6. As NOVAS
DOUTRINAS SOCIAIS E ECONÔMICAS
A Revolução Industrial produziu uma messe completa de teorias econômicas
— parte delas para justificar a nova ordem, parte para submetê-la à análise
crítica e o restante como evangelho de reforma social. Assim
que o sistema fabril se consolidou e os lucros começaram a encher os cofres dos
novos senhores do mundo, alguns dos mais francos e combativos
dentre eles levantaram-se em defesa dos seus privilégios. Ao
fazê-lo, demonstravam amiúde uma fria indiferença para com a situação
das massas e uma impudente confiança no seu próprio direito ao domínio do
planeta, confiança que teria causado inveja aos nobres do antigo regime. Alguns
apologistas do novo sistema evoluíram mesmo para um tipo de Bourbons econômicos,
desconhecendo todo o passado e fechando os olhos aos perigos do futuro. Essa
atitude era expressa por doutrinas segundo as quais a propriedade privada era
inviolável, cada qual tinha o direito de fazer o que quisesse com o que era seu
e a pobreza era sempre o resultado da preguiça e da incompetência. Alguns
corifeus do novo capitalismo chegaram a afirmar que a pobreza é um bem para as
massas, uma vez que as ensina a respeitar os seus superiores e a ser
agradecidas à Providência pelos escassos benefícios que recebem.
Um clérigo
inglês, escrevendo por volta de 1830, expôs o ponto de
vista de que era uma lei da natureza o serem alguns pobres, a fim de que os
misteres sórdidos e ignóbeis da comunidade pudessem ser desempenhados. Opinava
que desse modo era muito aumentado o cabedal de felicidade humana, pois
"os mais delicados não somente ficam aliviados de trabalhos penosos e
ingratos e daquelas ocupações ocasionais que os tornariam infelizes, mas também
podem… seguir as profissões que mais se ajustem aos seus diversos temperamentos
e que mais úteis sejam ao estado". Mas algumas
dessas teorias econômicas, mesmo
defendendo o ideal capitalista,
eram mais desinteressadas.
Isto se aplica, pelo menos em certa medida,
aos ensinamentos dos economistas clássicos ou economistas liberais, como às
vezes são chamados.
O fundador da economia clássica foi Adam Smith, cuja obra discutimos no Capítulo 21. Embora Smith houvesse escrito
antes de o capitalismo industrial ter alcançado o seu completo desenvolvimento
e alguns dos seus ensinamentos não se harmonizassem de todo com a interpretação
estrita do laissez-faire, havia, nas inferências gerais da sua teoria,
justificativa suficiente para aclamá-lo como o profeta dos ideais capitalistas.
As doutrinas específicas dos economistas clássicos foram, no entanto, em grande
parte obra dos discípulos de Smith, inclusive escritores eminentes como Thomas
R. Malthus, David Ricardo, James Mill e Nassau Senior.
Os elementos principais da teoria, subscritos pela maioria desses
homens, podem ser sumariados assim:
1)
Individualismo econômico. Cada indivíduo tem o
direito de usar para seu melhor proveito a propriedade que herdou ou adquiriu
por qualquer meio lícito. Deve ser permitido a cada pessoa fazer o que quiser
com o que é seu, enquanto não transgredir idêntico direito dos demais. Como
cada um é quem melhor sabe o que pode torná-lo feliz, a sociedade tirará o
máximo proveito quando permitir que cada um de seus membros siga as suas
próprias inclinações.
2) Laissez-faire. As funções do estado deveriam ser reduzidas ao mínimo compatível
com a segurança pública. Compete ao governo limitar-se ao
papel de modesto policial, mantendo a ordem e protegendo a
propriedade, mas jamais intervindo por qualquer forma no desenrolar dos
processos econômicos.
3) Obediência à lei natural. Existem leis imutáveis a operar no setor
econômico como em todas as esferas do universo. Exemplos
disso são a lei da oferta e da procura, a lei dos lucros decrescentes, a lei da
renda etc. Tais leis devem ser reconhecidas e
respeitadas; deixar de fazê-lo é desastroso.
4) Liberdade de contrato. Cada indivíduo deve ter a faculdade de negociar o
contrato mais favorável que possa obter de qualquer outro indivíduo.
Em especial, a liberdade dos trabalhadores e empregadores para combinar entre
si a questão do salário e das horas de trabalho não deve ser embaraçada
por leis ou pelo poder coletivo dos sindicatos de trabalhadores.
5) Livre concorrência e livre-câmbio. A concorrência serve para manter os
preços baixos, para eliminar
os produtores ineptos e assegurar a máxima
produção compatível com as necessidades públicas.
Consequentemente, não se devem
tolerar monopólios ou quaisquer leis que fixem os
preços em benefício de empreendedores incompetentes. Cumpre,
além disso, abolir todas as tarifas protetoras a fim de forçar cada país a se
empenhar na produção daquelas mercadorias que está mais capacitado a produzir.
Isso também terá o efeito de manter os preços baixos. Vários discípulos de Adam
Smith contribuíram com teorias próprias.
Thomas
R. Malthus (1766-1834) introduziu, por exemplo, o
elemento de pessimismo que fez com que a nova economia fosse estigmatizada como
a “ciência melancólica". Malthus, um clérigo da igreja anglicana e reitor
de uma paroquiazinha do Surrey, deu à luz em 1798 o seu memorável Ensaio sobre
a população. Publicado originalmente sob a forma de um opúsculo, o Ensaio foi o
fruto de algumas discussões que o autor manteve com seu pai sobre a
perfectibilidade do homem. O velho Malthus era um adepto de Rousseau, mas
impressionou-se tanto com os argumentos do filho contra o otimismo superficial
daquele filósofo que insistiu com ele para que os escrevesse. A obrinha
provocou sensação imediata e foi, durante muitos anos, tema de
discussões. Em 1803 foi
ampliada em livro, com base em pesquisas
mais extensas que o autor levara a efeito para refutar os seus críticos. A essência da teoria malthusiana é a afirmação de que a
natureza prescreveu limites inflexíveis ao progresso humano no que toca à
felicidade e à riqueza. Devido à voracidade do apetite sexual, a
população tem uma tendência natural para aumentar mais depressa do que os meios
de subsistência. Existem, é verdade, alguns freios poderosos como a guerra, a
fome, a doença e o vício; mas estes, quando agem de maneira eficiente, aumentam
ainda mais o peso dos padecimentos humanos. Segue-se que a pobreza e a dor são
inevitáveis. Mesmo que se promulgassem leis distribuindo equitativamente a
riqueza, a condição dos pobres só por algum tempo melhoraria; dentro em breve
começariam a gerar famílias numerosas, resultando daí que a situação final da
sua classe seria tão má quanto a inicial. Na segunda edição de sua obra Malthus
advogava o retardamento do matrimônio como um meio de aliviar a situação, mas
continuava a acentuar o perigo de que a população viesse a sobrepujar qualquer
possível aumento dos meios de subsistência.
Os principais
ensinamentos de Malthus foram adotados e desenvolvidos por David Ricardo (1772-1823), uma das mais penetrantes se
não uma das mais vastas inteligências do século XIX. Era Ricardo um judeu
inglês que abraçou o cristianismo aos vinte e um anos de idade e casou com uma
quacre. Aos vinte e cinco havia feito fortuna na Bolsa e logo se tornou um dos
homens mais ricos da Europa.
Como
economista, Ricardo é famoso em primeiro lugar pela sua teoria do salário de
subsistência. De acordo com essa teoria, os salários tendem
para um nível apenas suficiente para capacitar os trabalhadores "a
subsistir e perpetuar a sua raça, sem aumento nem diminuição". Para
Ricardo, esta era uma lei férrea a que não havia escapar. Se temporariamente os
salários subissem acima do padrão de subsistência, a população aumentaria e a
consequente competição pelos empregos forçaria rapidamente aqueles a voltar ao
seu antigo nível. Como a lei de Malthus, na qual se baseia, esta teoria
esquecia o fato de que as famílias com um padrão crescente de vida tendem a
limitar a sua prole.
Ricardo
é conhecido, em segundo lugar, pelos seus ensinamentos relativos à renda. Sustentava que esta é determinada pelo custo da produção nas terras
mais pobres que devem ser cultivadas e, por conseguinte, à medida que um país
se enche de gente uma porção cada vez maior da renda social é retida pelos
proprietários rurais. Embora fosse ele próprio um grande proprietário, acusou
os que viviam das rendas de suas terras como os maiores inimigos tanto dos
capitalistas como dos trabalhadores. Por fim, Ricardo é importante pela sua
teoria do trabalho como fundamento do valor, teoria que influenciou uma das
principais doutrinas do socialismo marxista. Dava, no entanto, certo
significado também ao papel do capital na determinação do valor — uma ideia que
Marx abominava.
Em seus últimos
anos Ricardo teve amiudados contatos com um interessante grupo de reformadores
ingleses, conhecidos como os "radicais
filosóficos". Entre os seus líderes havia figuras
proeminentes como Jeremy Bentham, James Mill, o historiador George Grote e o
cientista político John Austin.
O mais notável
economista entre eles foi James Mill
(1773-1836), que já mencionamos pela reputação de que goza como filósofo
utilitário. Conquanto hoje seja difícil considerar os ensinamentos de James
Mill como radicais, tiveram eles um caráter bastante liberal para mostrar que a
economia clássica nem sempre era obscurantista e reacionária. As doutrinas
expostas em seus Elementos de Economia Política incluem princípios como os
seguintes: 1) o principal objetivo dos reformadores práticos deveria ser o de
evitar que a população cresça com demasiada rapidez, pois que a riqueza
utilizável para fins de produção não aumenta na mesma proporção que o número de
habitantes; 2) o valor dos artigos comerciais depende inteiramente do montante
de trabalho necessário para produzi-los; e 3) a valorização da terra que não
provém do trabalho, mas resulta exclusivamente de causas sociais, como por
exemplo a construção de uma nova fábrica nas vizinhanças, deveria ser
fortemente tributada pelo estado. Esta última doutrina, baseada na teoria da
renda de Ricardo, estava destinada a gozar de ampla aceitação na Inglaterra.
Sob uma forma modificada, foi incorporada ao evangelho do Partido Liberal nos
primeiros anos do século XX e inspirou o célebre orçamento de Lloyd George para
1909.
O
mais capaz dos economistas clássicos que
apareceram depois de Ricardo foi, talvez, Nassau William Senior (1790-1864).
Foi o primeiro professor de economia política em Oxford e
também ilustre advogado, tendo
desempenhado vários encargos reais. Como a maioria dos seus predecessores,
Nassau considerava a economia como uma ciência dedutiva. Afirmava que todas as
suas verdades podiam ser derivadas de um número limitado de grandes princípios
abstratos. Felizmente, ele próprio nem sempre se atinha a esse método, em
particular ao tratar de questões de caráter só parcialmente econômico.
Destarte, ao mesmo tempo que defendia o princípio do laissez-faire batia-se por
uma interferência governamental crescente em assuntos como a saúde, a habitação
e a educação. Sua principal contribuição foi a teoria
de que a abstinência cria um direito à riqueza. Admitia que o trabalho e
os recursos naturais são os instrumentos primários do valor, mas sustentava que
a abstinência era um instrumento secundário. Argumentava, a partir daí, que o
capitalista que se priva de gozar toda a sua riqueza a fim de
acumular um excedente para
empregá-lo em novos negócios
tem direito aos lucros da produção. A sua abstinência implica em sacrifício e
dor, não menos que o trabalho do operário. Consequentemente, é injusto dar toda
a recompensa a este último. A má reputação de Sénior provém sobretudo de ele
ter condenado as exigências de uma redução da jornada de trabalho, formuladas
pelas uniões trabalhistas. Tinha a convicção sincera, mas errada, de que todo o
lucro líquido de uma empresa industrial resulta da última hora de trabalho.
Portanto, diminuir o dia de trabalho importaria em eliminar os lucros, donde
adviria o fechamento das fábricas. Por causa desta doutrina foi ele alcunhado
pelos seus críticos "Senior da Última Hora".
A maioria dos
economistas clássicos ou liberais foram cidadãos britânicos, em parte
porque o liberalismo econômico se harmonizava melhor com
o liberalismo político, que era mais
forte na Inglaterra do que em qualquer outro país europeu, e
em parte porque os industriais ingleses começavam a
perceber importantes vantagens numa política de livre-câmbio com o
resto do mundo. No Continente europeu, entretanto, as condições eram
inteiramente diversas. Ali ainda persistiam as antigas tradições de governo
forte. Além disso, os manufatores continentais estavam tentando construir
organizações industriais capazes de competir com as inglesas. Para consegui-lo
era necessário dispor do patrocínio e da proteção do estado.
Não é de
surpreender, portanto, que a maioria dos adversários do liberalismo econômico
pertencesse aos países continentais. Não obstante, pelo menos um dos críticos
mais capazes dessa escola foi um inglês: o brilhante filósofo utilitário John Stuart Mill (1806-73).
Embora Mill, como economista, seja frequentemente colocado entre os liberais, a
verdade é que ele repudiou algumas das mais sagradas premissas destes. Em
primeiro lugar, rejeitava a universalidade da lei natural. Admitia existirem
leis imutáveis que governam a produção, mas afirmava que a distribuição da
riqueza pode ser regulada pela sociedade em proveito da maioria dos seus
membros. Em segundo lugar, advogava certas medidas que divergiam mais
radicalmente da doutrina do laissez-faire do que as recomendadas por qualquer
dos seus precursores. Não se opunha à legislação para abreviar em certas
condições a jornada de trabalho e acreditava que o estado pode muito bem tomar
certas providências preliminares no sentido de redistribuir a riqueza, mediante
a tributação das heranças e a apropriação do produto da valorização indébita da
terra. No quarto livro dos seus Princípios de Economia Política insiste na
abolição do sistema de salários e almeja uma sociedade composta de cooperativas
de produtores, em que os trabalhadores seriam donos das fábricas e elegeriam os
dirigentes. Por outro lado, não se deve esquecer que Stuart Mill era demasiado
individualista para ir muito longe no sentido do socialismo. Desconfiava do
estado e a verdadeira razão pela qual defendia as sociedades cooperativas não
era exaltar o poder do proletariado mas dar a cada trabalhador os frutos do seu
trabalho.
O mais conhecido
dos economistas alemães que pregaram teorias opostas às
da escola clássica foi Friedrich List
(1789-1846), o qual deveu a inspiração de algumas de suas idéias a
uma estada de sete anos na América. List condena as doutrinas
do laissez-faire e da liberdade do comércio internacional. Sustentando que a riqueza de uma nação é determinada menos
pelos recursos naturais do que pela força produtiva dos seus cidadãos,
declarava que é dever dos governos promover as artes e as ciências e fazer com
que cada indivíduo empregue o máximo de sua capacidade na cooperação em prol do
bem comum. Exaltava o desenvolvimento integral da nação como fato de
suma importância, sem levar em conta os efeitos sobre as fortunas imediatas dos
cidadãos particulares. Opinando que as manufaturas são essenciais a tal
desenvolvimento, pedia a imposição de tarifas protetoras até que as novas
indústrias fossem capazes de competir com as de qualquer outro país. List é o
precursor de uma grande linhagem de economistas alemães que se propuseram fazer
do estado o guardião da produção e da distribuição da riqueza. O objetivo
desses homens era menos o de garantir a justiça para o indivíduo do que a ideia
de consolidar a unidade e aumentar o poder da nação. Acreditavam
que o governo não só devia impor tarifas protetoras mas também regular e
planejar o desenvolvimento da indústria, de modo a estabelecer o equilíbrio
entre a produção e o consumo. Em geral, suas ideias representam uma
mistura de nacionalismo económico e de coletivismo, fornecendo assim a base de
algumas teorias alemãs mais recentes.
Encontramos em
seguida um grupo de teóricos que se interessam mais pela justiça social do que
em descobrir leis econômicas ou em lançar as bases da prosperidade
nacional. Os primeiros representantes dessa atitude mais
radical são os socialistas
utópicos, assim chamados por terem apresentado programas
idealistas de sociedades cooperativistas em que todos trabalhariam em tarefas
apropriadas e compartilhariam os resultados dos seus esforços comuns. Os socialistas
utópicos eram, em grande parte, herdeiros do Iluminismo. Como os filósofos
desse movimento, acreditavam que todo crime e toda cobiça são frutos de um mau
ambiente. Se os homens pudessem libertar-se de hábitos viciosos e de uma
estrutura social que facilita a escravização do fraco pelo forte, todos
viveriam juntos em paz e harmonia. Consequentemente, os socialistas utópicos
recomendavam a fundação de comunidades-modelo, capazes, tanto quanto possível,
de se bastarem a si mesmas, em que a maior parte dos instrumentos de produção
fossem de propriedade coletiva e cujo governo fosse organizado principalmente
sobre uma base voluntária.
Entre os
primeiros propagadores de tais planos está o francês Charles Marie Fourier (1772-1837), mas o mais sensato e realista
de todos é Robert Owen
(1771-1858). Natural do País de Gales, Owen passou de artífice-aprendiz a
co-proprietário e gerente de um grande cotonifício em New Lanark, na Escócia.
Construiu ali novas casas para os seus operários, reduziu-lhes a jornada de
trabalho de 14 para 10 horas e instalou escolas gratuitas para os filhos dos
trabalhadores. A forte depressão resultante das guerras napoleônicas
convenceu-o de que a ordem econômica precisava urgentemente de uma reforma.
Como muitos têm feito desde então, concluiu que o sistema de lucro era a causa
de todas as perturbações. É o lucro, afirmava ele, que coloca o operário na
impossibilidade de comprar as coisas que produz. Daí resultam a superprodução,
as crises periódicas e o desemprego. Como solução, Owen propunha a organização
da sociedade em comunidades cooperativas em que a única recompensa de cada um
fosse uma remuneração proporcional às horas reais de trabalho. Algumas
comunidades desse tipo foram de fato instaladas, sendo as mais famosas as de Orbiston,
na Escócia, e a de New Harmony, no estado norte-americano da Indiana. Por
várias razões, todas elas fracassaram dentro de curtíssimo espaço de tempo.
Uma forma de
socialismo mais influente foi o chamado "socialismo
científico" de Karl Marx (1818-83). Filho de um advogado judeu que
se convertera ao cristianismo por motivos de interesse profissional, Marx
nasceu em Treves, perto de Coblença, na Renânia. O pai planejou para ele uma
carreira de advogado burguês e, com esse fim em vista, matriculou-o na
Universidade de Bonn. O jovem Marx, no entanto, logo se desgostou do direito e
abandonou os estudos jurídicos para se atirar à filosofia e à história. Depois
de passar um ano em Bonn transferiu-se para a Universidade de Berlim, onde caiu
sob a influência de um grupo de discípulos de Hegel que desviavam os
ensinamentos do mestre num sentido levemente radical. Embora Marx se tivesse
doutorado em filosofia pela Universidade de Iena, em 1841, seus pontos de vista
críticos impediram-no de realizar a sua ambição, que era tornar-se professor
universitário. Voltou-se então para o jornalismo, dirigindo vários periódicos
radicais e colaborando em outros.
Em
1848 foi preso sob a acusação de alta
traição, por ter participado do movimento revolucionário da Prússia. Apesar
de absolvido por um júri pequeno-burguês, foi em seguida expulso do país.
Entrementes fizera-se amigo íntimo de Friedrich
Engels (1820-95), que foi por todo o resto da vida seu discípulo e
alter ego.
Em 1848, ambos
publicaram o Manifesto Comunista, o "primeiro grito do socialismo moderno
que nascia". Desde essa data até a sua morte em 1883, Marx viveu quase
exclusivamente em Londres, lutando com a pobreza, escrevendo de quando em
quando artigos para a imprensa (alguns dos quais vendeu à New York
Tribune, a cinco dólares cada um), mas passando em geral o tempo a compulsar,
da manhã à noite, empoeirados manuscritos da Biblioteca do Museu Britânico
a fim de colher material para uma grande obra da economia política. Em 1867
publicou o primeiro volume dessa obra que recebeu o título de O Capital. Depois
de sua morte foram dados à luz outros dois volumes, com base nos seus
manuscritos revistos e editados por Engels. Nem todos os ensinamentos de
Karl Marx eram completamente originais. Devia algumas de suas
ideias a Hegel, outras a Louis Blanc e provavelmente
outras ainda a Ricardo.
Não obstante, Marx foi o
primeiro a combinar essas ideias num vasto sistema
e a dar-lhes o seu pleno significado como explicação dos fatos econômicos. Como
a teoria marxista se tornou uma das filosofias mais influentes dos tempos
modernos, é necessário compreender-lhe as premissas fundamentais. As mais
importantes dentre elas são as seguintes:
1) A interpretação econômica da
história. Todos os grandes
movimentos políticos, sociais e intelectuais da história têm sido determinados
pelo ambiente econômico em que surgiram. Marx não pretendia
que o motivo econômico fosse a única explicação do comportamento
humano, mas afirmava que toda
transformação histórica fundamental, sejam quais forem os seus
característicos superficiais, tem resultado de
alterações nos métodos de produção e de troca.
Assim, a Revolução Protestante foi, na essência, um movimento econômico;
as discordâncias quanto a credos religiosos não passavam de
"véus ideológicos" a ocultar as causas reais.
2) O materialismo
dialético. Cada
sistema económico particular, baseado em padrões
definidos de produção e de troca, cresce até alcançar um ponto de máxima
eficiência, após o que começam a desenvolver-se contradições e fraquezas
internas que trazem consigo a sua rápida decadência. Enquanto
isso, vão-se estabelecendo pouco a pouco os fundamentos
de um sistema oposto, o qual acaba por substituir
o antigo ao mesmo tempo que lhe absorve os elementos mais
valiosos. Esse processo dinâmico de evolução histórica
prosseguirá por meio de uma série de vitórias da nova ordem sobre a antiga, até
que seja atingida a meta perfeita do comunismo. Depois disso, sem dúvida haverá
ainda mudanças, mas serão mudanças dentro dos limites do próprio comunismo.
3) A luta de classes. Toda a história é feita de lutas entre as
classes. Na antiguidade, tratava-se
de uma luta entre amos e escravos,
entre patrícios e plebeus; na Idade Média, de um conflito entre os mestres das
corporações e os jornaleiros; nos nossos tempos, o choque ocorre entre a classe
capitalista e o proletariado. A primeira compreende aqueles cuja renda
principal resulta da posse dos meios de produção e da exploração do trabalho
alheio. O proletariado inclui aqueles cuja subsistência depende
principalmente de um salário, os que precisam vender a força do seu braço para
viver.
4) A doutrina da mais-valia. Toda riqueza é criada pelo trabalhador. O capital
nada cria, mas ele próprio é criado pelo trabalho. O valor de todas as
utilidades é determinado pela quantidade de trabalho necessária
para produzi-las. O trabalhador,
porém, não recebe o valor total do que o seu trabalho cria;
ao invés disso, recebe um salário que, por via de regra, é suficiente apenas
para capacitá-lo a subsistir e a reproduzir a sua raça. A
diferença entre o valor que o trabalhador produz e o que ele recebe é a
mais-valia, que vai para as mãos do capitalista. Em geral,
ela consiste em três elementos diversos: juros, renda
e lucros. Como o capitalista
não cria qualquer destas coisas, segue-se que ele é um ladrão que
se apropria dos frutos da fadiga do trabalhador.
5) A teoria da evolução socialista. Quando o capitalismo tiver recebido o golpe de morte
às mãos dos operários, seguir-se-á uma fase de socialismo que terá três
característicos: a ditadura do proletariado; a remuneração de acordo com o
trabalho realizado; a posse e a administração, pelo estado, de
todos os meios de produção, distribuição e troca. O
socialismo, porém, destina-se a ser mera transição para algo
superior. Em tempo oportuno seguir-se-á o comunismo, meta
final da evolução histórica. O comunismo significará, antes
de mais nada, uma sociedade sem classes. Ninguém viverá da
propriedade, mas todos viverão unicamente do trabalho.
O estado desaparecerá então e será relegado ao museu de antiguidades,
"juntamente com o machado de bronze e a roda de
fiar". Nada o substituirá, exceto associações
voluntárias para controlar os meios de produção e suprir as necessidades
sociais. Mas a essência do comunismo é o pagamento segundo as
necessidades. O sistema de salários será completamente abolido. Cada cidadão
deverá trabalhar de acordo
com as suas capacidades e terá
direito a receber do monte
total das riquezas produzidas numa quantia proporcional
às suas necessidades. Esse é, de acordo com a concepção marxista,
o apogeu da justiça. A influência de Karl Marx nos séculos XIX e XX só pode ser
comparada à influência de Voltaire e Rousseau
no século XVIII.
Sua doutrina da
interpretação econômica da história é admitida até por historiadores que
não são seus adeptos. Possui
discípulos em todas as nações civilizadas do planeta, e também em
muitos países atrasados. Na Rússia é
quase um deus, sendo o seu dogma do materialismo dialético adotado ali
não só como fundamento da economia mas como norma a que se devem conformar
também a ciência, a filosofia, a arte e a literatura. Em todas as nações
industrializadas, antes da Primeira Guerra Mundial, havia um partido socialista
de considerável importância, sendo o da Alemanha o que teve mais forte representação
no Reichstag depois de 1912. Em quase toda parte o desenvolvimento do
socialismo tem exercido uma influência vital na promulgação de leis de seguro
social e de salário mínimo, bem como na tributação da renda e das heranças com
a mira numa redistribuição da riqueza. Marx, está claro, não se interessava por
essas coisas como fins em si mesmas, mas as classes governantes acabaram
convencendo-se da necessidade de adotá-las como uma posta de carne a ser jogada
à fera socialista. Os socialistas em geral também deram o seu apoio ao
movimento cooperativista, à encampação das estradas de ferro e dos serviços de
utilidade pública, bem assim como a inúmeros planos para proteger os
trabalhadores e os consumidores contra o poder do capitalismo monopolizador. Pelos
fins do século XIX os adeptos de Marx dividiram-se em duas facções.
A maioria, em
quase todos os países, aderiu às doutrinas de uma seita conhecida como os
revisionistas, os quais como o nome indica,
acreditam que as teorias de Marx devem ser revistas para se porem
de acordo com as condições mutáveis. A outra facção era formada pelos marxistas
ortodoxos, que sustentavam não dever ser modificada uma só linha dos
ensinamentos do mestre. Além dessa divergência de atitude geral, havia também
diferenças específicas. Enquanto os revisionistas advogavam a marcha para o
socialismo por meios pacíficos e graduais, os marxistas ortodoxos eram
revolucionários.
Aqueles
concentravam a sua atenção nas reformas imediatas, de acordo com o lema:
"Menos por um futuro melhor, mais por um presente melhor"; estes
exigiam a ditadura do proletariado, ou nada. Os líderes da facção majoritária
inclinavam-se a reconhecer os interesses particulares das nações, eram
propensos a aludir ao dever para com a pátria e frequentemente apoiavam os
pedidos dos seus governos para que se aumentasse os armamentos e se prolongasse
a duração do serviço militar.
Os marxistas
ortodoxos, por outro lado, eram internacionalistas intransigentes ; apegavam-se
à sentença de Marx, segundo a qual o proletariado mundial é uma grande
irmandade, e eram hostis ao patriotismo e o nacionalismo, como estratagemas
capitalistas para lançar poeira nos olhos dos operários. De modo geral, foram
os revisionistas que ganharam o controle dos partidos socialistas na maioria
das nações ocidentais. Tanto o Partido Social-Democrático da Alemanha como o
Partido Socialista Unificado da França e o Partido Socialista dos Estados
Unidos eram largamente dominados pela facção moderada. Na Inglaterra, a direção
do Partido Trabalhista foi ocupada em várias ocasiões pelos socialistas
"fabianos", assim chamados por causa da sua política de
contemporização que imitava a tática de Fábio, general romano das guerras
contra Cartago. Aproximadamente em 1918 a maioria dos marxistas ortodoxos
desligaram-se definitivamente dos partidos socialistas, e desde então são
conhecidos como comunistas. Entretanto, o marxismo ortodoxo na sua forma
comunista tem revelado, nos últimos anos, a tendência de modificar o
internacionalismo de Marx e exaltar o patriotismo e a defesa do país natal.
Isso foi observado em particular na Rússia e em alguns dos seus satélites
durante a Segunda Guerra Mundial e nos anos subsequentes. Muitos idealistas
sociais do século XIX e do começo do século XX eram solicitados
pelos desejos contraditórios de
melhorar o bem-estar da sociedade por meios coletivistas e de
conquistar um máximo de liberdade para o indivíduo. Já vimos que os próprios
marxistas visavam a abolição final do estado. Mas o dilema coletivismo-individualismo
recebeu muito mais atenção da parte dos anarquistas.
Numa definição
estrita, o anarquismo significa oposição a todo governo baseado na
força. Os adeptos desta filosofia têm admitido, em geral, a necessidade de uma
certa forma de organização social, mas condenam o estado coercitivo como
absolutamente incompatível com a liberdade humana. Quanto à questão do que
deveria ser feito com o sistema económico, os anarquistas discordavam
profundamente entre si. Alguns eram puros individualistas, afirmando que os
direitos do homem a possuir e usar a propriedade só devem estar submetidos às
"leis da natureza. O pai do anarquismo, William Goldwin (1756-1836), acreditava que se a terra fosse
tão gratuita como o ar não seria necessária qualquer outra mudança na estrutura
económica. Na opinião do anarquista francês Pierre Proudhon (1809-65), seria suficiente que a sociedade
desse crédito gratuito e ilimitado a cada um para assegurar a justiça
econômica. Tal plano, segundo ele, impediria que qualquer indivíduo monopolizasse
os recursos da terra e garantiria a todos os cidadãos económicos e industriosos
a plena recompensa dos seus trabalhos. Mas os primeiros anarquistas que
exerceram verdadeira influência foram os
que combinaram o ódio
ao estado com uma filosofia
coletivista definida. Em primeiro plano entre eles,
encontramos os três grandes aristocratas russos Mikhail Bakunin
(1814-76), Piotr Kropotkin
(1842-1921) e Leon
Tolstoi (1828-1910). Embora seja muitas vezes
classificado como anarquista-comunista, Bakunin
achava-se, na realidade, muito mais próximo do
socialismo. Esteve mesmo, durante algum
tempo, ligado aos adeptos de Marx na Associação Internacional
de Trabalhadores, fundada em Londres no ano de 1864. O seu programa de uma nova
sociedade incluía a propriedade coletiva dos meios de produção, a abolição da
mais-valia e o pagamento de acordo com o trabalho realizado. Em outras
palavras, assemelhava-se muito ao programa do marxismo na sua fase socialista,
com a diferença, naturalmente, de não admitir a conservação do estado. Bakunin
é também famoso como o pai do anarquismo terrorista. Advogando a subversão do
estado e do capitalismo pela violência, inspirou o que mais tarde veio a ser
chamado "propaganda pela ação" e que consistia em atrair a atenção
para a causa anarquista assassinando alguns estadistas proeminentes ou
exploradores detestados. É aos adeptos de Bakunin que se atribuem os
assassinatos do presidente McKinley dos Estados Unidos, do presidente Carnot da
França e do rei Humberto I da Itália. Mas os anarquistas mais inteligentes da
escola coletivista condenavam essas táticas.
O príncipe
Kropotkin, por exemplo, condenava o emprego da violência individual em
quaisquer condições. Acreditava que um esforço revolucionário final seria
necessário, mas preferia que o estado fosse enfraquecido por métodos pacíficos,
convencendo-se gradualmente o povo de ser ele um mal desnecessário, uma
instituição que alimenta a guerra e existe sobretudo para capacitar alguns
homens a explorar os outros. Do ponto de vista da reforma econômica, Kropotkin
era comunista. Sustentava que toda propriedade, exceto os objetos de uso
pessoal, deve ser possuída socialmente e que o pagamento se deve fazer na base
das necessidades de cada um. O mais famoso dos anarquistas coletivistas e uma
das figuras mais interessantes dos tempos modernos é o conde Leon Tolstoi.
Embora mais conhecido pelos seus romances, que serão
comentados num capítulo ulterior, Tolstoi foi também um dos maiores filósofos
russos. Suas idéias nasceram de um violento conflito emocional e da procura
quase desesperada de uma maneira de viver que pudesse satisfazer-lhe a
inteligência irrequieta. Abandonou-se durante algum tempo a uma dissipação
elegante, tentou desafogar o seu espírito perturbado por meio de obras
filantrópicas e acabou abandonando tudo isso para viver como um simples
camponês. Chegou à conclusão de que não se podia fazer nenhum progresso no
sentido de remediar os males da sociedade enquanto as classes superiores não
renunciassem aos seus privilégios, adotando a existência humilde daqueles que
labutam pelo seu pão. Isso, porém, seria apenas o começo. Todo individualismo
egoísta devia igualmente desaparecer, toda riqueza devia ser depositada num
fundo comum e abolidos todos os instrumentos de coerção.
Tolstoi
baseava grande parte da sua filosofia no Novo Testamento, em especial no Sermão
da Montanha. Encontrava nos ensinamentos de Jesus — a mansidão, a humildade a
não-resistência — os princípios essenciais de uma sociedade justa. Acima de
tudo condenava a violência, para qualquer fim que fosse empregada. A violência brutaliza o homem; coloca quem a pratica à mercê dos seus
inimigos; e enquanto a força puder ser utilizada como arma, será quase
impossível confiar nos métodos civilizados. Merecem ser citadas algumas
palavras de Tolstoi sobre este assunto: Quando um governo é
derrubado pela violência e a autoridade passa para outras mãos, essa nova
autoridade não será de modo algum menos opressiva do que a anterior. Pelo
contrário, obrigada a se defender de seus inimigos exasperados pela derrota,
será ainda mais cruel e despótica do que a sua predecessora, como sempre tem
acontecido em períodos de revolução… Seja qual for o partido que ganhe a
ascendência, será forçado, para introduzir e manter o seu próprio sistema, não
somente a se servir de todos os métodos anteriores de violência,
mas também a inventar outros novos.
A terceira das grandes filosofias radicais engendradas pela Revolução
Industrial foi o sindicalismo, cujo maior expoente é Georges Sorel (1847-1922). O sindicalismo exige a abolição
tanto do capitalismo como do estado e a reorganização da sociedade em
associações de produtores. Assemelha-se ao anarquismo na oposição ao estado; mas,
ao passo que os anarquistas pedem a abolição da força, os sindicalistas desejam
mantê-la, mesmo depois de destruído o estado. O sindicalismo também tem pontos
de contato com o socialismo, por agasalharem ambos a ideia da propriedade
coletiva dos meios de produção; mas, em lugar de fazer do estado o proprietário
e administrador dos meios de produção, os sindicalistas pretendem delegar essas
funções aos sindicatos de produtores. Destarte, todas as usinas siderúrgicas
seriam possuídas e dirigidas pelos trabalhadores da indústria de aço, as minas
de carvão pelos mineiros, e assim por diante. Além disso, os sindicatos
tomariam o lugar do estado, cada um governando os seus membros em todas as
atividades destes como produtores. Nos demais assuntos, os trabalhadores
ficariam livres de qualquer interferência. Não existiriam, é claro, leis
regulamentadoras da moral ou da religião, pois o sindicalismo é uma filosofia
inteiramente materialista. Por outro lado, os seus fundadores não alimentavam
qualquer ilusão quanto à capacidade das massas para o autogoverno. Sorel
considerava o homem médio como uma espécie de carneiro, capaz unicamente de
seguir o guia do rebanho. Opinava, portanto, que a autoridade dirigente dos
sindicatos deveria ser francamente exercida pelos poucos inteligentes. Outro
elemento de suma importância na teoria sindicalista é a doutrina da ação
direta. Significa ela o oposto da ação política e pode ser considerada como
incluindo a greve geral e a sabotagem, sendo esta qualquer tipo de atividade daninha
utilizada com o fim de prejudicar o empregador capitalista. A influência do
sindicalismo tem-se limitado em grande parte aos países latinos da Europa e aos
Estados Unidos. Na França, durante certo tempo, gozou de imensa popularidade na
C.G.T. (Confederação Geral do Trabalho). Na Itália, as suas doutrinas do
domínio da minoria, da ação direta e da organização da sociedade em sindicatos
foram adotadas, com modificações, pelos fascistas. Na América, muitos elementos
da filosofia sindicalista foram incorporados aos programas da I.W.W.
(Trabalhadores Industriais do Mundo), uma organização que
floresceu aproximadamente entre 1905
e 1920.
Por último, não
devemos esquecer os socialistas cristãos, os menos
radicais entre todos os críticos da economia
capitalista. O pai do socialismo
cristão é Robert
de Lamennais (1782-1854), um padre católico francês que tentou
revivificar a religião cristã como instrumento de reforma e de justiça
social. Ideias semelhantes foram externadas pelo conde Henri de Saint-Simon (1760-1825) em seu livro O novo
cristianismo.
Da França, o movimento espalhou-se à Inglaterra,
onde foi adotado por alguns intelectuais protestantes, especialmente pelo
romancista Charles Kingsley (1819-75). Em seus primeiros
tempos, o socialismo cristão foi pouco mais que um pedido de aplicação dos
ensinamentos de Jesus aos problemas criados pela indústria, mas nos últimos
anos começou a assumir uma forma mais concreta.
Em 1891, Leão XIII, o "papa dos
trabalhadores", lançou a sua famosa encíclica Rerum novarum em
que revive sob uma feição moderna a atitude econômica liberal de Santo Tomás de
Aquino. Embora a encíclica reconhecesse de maneira expressa a propriedade
privada como um direito natural e repudiasse vigorosamente a doutrina marxista
da luta de classes, condenava em termos veementes os lucros ilimitados. Apelava
para os empregadores a fim de que respeitassem a dignidade dos seus operários
como homens e como cristãos e não os tratassem "como instrumentos para
fazer dinheiro nem vissem neles apenas o músculo e a força física". Como
propostas específicas para mitigar o rigor do regime industrial, recomendava a
legislação fabril, a formação de sindicatos de trabalhadores, o aumento do
número de pequenos proprietários rurais e a limitação das horas de
trabalho. A publicação da encíclica deu poderoso impulso ao
desenvolvimento do socialismo cristão entre os católicos liberais. Nos países
europeus, antes da Primeira Guerra Mundial, os partidos católicos desempenharam
frequentemente um papel ativo, por vezes em colaboração com os marxistas
moderados, no movimento em prol da legislação social. Isto é particularmente
verdadeiro no que diz respeito ao Partido do Centro na Alemanha, ao Partido
Socialista Cristão na Áustria e à Ação Liberal na França.
EDWARD McNALL BURNS
PROFESSOR DE HISTÓRIA DA RUTGERS UNIVERSITY
HISTÓRIA DA CIVILIZAÇÃO OCIDENTAL
Volume II
Tradução de LOURIVAL GOMES MACHADO, LOURDES SANTOS MACHADO e LEONEL VALLANDRO
PROFESSOR DE HISTÓRIA DA RUTGERS UNIVERSITY
HISTÓRIA DA CIVILIZAÇÃO OCIDENTAL
Volume II
Tradução de LOURIVAL GOMES MACHADO, LOURDES SANTOS MACHADO e LEONEL VALLANDRO
Capítulo 23: A
Revolução Industrial dos séculos XIX e XX
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