Em mais uma sessão histórica no
processo do mensalão, o empate, ontem, em cinco votos, em torno da legalidade
dos embargos infringentes colocou nas mãos do decano do Pleno do Supremo, Celso
de Mello, aceitar ou permitir a prorrogação do julgamento. Se acolher a tese da
defesa, tornará os caminhos da Justiça brasileira ainda mais incompreensíveis
para a população. Afinal, apesar de seis anos de tramitação do processo no
Supremo, mais de 50 sessões, após garantido amplo direito de defesa, poderá ser
concedida a benesse de um novo julgamento a 11 dos réus, em condenações nas
quais obtiveram pelo menos quatro votos em seu favor.
É verdade que os 11 mensaleiros
beneficiados pela aceitação dos embargos infringentes estão condenados por
algum crime, inclusive com a pena de prisão em regime fechado, caso de Marcos
Valério, por exemplo, operador do esquema, a ser trancafiado devido à
comprovada evasão de divisas. Mesmo os mensaleiros estrelados, os petistas José
Dirceu, Delúbio Soares, José Genoino e João Paulo Cunha carregarão para sempre
na folha corrida o registro de condenação por corrupção. Não é pouca coisa.
Mas o rejulgamento, com chance de
revisão de condenações e a suspensão de penas a serem cumpridas em regime
fechado, reforçará o ceticismo com a Justiça, considerada leniente com ricos e
poderosos. Os que acham que cadeia foi feita para pobre terão mais um forte
argumento.
Primeiro dos votos, e a favor dos
embargos, Luís Roberto Barroso, recém-empossado, reconheceu haver argumentos
fortes nos dois lados da questão: se a lei federal 8.038, de 1990, ao não citar
este tipo de embargo, o havia suprimido do regimento do tribunal ou não. Optou
por garantir o recurso e foi seguido por quatro outros ministros, também
divergentes da posição do relator do processo, Joaquim Barbosa, presidente da
Corte, contrário à aceitação dos embargos.
O voto da ministra Cármen Lúcia, em
apoio ao relator, trouxe argumento forte, como previra Barroso. Depois de
ressaltar a primazia constitucional do Congresso na regulação dos ritos judiciários
─ porque a Justiça é nacional ─, a ministra considerou inexistente a
possibilidade dos embargos, por força da lei federal.
E ainda alertou para a
possibilidade de condenados pelo Superior Tribunal de Justiça, foro
privilegiado também para autoridades, não terem o respaldo desses embargos, ao
contrário dos processados pelo Supremo. Estará configurado um tratamento
desigual pela Justiça, um evidente atropelo da Constituição. Luiz Fux, Gilmar
Mendes, Marco Aurélio Mello, ministros que também apoiaram o voto do relator,
não deixaram de chamar a atenção para a incoerência de se permitir apenas no
Supremo este tipo de recurso. “O sistema não fecha”, disse Marco Aurélio.
O adiamento do desfecho ao menos dá
um tempo ainda maior a Celso de Mello para continuar em suas reflexões.
Considerando, como alertou Gilmar Mendes, os reflexos de sua decisão em toda a
magistratura e nas próprias instituições.
Publicado no Globo de sexta-feira, 12-09
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