sábado, 18 de agosto de 2012

A abordagem da Economia dos Custos de Transação


Integração vertical


Vários autores como Coase (1937), Chandler (1962), Arrow (1969), Williamson (1989) e Simon (1987) têm discutido a respeito da importância da abordagem da Economia dos Custos de Transação no que se refere às relações mercantis interfirmas. A necessidade de criação de formas organizacionais específicas tem propensão de vincular-se às estratégias competitivas e com estruturas subjacentes de relações interfirmas distintas. Dessa forma, a principal indagação que se faz nessa situação está baseada no porquê das firmas se verticalizarem.

(...)

Existem várias formas de relações interfirmas que beneficiam as empresas detentoras dessa estratégia. Uma delas é a integração vertical ou quase-integração que pode ser interpretada como um instrumento de garantia da oferta de insumos e/ou da demanda por produtos, na medida que há redução do custo de produção interna e dos custos de transação. Assim, esse sistema possibilita a redução da dependência no que diz respeito à necessidade de requerer menos informações com o mercado – uncertainly of environment. Segundo Perry (1989) apud Dowell & Cavalcanti (1998), por meio de um acordo, a firma integradora não arca com os custos de acompanhamento do mercado, investigando fontes alternativas de insumos ou de escoamento da produção. Para entender a integração vertical pela Teoria de Custos de Transação (ECT), seria necessário primeiro conhecer as relações contratuais. No caso da atividade avícola as indústrias integradoras possuem o domínio sobre os produtores integrados. Para Shiki (1996) a dificuldade dos avicultores integrados em sair do negócio no final do contrato é dada por fatores como a falta de alternativas e de oportunidades mais rentáveis. Com isso, há uma tendência cada vez maior de que os pequenos e descapitalizados se tornem indiretamente excluídos, já que não conseguem aumentar nem a escala de produção, nem suas habilidades técnicas.

WILLIAMSON (1989) acredita que a tecnologia pode vir a determinar a organização econômica somente nos casos em que existir apenas uma tecnologia específica superior às demais e quando esta tecnologia envolver uma única forma de organização. Dessa forma, a integração raramente é justificada pela tecnologia, mas pela razão dela representar uma fonte de economia nos custos de transação. Essa justificativa revela uma das fortes críticas dos Neo-Schumpeterianos  – Teoria Evolucionista–  em relação à  – ECT – Teoria Institucional. (...)

A integração vertical, portanto, tenta atenuar as imperfeições do mercado e da informação, uma vez que o processo possui descontinuidades e assimetrias. Dessa forma, com a integração, a demanda por informações torna-se menor do que com o mercado, na medida que há uma gradativa substituição de relações externas pelas trocas internas.

Enfim, as características inerentes da integração vertical são justificadas pela intensa relação e coordenação de numa atividade produtiva entre firmas, partindo da premissa de que existe um ambiente totalmente incerto, permitindo atuação dos agentes por meio dos contratos.

Comportamento dos agentes

A ECT utiliza duas suposições de comportamento dos agentes, no nosso caso específico de estudo, os agentes envolvidos podem ser exemplificados, de um lado, como os produtores integrados e, do outro, como as agroindústrias integradoras. Os agentes podem assumir os seguintes comportamentos diante de um ambiente considerado incerto.

1 – A racionalidade restrita – bounded rationality - onde assume que todos os contratos, mesmo os mais complexos, tornam-se incompletos; e,
2 – O oportunismo – onde cada parte extrai as suas respectivas quase-rendasquasi-rents –, da outra parte pela ameaça de quebra do contrato, ou seja, os contratos como promessa que não são fixados em compromissos confiáveis, mas ingênuos (Dowell & Cavalcanti, 1998).

Assim, os custos de transação podem ser classificados de acordo com os contratos como os custos ex-ante de coleta e processamento de informações, de estruturação, de negociação, de estabelecimento de garantias e salvaguardas –formalizados em contratos ou não –, definindo o preço e a duração do contrato. São também os custos ex-post do desalinhamento, da sua renegociação e monitoramento, da adaptação a circunstâncias não previstas inicialmente (Hiratuka, 1997; Oliveira, 1998; Pondé, 1992).

 Sob a ótica da rigidez dos contratos, Paulilo (1990) enfatiza que o processo de integração entre os produtores e as indústrias de transformação, às vezes, se dá como um campo de forças que ocorre num ambiente de permanente conflito. Segundo ela o produtor integrado, mesmo como dono da terra, perde sua autonomia e torna-se vulnerável às exigências da indústria de transformação. Assim, a partir do contrato de parceria, o integrado transforma-se num dos componentes da cadeia produtiva da empresa processadora. Numa entrevista concedida a Revista Globo Rural, Furlan afirmou que a produção de frangos tornou-se com o tempo padronizada, onde os diversos elos da cadeia foram integrados, o número de transações reduzido, o que se promoveu uma economia de escala com baixos custos (Globo Rural/1999).

O contrato de parceria, portanto, torna-se um instrumento pelo qual a integradora e o produtor integrado se articulam para a produção de frangos de linhagens de alta produtividade. Este contrato tem valor jurídico e orienta os produtores em suas respectivas responsabilidades e na distribuição dos resultados econômicos finais. A empresa se compromete pelo fornecimento de matéria-prima – pintos, matrizes, reprodutores –, insumos – rações, vacinas e medicamentos – e assistência técnica; e o avicultor associado torna-se o responsável pela construção das instalações, equipamentos dos galpões e, também, pelo cuidado dispensado aos aviários (Shiki,6 1996; Matos & Shiki, 1996; Rizzi, 1993).

As satisfatórias experiências com o uso de mão-de-obra familiar no processo de integração na Região Sul – mais especificamente Paraná e Santa Catarina – deram suporte para a grande discussão sobre as características essenciais do perfil do produtor integrado. A maioria dos produtores que se integrara na produção suína era oriunda de famílias de agricultores que exerciam tradicionalmente essa atividade antes da introdução da suinocultura em padrões industriais. Dessa forma, eles mudaram seu método de criação e incorporaram um conjunto de inovações, em virtude dos contratos de integração – orais e escritos – introduzidos pelas agroindústrias (Brandenburg & Ferreira, 1995; Farina & Zylberzstajn, 1992). Através do sistema de integração, portanto, as agroindústrias de carne da Região Sul garantiram a oferta de matéria-prima para o abate, considerado como condição básica para o melhor funcionamento do setor

As mudanças estruturais na tecnologia de manejo tornaram-se um dos principais elementos da produção avícola, tornando mais seletivo os produtores pelo processo de contrato de integração, seja na avicultura, seja na suinocultura. A organização técnica e administrativa da produção cumprem as regras de um padrão tecnológico que resulta em qualidade e produtividade dentro de um mercado cada vez mais competitivo. Segundo Canever et al, 1997...

(...) o objetivo desse sistema é substituir gradativamente os equipamentos manuais por automáticos, até chegar à automatização e climatização totais dos aviários. Com o novo sistema, os avicultores pequenos que possuem instalações inadequadas e que não forem capazes de adequar aos novos padrões terão que deixar a atividade.

Portanto, as mudanças tecnológicas estruturais apontam para a viabilidade econômica somente daqueles produtores que apresentam possibilidades superiores de investimento, com maior uso de tecnologia e qualificação técnica, capazes de assegurar a reprodução da qualidade genética (Ipardes, 1990).

Ferreira et al. (1998) corroboram essa afirmação, alegando que um dos principais...

(...) determinantes na produção de frango é o capital de investimento para a construção do galpão e aquisição de equipamentos, o qual tem sido sempre maior, em razão do padrão de exigência das empresas integradoras. Tem-se, portanto, questionado sobre quais fatores estariam contribuindo para a redução de custos e para o aumento da produtividade por meio de adequações na escala de produção.

Dessa forma, as alianças estratégicas das integradoras com produtores mais capitalizados têm sido uma vantagem competitiva, à medida que há introdução de novas tecnologias em máquinas e equipamentos, elevando cada vez mais a produtividade avícola e reduzindo os custos de produção. Por outro lado, essa estratégia tende a reduzir o raio de manobra da empresa integradora sobre o integrado no que tange à elevação do comportamento oportunista entre os agentes.

As transações e os seus atributos

Coase (1937) e Williamson (1989), apontam a existência de outros elementos importantes da ECT, que são os determinantes das formas de transação. São eles: a)especificidade do ativo; b) incerteza e c) freqüência.

Para Dowell & Cavalcanti (1998), existe uma grande especificidade de ativos no investimento, que está relacionada com a noção de custos irrecuperáveis – sunk costs.

Logo, após a decisão de integrar-se, o produtor realiza o investimento inicial; caso ele venha se arrepender, entendendo que a margem de lucro foi muito pequena e, conseqüentemente, resolve sair do negócio, este produtor ficará preso ao investimento realizado, por causa da especificidade dos ativos – assets specificity. As especificidades dos ativos podem ser classificadas em várias categorias (Siffert F.,1995)...
·        especificidade espacial;
·        especificidade dos ativos físicos;
·        especificidade dos ativos humanos;
·        especificidade da marca.

A especificidade dos ativos, portanto, está relacionada ao fator flexibilidade. No caso da integração animal - atividade avícola –, a flexibilidade é muito reduzida por impossibilitar o escoamento da produção para outros fins. Ou seja, a quase inexistência de alternativas da utilização da granja - seja pela reduzida flexibilidade da planta, seja pela dificuldade de se encontrar outra empresa para se fazer integração, traduz-se na produção rígida. Por outro lado, na integração vegetal, o grau de flexibilidade é mais amplo, pelo fato dos ativos não serem tão específicos. Ou seja, o produtor pode escoar sua produção para o mercado, caso a empresa não cumpra os contratos ou subestime o preço do produto. Todos esses elementos envolvidos nessa situação vão depender do tipo de contrato assumido entre os agentes.

Embora a especificidade dos ativos imponha alguns termos compulsórios no cumprimento dos contratos, isso pode gerar um fator que contribui positivamente para a estabilidade da oferta de matéria-prima para a agroindústria integradora.

Por outro lado, quando os ativos específicos não estão mais presentes, compradores e vendedores não carregam nenhum grau de dependência entre si, e as informações sobre os preços e quantidades fornecidas pelo mercado são suficientes. (Hiratuka, 1997).

A incerteza é o segundo atributo das transações. Neves & Zylberstajn (1995) enfatizam que esse fator pode apresentar problemas devido às discrepâncias inesperadas das transações e às dimensões necessárias para as estruturas de monitoramento e controle. Se as estruturas forem grandes, acabam sendo onerosas. Sendo assim, a incerteza comportamental – behavioral uncertainly –, como resultado da utilização oportunista, traduz certa influência sobre as formas organizacionais de forma a amenizar as disparidades e reduzir os custos de transação.

Na integração avícola, a incerteza torna-se importante para apresentar o comportamento dos produtores e da integradora. Na ótica do produtor existem algumas preocupações, como, da integradora não honrar os contratos, do preço instável dos insumos, da instabilidade climática, do alto preço dos ativos e dificuldade do financiamento, da produção de linhagens de qualidade. Pela ótica da integradora, cita-se: os baixos preços do frango no mercado, a criação de estratégias para com os concorrentes, a imprevisibilidade do mercado, a incerteza tecnológica, o baixo nível de informações entre produtores e agroindústria.

E, finalmente, a freqüência de transações, como o último atributo. Segundo Neves & Zylberstajn (1995) quanto mais freqüente for uma transação, mais uma estrutura especializada pode se manter, reduzindo-se seus custos fixos médios.Ou seja, a freqüência está ligada ao grau de utilização das estruturas de gestão montadas para dar suporte à transação. Na avicultura, a freqüência das atividades é constante entre os integrados e a agroindústria. Dessa forma, a integração avícola revela o alto grau de dominação da agroindústria sobre os produtores pela imposição de um pacote tecnológico definido a priori que deverá ser cumprido. A produção avícola, portanto, tende a ser integrada e padronizada numa cadeia produtiva da agroindústria, à medida que caminhará para uma produção cada vez mais hierarquizada.

Formas de governance das transações

Williamson (1989) define três estruturas alternativas de governança para a coordenação das transações entre as firmas: mercados, hierarquias e estruturas híbridas.

Mercado: pode ser considerada a mais eficiente estrutura produtiva, uma vez que os ativos específicos não estão presentes. Ou seja, não possui nenhuma relação de dependência entre os agentes, sendo que cada firma pode estabelecer transações com novos parceiros sem perdas econômicas.

Hierarquias: nessa estrutura, os ativos são altamente específicos, a coordenação pelo mercado perde eficiência e surge a necessidade de um mecanismo de coordenação mais cooperativo, que contemple um processo de negociação mais efetivo. Nesse caso é fundamental a sintonia bem como a resolução de conflitos contratuais e estabelecer uma conduta mais unificada entre os agentes. Ou seja, os contratos poderão atenuar os comportamentos oportunistas dados os mecanismos de controle e incentivos. Um dos problemas nesse caso está no risco de elevação dos chamados custos burocráticos que são justificados pelas disputas internas entre os diferentes departamentos na organização.

Estruturas híbridas: são as formas intermediárias entre os mercados e as hierarquias, combinando elementos desses dois extremos. Os contratos, nesse caso, incluem formas mais flexíveis e informais e possuem mais elementos adaptativos coordenados para contornar distúrbios não antecipados do que os mercados (Hiratuka, 1997).

Faz-se necessário, portanto, mostrar a diferenciação das formas de governança de acordo com o tipo de integração utilizada. Como já foi mencionado, na integração vegetal - onde os elementos na produção são mais flexíveis – há uma tendência gradativa da atuação dos agentes, passando a atuarem tanto no mercado, quanto nas empresas, simultaneamente, formando as chamadas estruturas híbridas. No caso da integração animal – aves e suínos – essa situação torna-se distinta, já que a estrutura da planta se mostra mais rígida e, portanto, com menor flexibilidade, resultando na produção endógena à firma. Ou seja, as decisões da empresa tornam-se cada vez mais hierarquizadas, apresentando características de menor comportamento oportunista e rapidez na resolução dos conflitos entre os integradores e a agroindústria.

Para Rizzi (1984), Dalla (1993) e Campos (1984), as relações contratuais entre integradoras e os produtores rurais baseiam-se nas possibilidades de apropriabilidade. Com efeito, os níveis de informação e de capitalização entre os integrados podem interferir nas condições de rentabilidade do negócio, embora, os contratos assumam certa semelhança entre as agroindústrias.

A exigência por contratos mais vantajosos pelos integrados mais capitalizados na atividade avícola, pode interferir na estabilidade da oferta do produto, haja vista que a natureza desse produtor está baseada na obtenção do lucro médio ao longo prazo - capitalista - ao invés do pequeno produtor rural, que recebe pela venda da sua mão-de-obra a curto prazo, demonstrando certo grau de monopólio da empresa na fixação do pagamento por cada lote de frango. Portanto, os contratos que determinam as transações entre as ligações da cadeia agroindustrial necessitam ser analisados segundo os seguintes parâmetros...
·        grau de exposição ao risco;
·        recursividade;
·        motivos de ocorrência;
·        tempo;
·        salvaguardas;
·        dependência;
·        renegociações – flexibilidade;
·        fidelidade;
·        remuneração;
·        indutores de estabilidade/continuidade;
·        rompimentos.

De tudo o que foi discutido, pode-se afirmar que a coordenação de atividades produtivas interfirmas na redução dos custos de transação, pode ser abordada dentro da concepção da ECT uma vez que se utilizam os seus fundamentos para complementar a abordagem Neo-Schumpeteriana dentro dessa mesma perspectiva.

Fonte

QUEIROZ, Antônio M.;  SENJU, Eliana K. A abordagem da Economia dos Custos de Transação. Revista Acadêmica Alfa. Goiânia, v.1, n.1, set. 2004.

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