terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

A arca de Noé


Um dia Absalão andava pela ravina, quando de repente – “PUFF” – uma nuvem de fumaça apareceu, acompanhada de uma voz poderosa – “ABSALÃO”. Prostou-se então apavorado. Só podia ser o Criador, pensou. E era. Em pessoa!

“ABSALÃO” – voltou a voz – “Não estou contente com os homens. Farei chover até cobrir a terra de água. Vá e construa um barco para você e sua família. Você terá 4 meses para esse empreendimento”.

Absalão levantou-se lívido. Rebuscando a memória, lembrou-se que conhecia um engenheiro naval chamado Noé, que poderia construir o barco. Logo o encontrou e lhe disse:

– “Meu caro,  quero encomendar um barco... e dos grandes!”

– “Sim, senhor. Mas qual o tipo, para qual carga, para que navegação?”

– “Ora, isso são detalhes. Isso não é da sua conta. Faça apenas seu serviço. Combinado?”

– “Combinado, senhor Presidente, o barco é seu e quem manda é o senhor” –  retrucou Noé, dando de ombros – “Tão logo tenhamos os carpinteiros iniciarei o trabalho.”

– “Puxa, eu não tinha pensado nisso” – disse Absalão – “É preciso selecionar bem estes homens. Meu amigo Roboão é especialista em seleção, vou chamá-lo”.

O 2o dia amanheceu tranqüilo e claro. O Presidente foi acordado por Roboão com boas notícias: “Chefe, já contratei 5 recrutadores e 10 examinadores para a fase de seleção.

O empreendimento crescia de vento em popa. Absalão, com seu habitual dinamismo, logo adquiriu uma cabana para instalar o pessoal, com divisórias e tapetes, e formou uma equipe de segurança e zeladoria.

– “Senhor Presidente” – falou timidamente a recepcionista, no 20º dia de trabalho – “Está aqui o Dr. Noé com alguns desenhos e parece aflito para falar com o senhor...”

– “Este Noé está sempre me perturbando, exigindo decisões imediatas sobre assuntos de grande complexidade Diga a ele que nomearei um grupo de trabalho, o GT-BAR, para me dar um parecer.

Quinze dias se passaram e o organograma já estava na mesa do Presidente, com uma Diretoria das Coisas (DC), uma dos Investimentos (DI) e uma do Barco (DB). O total de empregados já alcançava 500 pessoas. Tudo parecia correr bem. Apenas Noé insistia em fazer cobranças a Absalão.

– “Roboão, não quero incomodá-lo” – disse Absalão – “Mas Noé me disse que ainda não foram contratados os carpinteiros para o corte.”

– “Ora chefe. Noé é um sonhador, não entende as dificuldades envolvidas em um trabalho bem feito. Todos os que se apresentaram foram reprovados no exame psicotécnico. Como poderíamos trabalhar com pessoas inadequadas?”

– “Tem razão, Roboão. Noé desconhece o que é uma boa organização.”

Na noite do 40º dia Absalão estava cansado, mas não pôde esquivar-se de receber Noé em sua residência.

– “Sr. Presidente, desculpe-me interromper o seu descanso mas o projeto já está pronto e as pessoas do GT-BAR ainda não foram nomeadas. Faltam também... ”

– “Não se preocupe Noé. Falarei com o DB e apressarei a contratação do pessoal. Você sabe, apesar de ser o Presidente, não posso mudar as normas da organização. Se o fizesse não precisaria delas. Da chefia vem o exemplo do cumprimento de normas. Não se preocupe que o empreendimento está nas mãos de profissionais, e dos melhores! Boa noite Noé!...”

No 80o dia Absalão passeava pela ravina. Estava orgulhoso. Era presidente de um empreendimento que já contava com 1.200 pessoas. Subitamente – “PUFF” – uma nuvem de fumaça. Ouviu-se então uma voz que dizia: “Absalão ponha gente de mais peso no topo, caso contrário o empreendimento afundará”

Absalão correu à cabana de Noé:

– “Noé, Noé, ponha um convés no alto do mastro. Vou colocar as pessoas mais pesadas em cima.”

– “Mas Presidente, isso é impossível. Sempre o convés é embaixo e o mastro aponta para cima. Se aumentarmos a massa no topo, o barco vai emborcar.”

– “Não discuta, a orientação agora é comigo, Noé. Recebi ordens superiores de colocar homens mais pesados no topo e é isso que vou fazer. Cumpra minhas ordens!”

Noé não retrucou. O Presidente estava nervoso! Balançando a cabeça, retirou-se vagarosamente. Estava acabrunhado e sentia-se um incompetente. Mas, o que estaria errado?

No 90o dia, Gau adentra a sala do Presidente: – “Chefe, tenho aqui um relatório indicando que há desvio de cipós de amarração no almoxarifado. A listagem do computador não bate com a da Auditoria...”

– “Que inferno, Gau! Coloque a sua equipe em campo. Jacob está fora de suspeita por ser meu amigo e companheiro de trabalho. Verifique o pessoal da carpintaria.”

No 110o dia houve nova reunião da Diretoria.

– “Senhores...” – falou gravemente o Presidente – “A situação do empreendimento é razoável, mas temos que tomar uma atitude mais séria quanto ao projeto do barco, que não está andando”

– “Desculpe, Presidente” – falou o DC – “mas acho que o problema está com esse tal de Noé. Nos nossos arquivos não constam os exames de admissão dele e nem sabemos se é mesmo engenheiro naval”.

– “Sim, a culpa é minha” – retrucou Absalão – “Mas quando contratei Noé ainda não existiam as normas do empreendimento.”

 – “Tudo era muito improvisado naqueles dias, Sr. Presidente” – acrescentou o DI – “a culpa não é sua. Este Noé é um oportunista sem escrúpulos, querendo se passar por engenheiro naval sem ter freqüentado nenhum curso regular.”

Todos concordaram com o DI e fizeram ácidas críticas a Noé. Absalão por fim decidiu: Ele seria despedido!

Noé  ficou furioso com a notificação. Nem exigiu a fração do 13o salário que lhe cabia. Estava disposto a sair daquela terra e o caminho mais fácil era pelo rio. Partiu para a floresta e reuniu 5 companheiros.

– “Amigos, vamos cortar estas árvores, construir um barco e sair daqui”

– “Mas Noé, não somos carpinteiros e não sabemos construir barcos!”

– “Não importa. Ensinarei a cortar madeira e já tenho os desenhos. Faremos uma equipe motivada com o objetivo de construir um barco para uma vida melhor em outras terras. Levaremos uns bichos a bordo para comermos na viagem. Só falta meter a mão na obra.”

No 120o dia Absalão acordou preocupado. Chegando ao empreendimento, encontrou a sede praticamente vazia. Foi informado por Gau que os funcionários estavam em greve pela aprovação de um Plano de Cargos e Salários.

Absalão correu ao telex, mandando a seguinte mensagem a Deus: “Senhor Criador. Dificuldades insuperáveis com o projetista atrasaram o empreendimento. Solicito prorrogação do prazo”. A resposta foi imediata: “Prorrogação negada”.

E começou a chover. Absalão correu para fora, seguido de Job. A chuva estava cada vez mais forte, começando as águas a inundar tudo. Job gritou:

– “Chefe, há um barco descendo o rio. Veja, na proa está escrito “Arca de Noé”.


Fonte
A ARCA de Noé. [S.l.: s.n.].

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