Ricardo Araújo, Isaac Lira, Júlio Pinheiro, Marco Carvalho e Maria da Guia Dantas - repórteres
O Consórcio Inspar gastou milhões de reais para poder elaborar e aprovar a lei que instituiria a inspeção veicular no Rio Grande do Norte, além dos editais e outros documentos necessários à implantação da medida.
Essa quantia foi dividida em repasses para políticos com mandato na Assembléia Legislativa, com pessoas próximas ao círculo de decisões e integrantes do Governo Estadual.
Os detalhes dos acertos e dos pagamentos foram apresentados pelo empresário paulista Alcides Fernandes Barbosa no depoimento da delação premiada, acertada com o Ministério Público Estadual no início do mês de abril.
Reprodução
Alcides Fernandes Barbosa deu seu depoimento dentro do programa de delação premiada
Foram dois depoimentos aos promotores de Defesa do Patrimônio Público. O primeiro no dia 2 de abril e outro no dia seguinte. Do amontoado de informações gravadas em vídeo (a TRIBUNA DO NORTE teve acesso à cópia integral) sobre todo o esquema posto em funcionamento pela Inspar, sobressaem acusações contra o senador José Agripino Maia; os ex-governadores Wilma de Faria e Iberê Ferreira; o deputado estadual Ezequiel Ferreira; o ex-diretor geral do Detran/RN, Érico Vallério Ferreira de Souza, além de Lauro Maia, filho de Wilma de Faria.
Para articular politicamente com a então governadora Wilma de Faria, a
viabilidade e necessidade da implantação da inspeção veicular
obrigatória no estado, Lauro Maia recebia mensalmente R$ 10 mil. Os
recursos eram repassados por George Olímpio através dos lucros auferidos
na Central de Registros de Contratos, (CRC), que funcionava como uma
espécie de cartório para autenticação de todos os processos que
envolviam veículos financiados, em transferência ou alienados
fiduciariamente.
Entretanto, a inspeção veicular precisaria ser
aprovada pela Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte para ser,
de fato, implementada. Para isto, era preciso criar um conjunto de
normas com embasamento na Resolução nº 418/2009 do Conselho Nacional do
Meio Ambiente (Conama).
A confecção do projeto da Lei Estadual nº 9.270/2009 ficou a cargo de Luiz Antônio Tavolaro, ex- procurador-geral de São José do Rio Preto. Para viabilizar o encaminhamento do projeto à Assembleia Legislativa, o empresário George Olímpio teria garantido o repasse mensal de 15% dos lucros do Consórcio Inspar, quando este entrasse em funcionamento, à então governadora Wilma de Faria.
No
Legislativo, a articulação entre os parlamentares para a aprovação do
projeto de lei coube ao deputado estadual Ezequiel Ferreira, primo em
segundo grau do ex-governador Iberê Ferreira de Souza. Pela suposta
ajuda aos empresários sócios do Consórcio Inspar, ele recebeu R$ 300
mil, segundo alegou Alcides Fernandes Barbosa em sua delação premiada.
Por unanimidade, a lei foi aprovada no dia 15 de dezembro de 2009 e sancionada pela ex-chefe do Executivo Estadual, Wilma de Faria, através do Decreto nº 21.542 de 24 de fevereiro de 2010.
Com a mudança
de governo, porém, George Olímpio recorreu ao ex-governador Iberê
Ferreira de Souza com o intuito de garantir o andamento do processo,
ainda em 2010. Para isto, efetuou o repasse de R$ 1 milhão ao
ex-governador. Além disso, teria garantido o pagamento de 15% dos lucros
da concessionária.
Já em 2011, com a saída de Iberê e entrada de Rosalba Ciarlini no Governo, George Olímpio procurou o então diretor-geral do Detran/RN, Érico Vallério. Em um acordo, ele aceitou receber R$ 50 mil mensais para manter o esquema. No depoimento, Alcides Barbosa assegurou aos promotores que tem como comprovar todas as afirmações feitas.
Projeto da Inspar foi aprovado sem discussão na AL
O
deputado estadual Ezequiel Ferreira de Souza (PTB) foi citado por
Alcides Barbosa como sendo o articulador junto aos parlamentares da
Assembleia Legislativa (AL) para que o projeto fosse aprovado com
rapidez e sem sobressaltos. Ezequiel teria recebido em troca R$ 300 mil,
segundo o lobista.
Na delação premiada não foram apresentadas provas materiais sobre a suposta participação do petebista no esquema, mas de qualquer maneira o projeto foi apreciado no legislativo por dispensa de tramitação e em um tempo expressivamente rápido. As atas que detalham os expedientes da AL revelaram que a matéria foi lida em plenário no dia 2 de dezembro e 13 dias depois já estava aprovada, com a anuência dos 22 deputados presentes na sessão. Somente Álvaro Dias e Lavoisier Maia, ambos ausentes, deixaram de opinar sobre o assunto.
O projeto que
dispõe sobre o programa de inspeção e manutenção veicular foi avalizado
pelos parlamentares na mesma sessão onde deputados do governo e
oposição trocavam insultos em virtude de uma suposta manobra na votação
do Orçamento Geral do Estado, cujas atenções estavam especialmente
voltadas naquele dia. Essa discussão ofuscou os demais projetos postos
em votação. E não foram poucos. Mais de doze no total.
Ainda
assim, o deputado José Dias, então no PMDB, destacou que era necessário
retirar do projeto o artigo que dava à concessionária vencedora da
licitação o direito de cobrança das inspeções realizadas e que estas
deveriam ser feitas pelo Poder Público.
O posicionamento do parlamentar veio a ser o mesmo do Ministério Público, posteriormente, quando apontou vícios no projeto e claros sinais de corrupção. A ponderação de José Dias foi acompanhada pelos deputados Getúlio Rêgo (DEM), Paulo Davim (PV), Luiz Almir (PV), José Adécio (DEM) e Fernando Mineiro (PT), mas acabou prejudicada. Na ocasião os seis parlamentares demonstraram preocupação com as consequências da execução do projeto.
Delação foi motivada por ameaças
Alcides
Fernandes Barbosa esteve disposto a colaborar com a investigação do
Ministério Público Estadual e delatar o esquema desde o momento em que
foi preso. É o que fica claro a partir do depoimento aos promotores do
Patrimônio Público no momento da delação premiada. O lobista só não
delatou a fraude desde o primeiro momento, segundo conta nas imagens as
quais a TRIBUNA DO NORTE teve acesso, porque foi ameaçado de morte.
No
depoimento ao MPE, Alcides conta que foi ameaçado pelos próprios
advogados que deveriam defendê-lo. "Desde o primeiro dia em que fui
preso tive esse interesse", diz, se referindo a delação premiada. Após
comunicar esse desejo aos advogados do caso Carlos Krug e Luís
Trindade, Alcides recebeu uma carta, escrita pela esposa, afirmando que
toda a família corria risco de vida. "Foi aquele terror. Ele (o advogado
Luís Trindade) chegou com uma carta com a letra de minha esposa,
dizendo que eu corria risco de vida, que o Krug estava em Natal, que a
coisa estava feia, que iam me matar, que meus filhos corriam risco de
vida".
O advogado paulista Luís Trindade teria dito para a esposa
de Alcides, em outra oportunidade, que "quem fala muito pode sofrer um
acidente na rua". Também foram relatadas ligações anônimas para a casa
do lobista com ameaças de morte. As ameaças, segundo Alcides,
potencializaram o desejo de fazer a delação premiada.
O papel dele no esquema era intermediar o contato entre o grupo de São Paulo e o do Rio Grande do Norte. Alcides ganhou o papel de intermediador pela proximidade com amigos do suplente do senador José Agripino e o ex-subchefe do Gabinete Civil da Prefeitura de São Paulo, João Faustino. Faustino teria sido o responsável por aproximar George Olímpio e Alcides Fernandes.
Doação de R$ 1 milhão a Agripino volta a ser citada
O
senador José Agripino (DEM) voltou a ser citado como beneficiado por
uma suposta "doação de campanha" no valor de R$ 1 milhão pelo grupo
Inspar, no depoimento de Alcides Fernandes Barbosa.
A doação e o valor já tinham sido citados - e desmentidos - em depoimento do empresário José Gilmar, o "Gilmar da Montana", também denunciado no processo da Sinal Fechado.
Alcides Barbosa, nas citações que faz sobre o
senador José Agripino, basicamente repete o que havia sido dito pelo
empresário: durante encontro na casa do senador, o advogado George
Olimpio teria prometido doar R$ 1 milhão para a campanha do senador do
DEM, em 2010, esperando garantir o projeto da inspeção veicular já
negociado com o governo Wilma/Iberê.
Mas, há detalhes diferentes: Gilmar disse que a doação teria sido feita, mas desmentiu tudo em um segundo depoimento aos promotores. Alcides detalha os acertos para a doação e cita intermediários.
Verbalmente, no depoimento da delação
premiada, Alcides afirma que a doação foi acertada em encontro com José
Agripino, João Faustino e George Olímpio, no apartamento do senador do
Democratas, em Natal.
Na conversa, George teria dito, de acordo com Alcides, que estava disposto a colaborar com a campanha, mas que não tinha a quantia de R$ 1 milhão disponível naquele momento, a menos de 15 dias para a eleição.
Pouco depois, teria chegado ao apartamento o ex-senador José Bezerra Júnior, o "Ximbica", chamado para viabilizar a doação. Ele repassaria o dinheiro ao senador e ficaria com quatro cheques de R$ 250 mil para começar a serem descontados em janeiro de 2011.
Júnior Santos
George Olímpio seria o responsável por repassar lucros para os envolvidos, mensalmente
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