Integração vertical
Vários
autores como Coase (1937), Chandler (1962), Arrow (1969), Williamson (1989) e
Simon (1987) têm discutido a respeito da importância da abordagem da Economia
dos Custos de Transação no que se refere às relações mercantis interfirmas. A
necessidade de criação de formas organizacionais específicas tem propensão de
vincular-se às estratégias competitivas e com estruturas subjacentes de
relações interfirmas distintas. Dessa forma, a principal indagação que se faz
nessa situação está baseada no porquê das firmas se verticalizarem.
(...)
Existem
várias formas de relações interfirmas que beneficiam as empresas detentoras
dessa estratégia. Uma delas é a integração vertical ou quase-integração
que pode ser interpretada como um instrumento de garantia da oferta de insumos
e/ou da demanda por produtos, na medida que há redução do custo de produção
interna e dos custos de transação. Assim, esse sistema possibilita a redução da
dependência no que diz respeito à necessidade de requerer menos informações com
o mercado – uncertainly of environment. Segundo Perry (1989) apud Dowell
& Cavalcanti (1998), por meio de um acordo, a firma integradora não arca
com os custos de acompanhamento do mercado, investigando fontes alternativas de
insumos ou de escoamento da produção. Para entender a integração vertical pela Teoria
de Custos de Transação (ECT), seria necessário primeiro conhecer as
relações contratuais. No caso da atividade avícola as indústrias integradoras
possuem o domínio sobre os produtores integrados. Para Shiki (1996) a
dificuldade dos avicultores integrados em sair do negócio no final do contrato
é dada por fatores como a falta de alternativas e de oportunidades mais
rentáveis. Com isso, há uma tendência cada vez maior de que os pequenos e
descapitalizados se tornem indiretamente excluídos, já que não conseguem
aumentar nem a escala de produção, nem suas habilidades técnicas.
WILLIAMSON (1989) acredita que a tecnologia pode vir a
determinar a organização econômica somente nos casos em que existir apenas uma
tecnologia específica superior às demais e quando esta tecnologia envolver uma
única forma de organização. Dessa forma, a integração raramente é justificada
pela tecnologia, mas pela razão dela representar uma fonte de economia nos
custos de transação. Essa justificativa revela uma das fortes críticas dos
Neo-Schumpeterianos – Teoria
Evolucionista– em relação à – ECT – Teoria Institucional. (...)
A
integração vertical, portanto, tenta atenuar as imperfeições do mercado e da
informação, uma vez que o processo possui descontinuidades e assimetrias. Dessa
forma, com a integração, a demanda por informações torna-se menor do que com o
mercado, na medida que há uma gradativa substituição de relações externas pelas
trocas internas.
Enfim,
as características inerentes da integração vertical são justificadas pela
intensa relação e coordenação de numa atividade produtiva entre firmas,
partindo da premissa de que existe um ambiente totalmente incerto, permitindo
atuação dos agentes por meio dos contratos.
Comportamento
dos agentes
A ECT
utiliza duas suposições de comportamento dos agentes, no nosso caso específico
de estudo, os agentes envolvidos podem ser exemplificados, de um lado, como os
produtores integrados e, do outro, como as agroindústrias integradoras. Os
agentes podem assumir os seguintes comportamentos diante de um ambiente
considerado incerto.
1 – A
racionalidade restrita – bounded rationality - onde assume que todos os
contratos, mesmo os mais complexos, tornam-se incompletos; e,
2 – O
oportunismo – onde cada parte extrai as suas respectivas quase-rendas –quasi-rents
–, da outra parte pela ameaça de quebra do contrato, ou seja, os contratos
como promessa que não são fixados em compromissos confiáveis, mas ingênuos
(Dowell & Cavalcanti, 1998).
Assim,
os custos de transação podem ser classificados de acordo com os contratos como
os custos ex-ante de coleta e processamento de informações, de
estruturação, de negociação, de estabelecimento de garantias e salvaguardas
–formalizados em contratos ou não –, definindo o preço e a duração do contrato.
São também os custos ex-post do desalinhamento, da sua renegociação e
monitoramento, da adaptação a circunstâncias não previstas inicialmente (Hiratuka,
1997; Oliveira, 1998; Pondé, 1992).
Sob a ótica da rigidez dos contratos, Paulilo
(1990) enfatiza que o processo de integração entre os produtores e as
indústrias de transformação, às vezes, se dá como um campo de forças que ocorre
num ambiente de permanente conflito. Segundo ela o produtor integrado, mesmo
como dono da terra, perde sua autonomia e torna-se vulnerável às exigências da
indústria de transformação. Assim, a partir do contrato de parceria, o
integrado transforma-se num dos componentes da cadeia produtiva da empresa
processadora. Numa entrevista concedida a Revista Globo Rural, Furlan afirmou
que a produção de frangos tornou-se com o tempo padronizada, onde os diversos
elos da cadeia foram integrados, o número de transações reduzido, o que se
promoveu uma economia de escala com baixos custos (Globo Rural/1999).
O
contrato de parceria, portanto, torna-se um instrumento pelo qual a integradora
e o produtor integrado se articulam para a produção de frangos de linhagens de
alta produtividade. Este contrato tem valor jurídico e orienta os produtores em
suas respectivas responsabilidades e na distribuição dos resultados econômicos
finais. A empresa se compromete pelo fornecimento de matéria-prima – pintos,
matrizes, reprodutores –, insumos – rações, vacinas e medicamentos – e
assistência técnica; e o avicultor associado torna-se o responsável pela
construção das instalações, equipamentos dos galpões e, também, pelo cuidado
dispensado aos aviários (Shiki,6 1996; Matos & Shiki, 1996; Rizzi, 1993).
As
satisfatórias experiências com o uso de mão-de-obra familiar no processo de
integração na Região Sul – mais especificamente Paraná e Santa Catarina – deram
suporte para a grande discussão sobre as características essenciais do perfil
do produtor integrado. A maioria dos produtores que se integrara na produção
suína era oriunda de famílias de agricultores que exerciam tradicionalmente
essa atividade antes da introdução da suinocultura em padrões industriais.
Dessa forma, eles mudaram seu método de criação e incorporaram um conjunto de
inovações, em virtude dos contratos de integração – orais e escritos –
introduzidos pelas agroindústrias (Brandenburg & Ferreira, 1995; Farina
& Zylberzstajn, 1992). Através do sistema de integração, portanto, as agroindústrias
de carne da Região Sul garantiram a oferta de matéria-prima para o abate,
considerado como condição básica para o melhor funcionamento do setor
As
mudanças estruturais na tecnologia de manejo tornaram-se um dos principais
elementos da produção avícola, tornando mais seletivo os produtores pelo
processo de contrato de integração, seja na avicultura, seja na suinocultura. A
organização técnica e administrativa da produção cumprem as regras de um padrão
tecnológico que resulta em qualidade e produtividade dentro de um mercado cada
vez mais competitivo. Segundo Canever et al, 1997...
(...)
o objetivo desse sistema é substituir gradativamente os equipamentos manuais
por automáticos, até chegar à automatização e climatização totais dos aviários.
Com o novo sistema, os avicultores pequenos que possuem instalações inadequadas
e que não forem capazes de adequar aos novos padrões terão que deixar a
atividade.
Portanto,
as mudanças tecnológicas estruturais apontam para a viabilidade econômica
somente daqueles produtores que apresentam possibilidades superiores de
investimento, com maior uso de tecnologia e qualificação técnica, capazes de
assegurar a reprodução da qualidade genética (Ipardes, 1990).
Ferreira
et al. (1998) corroboram essa afirmação, alegando que um dos
principais...
(...)
determinantes na produção de frango é o capital de investimento para a
construção do galpão e aquisição de equipamentos, o qual tem sido sempre maior,
em razão do padrão de exigência das empresas integradoras. Tem-se, portanto,
questionado sobre quais fatores estariam contribuindo para a redução de custos
e para o aumento da produtividade por meio de adequações na escala de produção.
Dessa
forma, as alianças estratégicas das integradoras com produtores mais
capitalizados têm sido uma vantagem competitiva, à medida que há introdução de
novas tecnologias em máquinas e equipamentos, elevando cada vez mais a
produtividade avícola e reduzindo os custos de produção. Por outro lado, essa
estratégia tende a reduzir o raio de manobra da empresa integradora sobre o
integrado no que tange à elevação do comportamento oportunista entre os
agentes.
As
transações e os seus atributos
Coase
(1937) e Williamson (1989), apontam a existência de outros elementos
importantes da ECT, que são os determinantes das formas de transação. São eles:
a)especificidade do ativo; b) incerteza e c) freqüência.
Para
Dowell & Cavalcanti (1998), existe uma grande especificidade de ativos no
investimento, que está relacionada com a noção de custos irrecuperáveis – sunk
costs.
Logo,
após a decisão de integrar-se, o produtor realiza o investimento inicial; caso
ele venha se arrepender, entendendo que a margem de lucro foi muito pequena e,
conseqüentemente, resolve sair do negócio, este produtor ficará preso ao
investimento realizado, por causa da especificidade dos ativos – assets
specificity. As especificidades dos ativos podem ser classificadas em
várias categorias (Siffert F.,1995)...
·
especificidade
espacial;
·
especificidade
dos ativos físicos;
·
especificidade
dos ativos humanos;
·
especificidade
da marca.
A especificidade dos ativos, portanto, está
relacionada ao fator flexibilidade. No caso da integração animal - atividade
avícola –, a flexibilidade é muito reduzida por impossibilitar o escoamento da
produção para outros fins. Ou seja, a quase inexistência de alternativas da
utilização da granja - seja pela reduzida flexibilidade da planta, seja pela
dificuldade de se encontrar outra empresa para se fazer integração, traduz-se
na produção rígida. Por outro lado, na integração vegetal, o grau de
flexibilidade é mais amplo, pelo fato dos ativos não serem tão específicos. Ou
seja, o produtor pode escoar sua produção para o mercado, caso a empresa não
cumpra os contratos ou subestime o preço do produto. Todos esses elementos
envolvidos nessa situação vão depender do tipo de contrato assumido entre os
agentes.
Embora
a especificidade dos ativos imponha alguns termos compulsórios no cumprimento
dos contratos, isso pode gerar um fator que contribui positivamente para a estabilidade
da oferta de matéria-prima para a agroindústria integradora.
Por
outro lado, quando os ativos específicos não estão mais presentes, compradores
e vendedores não carregam nenhum grau de dependência entre si, e as informações
sobre os preços e quantidades fornecidas pelo mercado são suficientes. (Hiratuka, 1997).
A
incerteza é o segundo atributo das transações. Neves & Zylberstajn (1995)
enfatizam que esse fator pode apresentar problemas devido às discrepâncias
inesperadas das transações e às dimensões necessárias para as estruturas de
monitoramento e controle. Se as estruturas forem grandes, acabam sendo
onerosas. Sendo assim, a incerteza comportamental – behavioral uncertainly
–, como resultado da utilização oportunista, traduz certa influência sobre
as formas organizacionais de forma a amenizar as disparidades e reduzir os
custos de transação.
Na
integração avícola, a incerteza torna-se importante para apresentar o
comportamento dos produtores e da integradora. Na ótica do produtor existem
algumas preocupações, como, da integradora não honrar os contratos, do preço
instável dos insumos, da instabilidade climática, do alto preço dos ativos e
dificuldade do financiamento, da produção de linhagens de qualidade. Pela ótica
da integradora, cita-se: os baixos preços do frango no mercado, a criação de
estratégias para com os concorrentes, a imprevisibilidade do mercado, a
incerteza tecnológica, o baixo nível de informações entre produtores e
agroindústria.
E,
finalmente, a freqüência de transações, como o último atributo. Segundo Neves
& Zylberstajn (1995) quanto mais freqüente for uma transação, mais uma
estrutura especializada pode se manter, reduzindo-se seus custos fixos
médios.Ou seja, a freqüência está ligada ao grau de utilização das estruturas
de gestão montadas para dar suporte à transação. Na avicultura, a freqüência
das atividades é constante entre os integrados e a agroindústria. Dessa forma,
a integração avícola revela o alto grau de dominação da agroindústria sobre os
produtores pela imposição de um pacote tecnológico definido a priori que
deverá ser cumprido. A produção avícola, portanto, tende a ser integrada e
padronizada numa cadeia produtiva da agroindústria, à medida que caminhará para
uma produção cada vez mais hierarquizada.
Formas
de governance das transações
Williamson
(1989) define três estruturas alternativas de governança para a coordenação das
transações entre as firmas: mercados, hierarquias e estruturas híbridas.
Mercado:
pode ser considerada a mais eficiente estrutura produtiva, uma vez que os
ativos específicos não estão presentes. Ou seja, não possui nenhuma relação de
dependência entre os agentes, sendo que cada firma pode estabelecer transações
com novos parceiros sem perdas econômicas.
Hierarquias:
nessa estrutura, os ativos são altamente específicos, a coordenação pelo
mercado perde eficiência e surge a necessidade de um mecanismo de coordenação
mais cooperativo, que contemple um processo de negociação mais efetivo. Nesse
caso é fundamental a sintonia bem como a resolução de conflitos contratuais e
estabelecer uma conduta mais unificada entre os agentes. Ou seja, os contratos
poderão atenuar os comportamentos oportunistas dados os mecanismos de controle
e incentivos. Um dos problemas nesse caso está no risco de elevação dos
chamados custos burocráticos que são justificados pelas disputas internas entre
os diferentes departamentos na organização.
Estruturas
híbridas: são as formas intermediárias entre os mercados e as
hierarquias, combinando elementos desses dois extremos. Os contratos, nesse
caso, incluem formas mais flexíveis e informais e possuem mais elementos
adaptativos coordenados para contornar distúrbios não antecipados do que os
mercados (Hiratuka, 1997).
Faz-se
necessário, portanto, mostrar a diferenciação das formas de governança de
acordo com o tipo de integração utilizada. Como já foi mencionado, na
integração vegetal - onde os elementos na produção são mais flexíveis – há uma
tendência gradativa da atuação dos agentes, passando a atuarem tanto no mercado,
quanto nas empresas, simultaneamente, formando as chamadas estruturas híbridas.
No caso da integração animal – aves e suínos – essa situação torna-se distinta,
já que a estrutura da planta se mostra mais rígida e, portanto, com
menor flexibilidade, resultando na produção endógena à firma. Ou seja, as
decisões da empresa tornam-se cada vez mais hierarquizadas, apresentando
características de menor comportamento oportunista e rapidez na resolução dos
conflitos entre os integradores e a agroindústria.
Para Rizzi
(1984), Dalla (1993) e Campos (1984), as relações contratuais entre
integradoras e os produtores rurais baseiam-se nas possibilidades de
apropriabilidade. Com efeito, os níveis de informação e de capitalização entre
os integrados podem interferir nas condições de rentabilidade do negócio,
embora, os contratos assumam certa semelhança entre as agroindústrias.
A
exigência por contratos mais vantajosos pelos integrados mais capitalizados na
atividade avícola, pode interferir na estabilidade da oferta do produto, haja
vista que a natureza desse produtor está baseada na obtenção do lucro médio ao
longo prazo - capitalista - ao invés do pequeno produtor rural, que recebe pela
venda da sua mão-de-obra a curto prazo, demonstrando certo grau de monopólio da
empresa na fixação do pagamento por cada lote de frango. Portanto, os contratos
que determinam as transações entre as ligações da cadeia agroindustrial
necessitam ser analisados segundo os seguintes parâmetros...
·
grau
de exposição ao risco;
·
recursividade;
·
motivos
de ocorrência;
·
tempo;
·
salvaguardas;
·
dependência;
·
renegociações
– flexibilidade;
·
fidelidade;
·
remuneração;
·
indutores
de estabilidade/continuidade;
·
rompimentos.
De tudo
o que foi discutido, pode-se afirmar que a coordenação de atividades produtivas
interfirmas na redução dos custos de transação, pode ser abordada dentro da
concepção da ECT uma vez que se utilizam os seus fundamentos para complementar
a abordagem Neo-Schumpeteriana dentro dessa mesma perspectiva.
Fonte
QUEIROZ, Antônio M.;
SENJU, Eliana K. A abordagem da Economia dos Custos de Transação. Revista
Acadêmica Alfa. Goiânia, v.1, n.1, set. 2004.
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