DO G1-RN
Cargos
fantasmas serviam para comprar deputados na Assembleia Legislativa do RN, diz
delatora
Os presidentes da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte usaram os
cargos da Casa para comprar apoio dos deputados estaduais em votações de
interesse próprio. O esquema teria acontecido entre 2006 e 2015. Isso é o que
diz a ex-procuradora-geral da Casa, Rita das Mercês Reinaldo, que fechou acordo
de delação premiada com o Ministério Público e deverá repetir as mesmas
informações em depoimento à Justiça, marcado para o fim deste mês. O G1 teve acesso à delação nesta semana.
O acordo de delação foi fechado em decorrência da Operação Dama de
Espadas, deflagrada pelo Ministério Público em agosto de 2015. A investigação
abrange as administrações do deputado Ricardo Motta e também do governador
Robinson Faria, quando eles estavam na presidência da Casa Legislativa do
Estado.
O G1 procurou o advogado de Robinson Faria, mas não
conseguiu contato. No entanto, a assessoria de Comunicação do Governo do Estado
enviou nota, em que diz que “O Governo do RN não irá se pronunciar sobre temas
relacionados à operação Dama de Espadas, por se tratar de assunto já explicado
à exaustão ao longo dos últimos três anos, de âmbito pessoal e anterior ao
cargo de governador”
Os advogados de Ricardo Motta disseram que o deputado vai se manifestar
nos autos do processo, e que “a delação não trouxe nenhum elemento novo de
prova e que será comprovado que não houve nenhum dos fatos ali narrados e que a
simples palavra do colaborador deve ser provada de forma cabal e não apenas por
presunção”.
A delação foi homologada pelo ministro Edson Fachin, e o processo corre
no Supremo Tribunal Federal (STF), porque há investigados que têm foro
privilegiado.
Em seu depoimento, Rita das Mercês afirmou que todos os deputados sabiam
do esquema. “O esquema, todos os deputados sabiam de como era a questão dos
laranjas, dos fantasmas, porque isso é público e notório diante da Assembleia
que o gabinete, que é mínimo, não cabe 60, 70 pessoas indicadas pelo deputado”,
declarou.
Além
de deputados, segundo a ex-procuradora, cargos foram ocupados por indicação de
desembargadores do Tribunal de Justiça do RN, conselheiros do Tribunal de
Contas, ex-governadores, deputados federais e senadores, além de prefeitos e
vereadores de Natal e de cidades do interior, que também se beneficiariam
financeiramente.
A maior parte dos cargos ficava com os deputados
estaduais em exercício. “Geralmente, quando tinha uma votação de interesse do
presidente, as vezes do Executivo, alguns deputados negociavam não eram nem
cargos, eram valores que eram distribuídos em cargos. O deputado dizia: eu
preciso de mais R$ 30 mil. Então esses R$ 30 mil eram distribuídos em cargos
comissionados, gratificações”, afirmou Rita das Mercês.
De acordo com Rita, as vagas pertenciam à estrutura
organizacional da Assembleia e eram negociadas pelo presidente de acordo com a
“necessidade”. “Com Robinson aconteceu várias vezes, essas negociações. Tanto
na reeleição quanto nas aprovações de projeto de lei. Mas aparecia mais essas
negociações quando da reeleição do cargo para presidente. Ele foi presidente
quatro vezes”, ressaltou. “Sempre que havia eleição para presidente, era uma
nova negociação com os deputados”.
Ainda conforme a delação de Rita das Mercês, após as
nomeações dos servidores ela recebia as informações para alimentar uma planilha
com os nomes dos “fantasmas” e quem os tinha indicado. Em alguns casos, porém,
ela afirma que não era possível saber quem era o autor da indicação. A planilha
foi entregue pela delatora aos procuradores do Ministério Público.
“A coordenadoria de Recursos Humanos fazia os atos, as
portarias, e depois ela me informava, porque o presidente, quando necessitava
saber quanto um deputado tinha... Por exemplo, o deputado fulano de tal exigia
mais dinheiro. Ai o presidente precisava saber quanto o deputado já tinha em
folha. A gente tinha que informar”, disse.
Judiciário na delação
Nas planilhas de Rita das Mercês
não constam nomes apenas de deputados. Desembargadores do Tribunal de Justiça
do Rio Grande do Norte, magistrados que ocupam o mais alto cargo do judiciário
estadual, também estariam envolvidos na indicação de servidores fantasmas do
Poder Legislativo. Em contrapartida, deputados também indicavam pessoas para
cargos no Judiciário, de acordo com a delatora.
Pelo
menos oito dos 15 desembargadores ativos e dois aposentados contavam com cargos
no Legislativo. Conforme Rita das Mercês, parte dos servidores indicados pelos
magistrados trabalhava no Legislativo. Outros não. Questionada pelo MP sobre o
motivo dessas indicações, Rita afirmou que acreditava ser para manter um “bom
relacionamento com os representantes do Poder Judiciário do Estado”.
Deputados com cargos na Justiça
Da mesma forma que desembargadores
teriam feito pedidos aos deputados para inclusão de pessoas ligadas a eles na
folha de pessoal da Assembleia, parlamentares teriam feito indicações para
cargos no Tribunal de Justiça. A delatora afirmou que ouviu falar de indicações
de deputados, mas confirmou apenas uma de que tinha conhecimento.
De acordo com Rita, ela indicou uma neta por sugestão do
deputado Ricardo Motta (PSB). Porém, houve uma condição: metade do salário
ficaria com o próprio deputado. “Ele chegou na minha sala, disse que tinha um
cargo e se eu tinha alguém para indicar, por que ele não tinha de nível
superior. E eu falei que tinha uma neta e indiquei. Ele disse que a metade do
salário era dele”, disse aos investigadores.
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