Capítulo 23: A
Revolução Industrial dos séculos XIX e XX
DURANTE o período que foi de 1400 até
aproximadamente 1700 a civilização moderna atravessou a sua primeira revolução
econômica. Foi ela a
Revolução Comercial, que extirpou
a economia semi-estática da Idade Média e a substituiu por um
capitalismo dinâmico dominado
por comerciantes, banqueiros e
armadores de navios. Mas a Revolução Comercial
não foi mais que o ponto de partida de rápidas e decisivas mudanças no campo
econômico. Não tardou a seguir-se-lhe uma Revolução Industrial, que não só
ampliou ainda mais a esfera dos grandes empreendimentos comerciais mas ainda se
estendeu aos domínios da produção. Tanto quanto é possível reduzi-la a uma
fórmula sintética, pode-se dizer que a Revolução
Industrial compreendeu: 1) a mecanização da indústria e da agricultura; 2) a
aplicação da força motriz à indústria; 3) o desenvolvimento do sistema fabril;
4) um sensacional aceleramento dos transportes e das comunicações; e 5) um
considerável acréscimo do controle capitalista sobre quase todos os ramos de
atividade econômica. Embora a Revolução Industrial já se houvesse
iniciado em 1760, não adquiriu todo o seu ímpeto antes do século XIX. Muitos
historiadores dividem o movimento em duas grandes fases, servindo o ano de 1860
como marco divisório aproximado entre ambas. O período de 1860 até os nossos
dias é por vezes denominado Segunda Revolução Industrial.
1. O COMPLEXO DE
CAUSAS DA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL
A Revolução Industrial nasceu de uma multiplicidade
de causas, algumas das quais são mais antigas do que habitualmente se
pensa. Talvez convenha considerar em primeiro lugar os aperfeiçoamentos iniciais da
técnica. As maravilhosas invenções dos
fins do século XVIII não nasceram já completas, como Minerva da testa de
Júpiter. Pelo contrário, já desde algum tempo havia um interesse mais ou menos
fecundo pelas inovações mecânicas. O período da Revolução Comercial assistira à
invenção do relógio de pêndulo, do termômetro, da bomba aspirante, da roda de
fiar e do tear para tecer meias, sem falar dos melhoramentos introduzidos na
técnica de fundir minérios e na obtenção do bronze. Mais ou menos em 1580 foi
inventado um tear mecânico que fazia fitas, sendo capaz de tramar vários fios
ao mesmo tempo. Houve também importantes progressos técnicos em outras
indústrias, como a de vidraria, relojoaria, aparelhamento de madeira e
construção naval. Várias dessas primeiras invenções tornavam necessária a
adoção de métodos fabris. Por exemplo, a máquina de organsinar seda bruta,
inventada na Itália por volta de 1500, tinha de ser instalada numa vasta
construção e exigia uma turma considerável de trabalhadores. Nos Temple Mills,
à margem do Tamisa, acima de Londres — segundo uma descrição feita em 1738 por
Daniel Defoe — o cobre era convertido em caldeiras e panelas por meio de
enormes martelos movidos a força hidráulica. Esses melhoramentos técnicos
iniciais mal se podem comparar em importância aos que se verificaram depois de
1760, mas mostram que a era da máquina não surgiu de um dia para outro.
Entre outras
causas de primeira importância contam-se algumas consequências
mais diretas da Revolução Comercial. Esse movimento
provocara o surto de uma classe de capitalistas que procuravam constantemente novas oportunidades de
investimento para o seu excesso de riqueza. A princípio essa
riqueza podia ser facilmente absorvida pelo comércio, pelos empreendimentos de
mineração, pelas especulações bancárias ou pelas construções navais, mas com o
correr do tempo as oportunidades em tais campos se tornaram bastante limitadas.
Em consequência, havia uma disponibilidade crescente de capitais para o
desenvolvimento da manufatura. Mas dificilmente teria ocorrido um
desenvolvimento rápido se não houvesse uma procura cada
vez maior de produtos industriais. Tal procura deveu-se em grande parte
à fundação de impérios coloniais e ao acentuado crescimento da população européia. Estamos lembrados
de que um dos objetivos primários da aquisição de colônias fora o de encontrar
novos mercados para os produtos manufaturados na metrópole. Como prova de que
tal finalidade fora satisfatoriamente atingida registra-se o fato de, só no ano
de 1658, terem sido embarcados da Inglaterra para a Virgínia nada menos de
24.000 pares de sapatos. Ao mesmo tempo, os mercados potenciais da Europa
iam-se alargando com rapidez, dada a curva ascendente da população dos países
ocidentais. Na Inglaterra o número de habitantes subiu de quatro milhões em
1600 a seis milhões em 1700 e a nove milhões no fim do século XVIII. A
população da França elevou-se de 17.000.000 em 1700 a 26.000.000 cerca de cem
anos mais tarde. Até que ponto esse aumento foi um efeito dos progressos da medicina no século XVIII e em que medida
se deveu ele à maior abundância de alimentos
decorrente da expansão do comércio? É uma questão discutível, mas a influência
do segundo destes fatores não pode ser desprezada. Finalmente, a Revolução
Comercial estimulou o crescimento das manufaturas graças à sua doutrina básica
do mercantilismo.
A política
mercantilista visava, entre outras coisas, aumentar a quantidade de artigos
manufaturados disponíveis para a exportação a fim de garantir uma balança de
comércio favorável. A despeito da importância das causas já mencionadas,
a Revolução Industrial teria sido
sem dúvida retardada se não
fosse a necessidade de melhoramentos mecânicos fundamentais em
certos campos de produção. Aí por volta de 1700, a procura de carvão para as fundições
de ferro tinha exaurido de tal modo as
reservas de lenha que várias nações da Europa
Ocidental se viram ameaçadas pelo desflorestamento.
Cerca de 1709 uma solução parcial foi encontrada por Abraham Darby, ao
descobrir que o coque podia ser utilizado na
fundição. Mas, para se
obter o coque necessário, era preciso
minerar carvão em quantidade muito maior do que até então se
tinha feito. Como o
principal obstáculo à extração
fosse a acumulação de água nas minas, a necessidade do novo
combustível levou à procura de uma fonte de energia capaz de acionar as bombas.
Vários experimentos relacionados com essa pesquisa resultaram
finalmente na invenção da máquina a vapor. Uma necessidade
ainda mais premente de mecanização existia na indústria
têxtil.
Com a crescente
procura dos tecidos de algodão nos séculos XVII e XVIII, tornou-se
simplesmente impossível fornecer
o fio necessário com as rodas
de fiar primitivas ainda em
uso. Mesmo depois de se porem a
trabalhar todas as mulheres e crianças em disponibilidade, a procura não pôde
ser satisfeita. Na Alemanha, até os soldados nos
quartéis foram postos a fiar algodão. Como a necessidade se
fizesse sentir cada vez mais, as sociedades científicas e as empresas
industriais ofereceram prêmios a quem apresentasse métodos aperfeiçoados de
fiação. Em 1760, por exemplo, a "English Society of Arts" instituiu
um desses prêmios para uma máquina que capacitasse uma pessoa a fiar seis fios
simultaneamente. O resultado de todos esses esforços foi o desenvolvimento da
máquina de fiar e do tear hidráulico, precursores de uma série de importantes
inventos na indústria têxtil. Não tardando a ficar demonstrada a viabilidade de
tais máquinas, a mecanização não podia deixar de estender-se às demais
manufaturas.
EDWARD McNALL BURNS
PROFESSOR DE HISTÓRIA DA RUTGERS UNIVERSITY
HISTÓRIA DA CIVILIZAÇÃO OCIDENTAL
Volume II
Tradução de LOURIVAL GOMES MACHADO, LOURDES SANTOS MACHADO e LEONEL VALLANDRO
PROFESSOR DE HISTÓRIA DA RUTGERS UNIVERSITY
HISTÓRIA DA CIVILIZAÇÃO OCIDENTAL
Volume II
Tradução de LOURIVAL GOMES MACHADO, LOURDES SANTOS MACHADO e LEONEL VALLANDRO
continua nas postagens seguintes...
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