SUMÁRIO EXECUTIVO
1) Os objetivos desta pesquisa são dimensionar o público potencial do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) no Brasil e, em seguida, analisar as condições de reprodução social dos mais pobres entre os agricultores familiares (o chamado grupo B) nos nove estados da região Nordeste e em Minas Gerais.
2) O grupo B do PRONAF, segundo as regras do Plano Safra 2006-2007, era formado pelos agricultores familiares com renda bruta anual familiar – com rebate – até R$ 3 mil, sendo no mínimo 30% desta renda auferida por meio das atividades desenvolvidas no interior do estabelecimento agropecuário.
3) A realização do trabalho ocorreu por intermédio da análise de dados estatísticos oriundos de tabulações especiais do Censo Agropecuário 2006, realizadas pela parceria entre o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA).
4) O estudo mostra que os estabelecimentos do grupo B (aqueles que fazem parte do público potencial da linha de microcrédito do PRONAF) somavam 2,4 milhões de unidades, representando mais da metade dos 4.366.267 estabelecimentos familiares identificados no Brasil em 2006. Esta enorme massa de produtores de baixa renda estava presente, com graus variados, em todo o território nacional, concentrando-se, majoritariamente, nos nove estados da região Nordeste e em Minas Gerais, que, em conjunto, respondiam por 75% desta categoria de produtores rurais (1.810.458 estabelecimentos).
5) A estratificação do público potencial do PRONAF em grupos de renda revela que a agricultura familiar brasileira é marcada por grande heterogeneidade e diversidade socioespacial – em geral, ofuscada pela oposição simplista familiar versus agronegócio.
6) O 1,8 milhão de estabelecimentos potencialmente enquadráveis no grupo B do PRONAF localizados na região Nordeste e em Minas Gerais eram dirigidos, em sua maioria, por homens de idade avançada, 20% dos quais com mais de 65 anos, que apresentavam elevado índice de analfabetismo e pouca participação em entidades de classe e cooperativas.
7) A participação dos estabelecimentos do grupo B na distribuição da terra nos estados pesquisados era bastante reduzida. No geral, 69% dos estabelecimentos nordestinos e 59% dos mineiros tinham áreas de terra inferiores a 10 ha. Ademais, o acesso a fontes fixas de água também era precário, pois somente um pequeno número de estabelecimentos contava com poços e cisternas em seu interior.
8) Em 2006, mais de 4,8 milhões de pessoas estavam ocupadas nas pequenas propriedades dos agricultores “pronafianos” do grupo B no espaço pesquisado. Na região Nordeste, de cada cem pessoas ocupadas na agropecuária em 2006, pelo menos 55 estavam nos estabelecimentos
de baixa renda. Em Minas Gerais, por sua vez, o grupo B ocupava 30% do total. Do pessoal ocupado (PO) nos estabelecimentos deste grupo, mais de 90% era membro da própria família do produtor.
9) Do total de membros da família dos agricultores do grupo B, grande parcela não sabia ler nem escrever: 49,89% na região Nordeste e 34,86% em Minas Gerais. Neste sentido, o tema da educação rural emerge como problema social de grande dimensão.
10) Os estabelecimentos do grupo B apresentavam baixo padrão tecnológico. Os dados do Censo Agropecuário 2006 indicaram que havia percentual significativo de produtores localizados nos estados nordestinos (38%) e em Minas Gerais (23%) que nem ao menos usava energia elétrica em 2006. Além disso, apenas um número muito reduzido utilizava irrigação (3,37% no Nordeste e 6,47% em Minas Gerais) e fazia pousio, ou descanso, de solo (7,81% e 4,45%, respectivamente).
11) Em adição ao acesso precário a tecnologias de produção, destaca-se nas estatísticas censitárias o fato de que um número baixíssimo de agricultores do grupo B recebeu assistência técnica em 2006: 4,24% na região Nordeste e 11,52% em Minas Gerais.
12) As múltiplas carências (de educação, organização, terra, água, tecnologias, assistência técnica e liquidez) dos agricultores do grupo B refletir-se-ão diretamente nos indicadores de produção agropecuária. Uma fração importante do segmento nem ao menos registrou valor da produção (VP) em 2006: 12% no Nordeste e 18% em Minas Gerais. Entre aqueles que tiveram produção, chama atenção o VP médio gerado no transcorrer do ano civil em questão: R$ 1.118 na região Nordeste e R$ 1.815 em Minas Gerais.
13) Na região Nordeste, apenas 25% da receita total dos agricultores pobres veio das vendas da produção agrícola, e 75% era originária de outras fontes, com especial destaque para as aposentadorias e as pensões. Em Minas Gerais, os percentuais foram semelhantes à média nordestina.
14) Em todos os estados pesquisados, as despesas dos estabelecimentos do grupo B foram superiores às receitas agropecuárias. Isto significa que a receita líquida dos produtores era fortemente condicionada à existência de outras fontes de renda. Disto, ressalta-se que existe no segmento uma fração de produtores mais pobres que a média: agricultores familiares pobres “sem-sem” (sem terra, sem aposentadorias, sem programas sociais, sem educação, sem assistência técnica, sem crédito etc.).
15) Apenas uma pequena parcela do 1,8 milhão de estabelecimentos estudados declarou que obteve financiamento agropecuário em 2006: 12,35% nos estados nordestinos e 11,92% em Minas Gerais. Os créditos foram usados predominantemente para investimentos em atividades pecuárias.
16) Chama atenção o percentual elevado de produtores que declarou que não recorreu a nenhum banco para conseguir um financiamento rural porque teve “medo de contrair dívidas” ou, simplesmente, porque “não precisou”: 70% do total na região Nordeste e 82% do total em Minas Gerais. Como as famílias pobres têm demanda financeira variada, tudo indica que os dados apresentados espelham o esgotamento do modelo de crédito ofertado ao grupo B, que tem privilegiado o financiamento da produção agropecuária em detrimento de outras atividades geradoras de renda.
17) Analisando-se o valor médio das dívidas em relação às receitas obtidas pelo grupo B, infere-se que esta categoria de produtores apresenta baixa capacidade de pagamento até mesmo de pequenos empréstimos.
18) Diante da complexidade do quadro retratado, cogita-se como estratégia de ação a elaboração de uma política específica para o grupo B, que, além de microcrédito, abranja um conjunto de ações estruturantes capazes de superar as múltiplas carências enfrentadas por estes agricultores no espaço territorial estudado.
19) Para subsidiar o debate sobre a temática, seria importante uma nova fase da pesquisa objetivando: ampliar a análise para todos os estados brasileiros; realizar estudo comparativo do grupo B com os demais segmentos; identificar em cartogramas e mapas a localização espacial dos agricultores pobres nos municípios e nas microrregiões do país; analisar as especificidades do segmento considerando apenas as localidades que fazem parte do Semiárido brasileiro, conforme a definição do Ministério da Integração Nacional (MI); verificar a distribuição espacial e as características do segmento na região Sul do Brasil; e, finalmente, realizar incursões a campo para colher informações qualitativas sobre as ações públicas desenvolvidas a favor destes produtores em municípios representativos das áreas de maior concentração geográfica identificadas.
Sergio Schneider – PGDR/UFRGS
Leonardo Xavier – PGDR/UFRGS
Elaboração e redação / Equipe técnica
Joacir Rufino de Aquino – UERN
Guilherme F. W. Radomsky – UFRGS
Gabriela Spohr – UFRGS
Adriana Paredes – UFRGS
Camila W. Radomsky – UFRGS
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