Rodrigo Constantino, O GLOBO
Agora que os
principais bancos divulgaram seus balanços do primeiro semestre de 2012,
podemos fazer uma análise melhor dos rumos do setor. O que vemos em
relação à expansão creditícia, especialmente nos bancos estatais, é
inquietante. Não é trivial dizer se há ou não uma bolha de crédito no
Brasil. Mas, se o governo seguir na tendência atual, isso claramente
será um risco concreto.
A Caixa Econômica
Federal expandiu em 45% sua carteira de crédito em apenas 12 meses.
Trata-se de um crescimento espantoso, boa parte voltada para o programa
"Minha Casa, Minha Vida". O Banco do Brasil, por sua vez, aumentou em
20% a carteira no mesmo período. Juntos, esses dois bancos possuem uma
carteira acima de R$ 750 bilhões!
Os bancos
privados seguem em mão contrária, reduzindo o ritmo de crescimento. Itaú
Unibanco e Bradesco expandiram, na média, em apenas 12% a carteira de
crédito nos últimos 12 meses. A inadimplência em alta acendeu o sinal de
alerta, e os banqueiros decidiram pisar no freio, apesar da pressão do
governo.
O grau de
alavancagem dos bancos públicos é bem maior. O Banco do Brasil e a Caixa
possuem, somados, mais de R$ 1,6 trilhão em ativos, para míseros R$ 83
bilhões de patrimônio líquido. Ou seja, uma alavancagem de quase 20
vezes! Por outro lado, os três maiores bancos privados possuem, juntos,
alavancagem de 10,5 vezes.
Em outras
palavras, os bancos públicos apresentam o dobro de risco. A Caixa é o
mais agressivo de todos, com quase R$ 600 bilhões em ativos para
singelos R$ 21,4 bilhões de patrimônio. Uma alavancagem assustadora de
quase 28 vezes! Para explicar de outra forma, basta uma perda de 4% nos
ativos para reduzir todo o patrimônio da Caixa a pó.
Ciente do enorme
risco, o governo já fala em injetar mais capital no banco. Isso
significa, em linguagem clara, que os "contribuintes" serão chamados
para pagar pela farra de crédito dos mais endividados. A prudência é
punida, enquanto o comportamento de cigarra irresponsável é premiado. O
show precisa continuar.
Quando observamos
esses dados, a incômoda pergunta feita séculos atrás pelo poeta romano
Juvenal vem à tona: Quis custodiet ipsos custodes? Traduzindo: quem
vigia os vigias? Se o próprio governo deve cuidar da saúde do sistema
financeiro, como garantir que ele não será o grande responsável pela
criação de bolhas com foco no curto prazo?
Muitos culpam a
desregulamentação pela crise americana recente. Ignoram que o epicentro
da crise estava justamente em um setor bastante regulamentado: o de
hipotecas. Dois gigantes do setor, empresas semiestatais, bancaram
verdadeira orgia de crédito imobiliário, principalmente para as classes
mais baixas, com os famosos "subprimes".
Tanto a Fannie
Mae como a Freddie Mac sofreram intensa pressão de Washington para
expandir a carteira de crédito voltada para os mais pobres. É muito
popular o governante que ajuda no sonho da casa própria,
independentemente da capacidade futura de pagamento.
Essas empresas,
atreladas até a alma ao governo, contavam com um órgão regulador
exclusivo, cuja única missão era assegurar sua saúde financeira. Isso
não impediu que seu grau de alavancagem chegasse a 50 vezes! O resultado
agora é conhecido: os pagadores de impostos foram obrigados a cobrir o
rombo bilionário.
É muito tentador
para um governante usar bancos públicos para financiar uma farra de
crédito sem lastro. Ele colhe os louros no curto prazo, com mais
crescimento econômico, enquanto os problemas só aparecem lá na frente,
no mandato de outro. Estamos cansados de saber disso com os históricos
fracassos do BNH, Banco do Brasil, Banerj, Banespa, etc.
O brasileiro já
se encontra bastante endividado. O modelo de consumo calcado em crédito
se esgotou. A economia não cresce e a inflação segue elevada. O inverno
chegou para as cigarras. Os bancos privados percebem isso, mas sofrem
forte pressão do governo para expandirem ainda mais o crédito.
Os bancos
públicos assumem a iniciativa, roubando mercado de forma irresponsável.
Já correspondem a quase metade do total de crédito do país, lembrando
que Marx e Engels defendiam o controle estatal do crédito como
instrumento para a revolução comunista.
Quando Pandora
abriu a caixa que ganhara de presente, contra todos os alertas, ela
espalhou pelo mundo vários males. Sobrou na caixa a esperança, a última
que morre. Espera-se que o governo saiba parar com essa política
inflacionária a tempo. Caso contrário, teremos muito sofrimento depois.
Assim diz Cassandra, cuja maldição era prever o futuro, mas não ser
escutada...
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