto o Plano de Metas de JK como, anos depois, o Plano Trienal que
me coube elaborar durante o governo do presidente João Goulart.
Cedo percebi que o subdesenvolvimento requeria um esforço específico de
teorização, e assim elaborei o que mais tarde ficou conhecido como teoria do
subdesenvolvimento. Com efeito, o subdesenvolvimento é um processo histórico
autônomo. Não é uma etapa pela qual passaram as economias que já alcançaram
grau superior de desenvolvimento. É uma forma perversa de crescimento.
Com o crescimento econômico eleva-se a renda da população. Com a
modernização, adotam-se novas formas de vida, imitadas de outras sociedades que,
estas sim, beneficiam-se de autêntica elevação da produtividade física. Mas só o
desenvolvimento propriamente dito é capaz de fazer do homem um elemento de
transformação, passível de agir tanto sobre a sociedade como sobre si mesmo, e de
realizar suas potencialidades. Daí que a reflexão sobre o desenvolvimento traga em
si mesma uma teoria do ser humano, uma antropologia filosófica.
Hoje o Brasil tem uma renda dez vezes superior à renda da época em que
comecei a refletir sobre o nosso subdesenvolvimento. Nem por isso diminuíram as
desigualdades sociais; nem por isso fomos bem sucedidos no combate à pobreza e
à miséria. Cabe, pois, a pergunta: o Brasil se desenvolveu? A resposta, infelizmente,
é não. O Brasil cresceu. Modernizou-se. Mas o verdadeiro desenvolvimento só
ocorre quando beneficia o conjunto da sociedade, o que não se viu no país.
Hoje eu faria uma reflexão complementar sobre esse paradoxo, que não é
exclusivo ao Brasil, de vivermos uma época de grande enriquecimento da
humanidade e, ao mesmo tempo, de agravação da miséria de uma ampla maioria. O
que se segue é o fruto de minhas indagações recentes sobre o que chamarei de
“Metamorfoses do capitalismo”.
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