terça-feira, 8 de maio de 2012

A Crise das Instituições, por Eduardo Ferrão

Fala-se muito em crise das instituições .

Na verdade, a crise é tópica e conceitual, na seara dos serviços públicos.

Todas as concepções político-ideológicas de estado , sejam liberais, conservadoras, totalitárias ou até mesmo fundamentalistas, convergem no sentido da busca do bem-estar coletivo, com maior ou menor expressão dos chamados direitos fundamentais.

Como estado é uma noção política,  fruto de abstrações jurídico-filosóficas , sua atuação é dimensionada pelo desempenho dos respectivos agentes. Não importa a natureza do cargo ou função, nem a forma de investidura. Seja mandato eletivo, seja cargo, haja ou não vitaliciedade.

Todos, absolutamente todos, existem para servir ao cidadão, que, aliás, os legitima na origem.

E é exatamente na falta de conscientização do principio ético-político que viceja a apontada crise.

Há uma brutal inversão axiológica de instrumentos e mecanismos estatais, por parte de seus operadores.

É o burocrata maltratando o usuário dos serviços públicos, expondo-o a constrangimentos e humilhações no atendimento. Carimbos, senhas, filas, repartições, setores, departamentos, diretores, supervisores, chefes, subchefes, vice-chefes, crachás,  ordens de serviço, despachos e outros signos infernais, tudo em ambiente manifestamente hostil ao cidadão maltratado.

Age o barnabé  como se prestasse um favor, quando, na  verdade, cumpre um dever.

É o profissional da saúde pública tratando os  pacientes como animais ou, na melhor das hipóteses, como um número a ser adicionado em sua planilha de desempenho . Sem a menor preocupação com a eficácia do tratamento , quando prescrito.  Tudo sob o pretexto da baixa remuneração e das más condições de trabalho.

É o policial, arbitrário e truculento, fazendo de delegacias, postos ou viaturas verdadeiros circos de horrores para os cidadãos que demandam por segurança .

É o magistrado, que vê no ato jurisdicional e nas liturgias pertinentes fatores de demonstração de poder e de afirmação social.

Atender pessoalmente ao jurisdicionado – seu verdadeiro patrão, na concepção democrática de Estado -  com educação e presteza,  somente quando o humor o permitir e nos raros espaços de uma agenda congestionada por “outros compromissos” e por  viagens acadêmico-recreativas .

É o parlamentar fazendo do mandato uma alavanca de satisfação de interesses pessoais ou de mera afirmação político-eleitoral perante feudos , setores econômicos ou corporações.

É o ministro de estado, cercado de uma corja de companheiros ou  correligionários , direcionando as verbas mais  expressivas  para seu reduto eleitoral, embora outras regiões do país  estejam a demandar mais urgência em seus pleitos naquele ministério.

São apenas alguns exemplos da derrocada moral de nosso serviço público. Há exceções, é verdade. Raras, mas há. E, como toda exceção, permanece sufocada pela generalidade da regra.

Lamentavelmente, numa dramática deturpação institucional, os agentes públicos querem mesmo é ser autoridade. De preferência com veículo oficial, estacionamento e elevador privativos; assessores, diversos, para lhes servir de anteparo ao público ou para lhes compensar deficiências, inapetências e inoperâncias. Mais um auxílio-moradia perfeitamente cumulável com o “auxílio-habitação”, mais quintos, sextos, sétimos e oitavos, neste “teto” repleto de chaminés. Sem falar no indefectível passaporte diplomático, que lhes permite fugir de filas e constrangimentos a que são submetidos os viajantes humanos e mortais.

Ou se esboça uma reação forte e imediata – tipo “pé na porta” e um grito de “basta !” – a isso tudo, ou se assiste passivamente a agonia  de uma república  de “pacatos cidadãos”. A quem, ainda não se sabe, se chamar a atenção foi à toa, ou não.


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