Tomada pelo rol de apoiadores, a CPI do Cachoeira é um empreendimeto
inédito. Não tem opositores. No gogó, todos os partidos apoiam. Dilma
Rousseff absteve-se de barrar. Lula empurrou o PT para dentro do
requerimento. FHC disse que a coisa é necessária. Formou-se uma
estonteante unanimidade.
Tomada pela lista de implicados, a nova CPI é uma dessas iniciativas
cujo risco de dar certo é quase nulo. O enredo é 100% feito de bandidos e
suspeitos. Falta mocinho no palco. Algo que potencializa as chances de a
platéia ser feita, uma vez mais, de boba.
A instalação da CPI está marcada para esta quarta (25). Vencida a
fase inaugural, vai começar o conhecido teatro de depoimentos arrastados
e inquirições precárias. A imprensa, como de hábito, fornecerá os
holofotes. Os congressistas, como sempre, proverão as diatribes.
Haverá, porém, uma diferença. Na CPI do Collorgate, o PT fez as vezes
de polícia e o governo de ladrão. Na CPI dos Correios, que desaguou no
mensalão, o PSDB e o ex-PFL eram a polícia. O PT, o governo Lula e a
base cooptada, os ladrões. Carlinhos Cachoeira realizou um feito:
integrou as pseudo-diferenças.
O ritual de emporcalhamento revelado nas páginas dos inquéritos da
Polícia Federal aniquilou as individualidades. O que não deixa de ser
uma forma de assegurar a fidelidade ao grupo pela cumplicidade.
Igualados em abjeção, os protagonistas da CPI talvez não se animem a
ameaçar a integridade do todo com a alegação de que são diferentes.
Cachoeira produziu uma legião de inocentes culpados. Ou culpados
inocentes, conforme o ponto de vista. O PT de Agnelo, o PSDB de Marconi,
o DEM de Demóstenes… Quem haverá de posar de herói da resistência? O
PMDB de Renan e Sarney? Sem chance!
Há um quê de novidade buslesca no Cachoeiragate. No impeachment,
Pedro Collor detonou a sociedade PC Farias-Fernando Collor. No mensalão,
Roberto Jefferson chutou a mala. Servindo-se do noticiário, as CPIs
processaram as informações. Agora, a CPI não nasce do zero. Há dois
inquéritos concluídos. Estão apinhados de dados recolhidos em duas
operações policiais: Vegas e Monte Carlo.
Os grampos soam no noticiário em ritmo diário. Quem ouve os diálogos
vadios fica com a incômoda sensação de que Cachoeira converteu seus
parceiros numa espécie de vanguarda do mundo da extorsão e do tráfico de
influência. A quadrilha como que desvenda os crimes cometendo-os com
desalinho.
Desatentos aos detalhes, os comparsas de Cachoeira denunciam a
própria perversão errando numa profusão que faz envelhecer os métodos
clássicos. Os ingredientes estão todos lá: a empreiteira, os laranjas,
as obras, o por fora, as arcas de campanha, o enriquecimento ilícito, a
espionagem e um interminável etcétera. Tudo isso sob o comando de um
bicheiro caipira que esqueceu de maneirar.
Cachoeira não é um desconhecido. Tornou-se figura nacional em 2004,
quando estrelou a autofilmagem coadjuvada por Waldomiro Diniz. O replay
ampliado justifica uma CPI. A pressa de Dilma em vacinar o governo com
um processo que pode levar a Delta a ser declarada inidônea com pelo
menos dois anos de atraso justifica qualquer apuração.
Porém, os atores
da CPI estão condenados a atuar contra um pano de fundo encharcado de
esquisitices. Os refletores se acenderão. Muitos aproveitarão a
luminosidade para encher seus balões. Mas terão de ficar atentos para
não ultrapassar o ponto da ruptura –aquele instante exato em que o balão
estoura na cara de quem assopra.
Por vezes, o momento que antecede o estouro só é descoberto quando já
é tarde demais. Assim, as luzes talvez se apaguem antes do derradeiro
halite. Alguém vai perguntar: não seria mais seguro parar com esses
malditos balões? É nessa hora que costumam ser ligados os fornos que
assam os grandes acordos. Se algo tem que estourar, que seja o saco da
platéia.
blog do Josias
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