sábado, 24 de agosto de 2013

A gestão pública transparente por meio da participação popular – Um estudo de caso


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1) O DIREITO DO CIDADÃO À TRANSPARÊNCIA DA GESTÃO PÚBLICA

Os recursos administrados pelos setores públicos são oriundos dos cidadãos na forma de contribuintes. A sociedade que recolhe tributos começa cada vez mais a exigir respostas aos seus anseios e necessidades. Quer ver resultados decorrentes de uma eficiente aplicação dos recursos, na prestação de serviços públicos com presteza e qualidade e quer que haja transparência na gestão destes recursos.

Manter a transparência na gestão pública é promover uma gestão fiscal e orçamentária responsável. A LRF prevê, no art. 1º, § 1º:

“A responsabilidade na gestão fiscal pressupõe a ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas, mediante o compromisso de metas e resultados entre receitas e despesas e a obediência a limites e condições no que tange à renúncia de receita, geração de despesas com pessoal, da seguridade social e outras, dívidas consolidada e mobiliária, operações de crédito, inclusive por antecipação de receita, concessão de garantia e inscrição em restos a pagar”.

A transparência efetivamente ocorre quando é feita de forma compreensível para todo o cidadão, com clareza, abertura e simplicidade. A efetiva transparência pode ir além de publicação de relatórios técnicos nos quais nem sempre as demonstrações das contas são esclarecedoras ao público.

2) O DIREITO DE PARTICIPAÇÃO DO CIDADÃO
 
Por muito tempo, acreditou-se que falar em democracia e em participação popular era a mesma coisa. Democracia era o governo “do povo, pelo povo e para o povo”, portanto um governo em que o povo participaria ativamente. Se todos eram “livres e iguais”, havia democracia. Hoje, deparam-se com críticas a este pensamento. As pessoas não são iguais e não têm formas de participação igualitárias, pois nem todos têm acesso a informações e a capacidade de reflexão sobre como essas informações irão afetar suas vidas.

Tarso Genro, na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), assim argumenta:

“Creio que a principal conquista democrática da revolução burguesa [...] foi a separação da estrutura formal do Estado com a sociedade, uma separação fundamental para a afirmação das grandes democracias modernas. É necessário hoje, que reforcemos esta separação, reforcemos pela conferência de identidade pública clara e transparente aquilo que é Estado e aquilo que é sociedade. E para conferir identidade pública à sociedade, tem ela que estar estruturada e organizada, para dialogar com o Estado e referir-se a ele enquanto sociedade civil e criar uma esfera pública não-estatal, em que Estado e sociedade estabeleçam seus conflitos, seus conceitos, seus consensos e gerem, a partir daí, decisões que combinem a legitimidade da representação política tradicional com a participação direta e voluntária da cidadania”. (GENRO, 1997, p.18)

Percebe-se que Tarso Genro faz referência ao orçamento participativo, mas no mesmo momento em que ele demonstra a conquista da criação de uma sociedade civil que dialoga com o Estado para verem atendidas as suas reivindicações, depara-se com o fato de que as pessoas não são iguais.

O planejamento no setor público é um processo contínuo com reflexos diretos à sociedade. Assim, torna-se importante a participação de todos os segmentos desta como sujeitos ativos no processo decisório.

No planejamento tradicional, em geral, os investimentos públicos são decididos dentro de gabinetes e fora do alcance de consultas aos principais interessados, que são os cidadãos.

Mas como os serviços prestados pelos municípios são considerados de primeira necessidade, até mesmo para a sobrevivência da comunidade, em alguns casos, ou para que se logre um mínimo de bem-estar, tem sido proposto um novo modelo de planejamento, ou seja, administrar com democracia e participação, de forma que a população seja personagem central do processo decisório da administração pública, em especial no campo dos chamados serviços sociais: educação, saúde, saneamento básico, transportes coletivos, entre outros. É fundamental a participação do cidadão nas decisões que resultem na prestação daqueles serviços ou que se refiram a ações que venham prejudicar o bem-estar coletivo.

A Carta Constitucional de 1988 introduziu importantes instrumentos de participação popular e iniciativa à transparência.

No art. 29, XII menciona que a Lei Orgânica que cada Município deve incluir, entre outros princípios, "a cooperação das associações representativas no planejamento municipal". Ainda, no art. 29, XIII dispõe que “iniciativa popular de projetos de leis de interesse específico do município, da cidade ou dos bairros, através de manifestação de, pelo menos, cinco por cento do eleitorado".

Outro instrumento, o art. 14, I, II e III, refere-se ao plebiscito, ao referendum e à iniciativa popular.

O § 2º do art. 61 preconiza o paradigma desta participação popular na formulação do processo legislativo.

“A iniciativa popular pode ser exercida pela apresentação à Câmara dos Deputados de projeto de lei subscrito por, no mínimo, um por cento do eleitorado nacional, distribuído pelo menos por cinco estados, com não menos de três décimos por cento dos eleitos de cada um deles”.

Quanto à transparência, o seu art. 165, § 3º, preconiza que: “O Poder Executivo publicará, até trinta dias após o encerramento de cada bimestre, relatório resumido da execução orçamentária”.

A LRF trouxe uma contribuição muito importante para a transparência da gestão fiscal, ao definir que os relatórios fiscais devam ter ampla divulgação, assegurando inclusive a participação da sociedade na discussão dos PPA, LDO e LOA. A Lei estabelece no seu art. 48:

“São instrumentos de transparência da gestão fiscal, aos quais será dada ampla divulgação, inclusive em meios eletrônicos de acesso público: os planos, orçamentos e leis de diretrizes orçamentárias; as prestações de contas e o respectivo parecer prévio; o Relatório Resumido da Execução Orçamentária e o Relatório de Gestão Fiscal; e as versões simplificadas desses documentos. Parágrafo Único: A transparência será assegurada também mediante incentivo à participação popular e realização de audiências públicas, durante os processos de elaboração e de discussão dos planos, lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos”.

Ainda no seu art. 9º, § 4º, a LRF estabelece os prazos e as formas por meio das quais o Poder Executivo deverá demonstrar e avaliar o cumprimento das metas fiscais dando a efetiva transparência da execução das metas estabelecidas:

“Até o final dos meses de maio, setembro e fevereiro, o Poder Executivo demonstrará e avaliará o cumprimento das metas fiscais de cada quadrimestre, em audiência pública na comissão referida no § 1º do art. 166 da Constituição ou equivalente nas Casas Legislativas estaduais e municipais.”

A participação popular no planejamento governamental dá-se por meio das audiências públicas que os Poderes Executivo e Legislativo deverão proporcionar durante o processo de elaboração e discussão dos orçamentos e para avaliação do cumprimento das metas estabelecidas para cada quadrimestre.

A audiência pública foi instituída pela Lei de Responsabilidade Fiscal, com o objetivo de oferecer à sociedade oportunidade de participar nas decisões políticas de alocação dos recursos públicos, exercitar o princípio da transparência e motivar o controle social dos atos da administração.

É importante que uma lei municipal seja editada no sentido de disciplinar a realização das audiências públicas, de forma que a participação da sociedade civil organizada ocorra de forma equilibrada.

Compete ao Tribunal de Contas a fiscalização da realização das audiências públicas, que tem exigido o encaminhamento de comprovante da sua ocorrência.

Em síntese, as formas de representação e participação do cidadão no processo decisório da administração pública podem ser visualizadas da seguinte forma:

• Por meio do voto, elegendo os governantes;

• Nas audiências públicas, em que os cidadãos interessados são convidados a discutir decisões a serem tomadas pela administração pública e que podem afetar o seu dia-a-dia e que os cidadãos são convidados a participar da avaliação do cumprimento das metas estabelecidas para cada quadrimestre;

• Nos conselhos deliberativos e consultivos em que os cidadãos participam do processo decisório de órgãos públicos. No Brasil alguns são obrigatórios, como os da criança e adolescente, saúde, assistência social, educação, segurança pública, alimentação escolar; entre outros.

• Nas associações comunitárias, representando interesses de grupos específicos, como bairros, unidades de vizinhança, distritos ou usuários de determinados serviços, como as associações de pais e alunos;

• Na elaboração do Plano Plurianual (PPA), Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), Lei Orçamentária Anual (LOA), Congresso das Cidades e Plano Diretor, com a participação na definição dos investimentos a serem realizados no município, planejando-se assim o futuro das cidades, a partir de suas necessidades e perfis.
Assim, além de exercer o direito do voto para eleger o administrador público, a comunidade organizada, em nome da cidadania, tem efetiva oportunidade de participar do processo de administração pública de forma intensa.

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Fonte
REGOSO, Edson Luis, et al. A gestão pública transparente por meio da participação popular – Um estudo de caso. Disponível em: <http://www.fae.edu/publicacoes/pdf/IIseminario/politicas/politicas_02.pdf>.

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